Quando se prevêem situações em que as Forças Armadas deveriam estar moralizadas, o ministro da Defesa abre uma crise desnecessária no Exército e provoca a demissão do Chefe do Estado-Maior. As nossas fontes detectam no diferendo um modelo que se repete na relação entre a hierarquia militar e o poder político. Neste caso, a propósito de uma referência pedagógica nacional que certos sectores teimam em querer destruir: o Colégio Militar.

Tudo começou com a publicação de uma reportagem no jornal digital ‘Observador’, no passado dia 1 de Abril, sob o título “A vida no Colégio Militar: parece um Big Brother”. Nessa reportagem eram incluídas declarações prestadas pelo Coronel-Director do prestigiado Colégio, pelo sub-Director do estabelecimento e por alguns alunos, que com sinceridade e de forma correcta pretenderam retratar a vida normal de uma escola onde crianças e adolescentes (repetimos, crianças e adolescentes) dos dois sexos coexistem no dia-a-dia.

Claro que o Colégio Militar não é uma escola como as outras. Um longo e honroso historial de formação de futuros cidadãos imbuídos de valores patrióticos e, em muitos casos, de futuros o ciais das Forças Armadas faz dele uma refe- rência pedagógica a nível nacional, como o testemunha a esmagadora maioria de antigos alunos. Tal facto indesmentível faz com que a situa- ção de procura seja a de que, como declarou o Director do Colégio ao Observador, “há pais que reservam o número de aluno para os lhos logo à nascença”, atestando isso mesmo.

Foi a parte final das declarações do sub-Director ao ‘Observador’ que provocou este “caso”, que tem vindo a ser empolado por alguns sectores bem conhecidos, cujo ódio reiterado ao Colégio Militar e aos valores que ele representa são mais notórios ainda.

Referindo-se às regras que qual- quer estabelecimento de ensino deve seguir (e segue em qualquer país normal), alertou o sub-Director na entrevista para os procedimentos em uso sempre que se veri cam si- tuações anómalas. E exempli cou: “Nas situações de furto e de droga, é transferência imediata de escola.” E muito bem, acrescentamos nós, aliás em conformidade com o que está prescrito na Lei. Acrescentava o sub-Director que estas situações são detectadas inevitavelmente, pois a própria vida corrente no Colégio leva a que sejam conhecidas: “Sempre que ocorre qualquer situação dessas, sabemo-lo imediatamente. Eles próprios se encarregam disso”.

Sensato e equilibrado

Prosseguindo nas declarações ao ‘Observador’, acrescentava o sub- -Director do Colégio Militar, com evidente bom-senso e sentido das realidades: “Mas o plano de acção não é o mesmo para quem rouba, para quem consome drogas ou para quem é homossexual […]. Nas situações de afectos [homossexuais], obviamente não podemos fazer transferência de escola. Falamos com o encarregado de educação para que percebam que o lho acabou de perder espaço de convivência interna e a partir daí vai ter grandes dificuldades de relacionamento com os pares. Porque é o que se verifica. São excluídos”. Mais sensato e equilibrado não se podia ser.

Só quem não foi criança é que não compreende que é exactamen- te isto que sempre se passa e conti- nuará a passar no mundo infantil e juvenil, enquanto o ser humano for ser humano. Não estando ainda corrompidas pela “cultura social”, as crianças tendem a ser verdadeiras, o que por vezes roça a crueldade. É, e sempre foi, assim. Quem é Pai ou Mãe sabe-o bem. E é sabido e desejável que quando uma criança ou um adolescente (é disto que estamos a falar) apresenta tendências que saem fora da média dos seus colegas, sejam os Pais informados do facto para que decidam o que fazer. “O pecado” do sub-Director foi, assim, ser verdadeiro e muito ingénuo ao confiar em que tais declarações não seriam distorcidas e aproveitadas para denegrir a Instituição e o seu bom nome.

Mas, como O DIABO pôde comprovar junto de diversas fontes, esta foi apenas uma das causas da “crise” que esteve na origem do pedido de demissão do Chefe do Estado-Maior do Exército.

Imediatamente as declarações do sub-Director do Colégio, enquadradas e implicitamente corroboradas pelas declarações do Director e dos alunos ouvidos, foram aproveitadas por forças políticas que de há muitos anos tentam destruir uma das mais antigas e valiosas Instituições de educação do nosso País, não percebendo que quando o fazem estão a destruir o próprio País, pois uma Nação é tanto mais forte quanto mais fortes forem as suas Instituições.

Ora, inopinadamente, o Ministro da Defesa, José Azeredo Lopes, resolveu escrever ao Chefe de Estado-Maior do Exército, Tenente-General Carlos Jerónimo, pedindo esclarecimentos sobre as declarações do sub-Director. Estranhamente (ou não), essa missiva acabou na opinião pública. Em reunião pessoal subsequente ao escrito, o governante terá exigido a demissão do sub-Director do Colégio Militar. Contudo, o Chefe de Estado-Maior ter-se-á recusado a demiti-lo, em cima do acontecimento e a “quente”, invocando em contrapartida os princípios que devem presidir à boa e saudável gestão destes casos.

Em suma: o ministro da Defesa, em vez de resolver a questão falando pessoalmente com o CEME e pedindo-lhe para averiguar o que realmente se passava (como seria normal em qualquer organização pública ou privada), resolveu tornar público o tema – ou não-tema, como qualquer pessoa de bom-senso depressa poderia concluir.

Mas Azeredo Lopes, descontente com a atitude do CEME, decidiu ir mais longe e solicitou em seguida a intervenção do Chefe do Estado- -Maior General das Forças Arma- das (CEMGFA), o que só piorou e empolou a situação em vez de a resolver, pois o Chefe do Exército ter-se-á, naturalmente, sentido desrespeitado, diminuído e ultrapassado nas suas competências próprias. Em qualquer organização (empresa, associação, sindicato, não importa), uma atitude destas por parte de uma chefia (neste caso do ministro) teria o mesmo resultado no subordinado (o CEME, neste caso).

De lamentar

O mais grave é que, podendo parecer inopinada e extraordinária, esta situação con gura um modelo de comportamento que se repete e é bem conhecido de todos os que se preocupam com os assuntos da Defesa Nacional. Tal deriva da constante diminuição do pessoal, dos meios, das capacidades e dos orçamentos de que as Forças Arma- das têm sido alvo pelos sucessivos Governos.

Como Chefe do Estado-Maior do seu ramo (os antecessores também o tinham feito), o General Carlos Jerónimo por várias ocasiões expressou, com total legitimidade, a sua apreensão e opiniões junto do Poder Político, o que é normal e natural. É também sobejamente conhecida a posição do Exército, Marinha e Força Aérea sobre a questão das dúvidas que se colocam sobre a operacionalidade, estado de prontidão e capacidade das Forças Armadas para combater o Estado Islâmico. Alguns Oficiais Superiores e Oficiais Generais têm-se pronunciado no sentido de que as Forças Armadas portuguesas têm as capacidades su cientes para o efeito, embora pudessem ser melhores, não fora os cortes orçamentais infligidos desde há alguns anos a esta parte.

Surpreendentemente, ao ser questionado sobre a matéria e outras conexas, o ministro tem afirmado que as nossas forças “não estão em condições de participar no combate na Síria”.

É por demais evidente que toda esta situação (o não-caso do Colégio Militar e a situação das capacidades do Exército) terá levado o General Jerónimo a demitir-se do alto cargo que exercia, por descontentamento resultante das situações referidas, agravado pela situação delicada em que foi desnecessariamente colocado pelo Poder Político.

Ninguém sai bem deste episódio. Numa altura em que prevêem situações (dados os atentados de Madrid, Londres, Paris, Bruxelas e outros) em que as Forças Armadas deveriam estar moralizadas, são de lamentar, sobretudo, a atitude do ministro, como chefe político das nossas forças castrenses, e o aproveitamento que de todo o “caso” fizeram algumas forças civis e políticas de que se conhecem bem os objectivos de desmoralizar e descredibilizar a Instituição Militar.