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Qual o 5 de Outubro que deveríamos celebrar? A data da fundação do Reino de Portugal? Ou a data da fundação da República portuguesa? Apesar de se assumir a questão como um assunto encerrado, o facto é que os portugueses nunca tiveram a oportunidade de ter um voto na matéria sobre o seu regime político. 

Quando foi elaborada, a versão original da Constituição de 1976 colocava o marxismo como ideologia oficial do Estado e também determinava que “Portugal é uma República” que supostamente estaria “empenhada na sua transformação [de Portugal] numa sociedade sem classes”.

À luz do caos da época, talvez fosse impossível outra solução, mas readquirida a estabilidade e com o restabelecimento da democracia em 1982 (com a extinção do famigerado Conselho da Revolução) não são poucas as vozes que pedem uma reavaliação tanto do texto constitucional, como da forma de regime escolhido. Mas, tecnicamente, como é que se comparam as duas formas de regime? O DIABO escolheu alguns pontos fundamentais e faz o paralelo entre várias monarquias e repúblicas actuais.

Quanto custa um Chefe de Estado?

“Quem quer rainhas paga-as”, terá afirmado D. Maria Pia quando os ministros do Reino a acusaram de esbanjar o erário público. Um dos argumentos usado amiúde pelos republicanos é de que uma República dispensa os elevados gastos necessários de uma corte monárquica.

Vamos a números. A monarquia britânica custou 50 milhões de euros em 2014, o que não é muito quando comparado com os 42 milhões de euros gastos pela monarquia holandesa, ou os parcos 8,4 milhões de euros da monarquia espanhola.

No entanto, o custo dos Chefes de Estado parece estar menos ligado à forma de governo e mais à cultura política do país. A pátria-mãe do republicanismo moderno, os EUA, gasta quase 700 milhões de euros com o Escritório Executivo do Presidente, comummente denominado “Casa Branca” (edifício onde opera). Naturalmente, as funções do Presidente dos EUA são executivas, enquanto que os monarcas são geralmente figuras cerimoniais, mas se apenas tivermos em conta os custos de manutenção da Casa Branca, mais as residências oficiais da presidência (como o famoso “Camp David”), o valor total é 68 milhões de euros. Isto sem contar com a limusina blindada, ou os dois Boeing 747, ao dispor do Chefe de Estado dos EUA.

D. Duarte de Bragança
D. Duarte de Bragança

Por outro lado, a presidência italiana é essencialmente cerimonial e, incrivelmente, custa mais de 200 milhões de euros anualmente ao contribuinte. Em comparação, a monarquia da Noruega, país pequeno mas extremamente rico, custa apenas 11 milhões anualmente ao erário público. O Presidente da República portuguesa, um país com metade do PIB norueguês, apesar de ter o dobro da população, gastou quase 15 milhões de euros só em 2014.

E este é o valor depois das drásticas medidas de austeridade, pois em 2010 a permanência de Cavaco em Belém ainda custava 17 milhões ao pobre contribuinte português. Em termos de despesas de representação, as contas lusitanas ainda se tornam menos defensáveis: a Presidência gasta tanto quanto toda a família real britânica em representação diplomática, cinco milhões de euros, apesar da família real do Reino Unido viajar bastante mais, especialmente para os 17 territórios extra-europeus que ainda juram lealdade à Rainha.

Por outro lado, o Presidente da Alemanha é relativamente frugal quando comparado com os seus colegas e o seu gabinete apenas gasta 35 milhões de euros anuais. Se em termos de gastos a diferença parece estar na cultura política de um país e não na forma de regime, em termos de rentabilidade a figura muda de tom. Embora o Presidente da Alemanha não custe muito aos contribuintes, também é uma figura que quase ninguém conhece. Aliás, muitos alemães não fazem a mínima ideia de quem é Joachim Gauck. Por sua vez, o nome e a cara de Isabel II são conhecidos por todo o planeta e, mesmo que menos conhecidos, o ‘merchandising’ relacionado com as várias famílias reais adiciona milhões de euros aos cofres do Estado todos os anos.

Mário Soares, ex-Presidente, Republicano e Laico
Mário Soares, ex-Presidente, Republicano e Laico

Em comparação, poucas pessoas farão fila para comprar uma caneca com a imagem de Cavaco Silva, Mário Soares, Joachim Gauck ou François Hollande. E não são poucas as casas reais que, contas feitas, dão lucro ao seu país. Os Windsor, a família real inglesa, são donos de vastas propriedades no Reino Unido, cujos proveitos e rendas de exploração cederam ao parlamento em troca de uma “lista civil” para financiar a casa real. Estima-se que apenas 15 por cento do rendimento destas terras seja usado para este fim, sendo que o resto vai directamente para os cofres do Estado. Caso a monarquia fosse abolida, como defendem os socialistas britânicos, estas terras não deixariam de ser propriedade dos Windsor, pois nunca foram doadas ao país, apenas concedidas para serem geridas pelo parlamento.

Imagem e prestígio

Não existe figura no mundo mais conhecida do que o Presidente dos Estados Unidos do América, líder da maior superpotência mundial. Mas a segunda figura mais conhecida é Isabel II, fruto de décadas de continuidade no trono. Já o declínio do poder francês e a ineficiência do seu governo fez de François Hollande, segundo vários ‘rankings’, um desconhecido fora das fronteiras europeias. Aqui ao lado, o Rei de Espanha é uma figura mais conhecida devido à pompa e circunstância que o seu cargo implica. Mas o Presidente da Alemanha é uma figura que nem uma parcela significativa dos próprios alemães sabe sequer que existe. O cargo em si é tão impopular que a maioria dos alemães defende que deve ser extinto. Quando inquiridos sobre como, um em cinco alemães defendeu a restauração da monarquia alemã, outros defenderam que o cargo deveria ser fundido com o de Chanceler e uma pequena parcela dos alemães defendeu a peregrina ideia de se dar a Coroa da Alemanha a Isabel II, visto que a monarca inglesa é, para todos os efeitos, de descendência alemã, e lidera uma casa real de origem germânica.

Neste aspecto, de pompa, circunstância e representação do Estado, a República geralmente perde, visto que quase nenhum dos Chefes de Estado republicanos é conhecido, não sendo geralmente figuras de unidade. Os índices de popularidade dos monarcas são, regra geral, mais elevados do que os dos presidentes. Nem mesmo Isabel II durante a crise da morte da princesa Diana, ou Juan Carlos no final do seu reinado, tiveram taxas de aprovação tão baixas como François Hollande ou Cavaco Silva durante os seus mandatos. Nos países nórdicos os monarcas são populares ao ponto de poderem andar na rua juntamente com o seu povo. Algo que, importa ressalvar, também os políticos eleitos conseguem fazer.

Poderes

Um Rei ou uma Rainha reinam até à sua morte ou abdicação, um Presidente governa durante um mandato fixo. A evolução da medicina significa que alguns monarcas podem ocupar o trono durante períodos extremamente longos de tempo. A Rainha inglesa está no poder há tanto tempo que já viu a passagem de 12 presidentes dos EUA que, no seu conjunto, cumpriram 16 mandatos de quatro anos. Esta longa duração como Chefe de Estado é um ponto central dos argumentos republicanos e monárquicos.

Os monárquicos alegam que a monarquia constitui um elemento de continuidade que une uma Nação mesmo quando tudo o resto muda à sua volta. Os republicanos, por sua vez, alegam que, na eventualidade de um mau governante, na República há a possibilidade de se escolher um novo Chefe de Estado a cada quatro, cinco ou seis anos. Isto, naturalmente, assumindo que a República é uma democracia e permite eleições directas, algo que muitas não permitem. No entanto, ainda existem várias monarquias absolutas no planeta, embora nenhuma delas no Ocidente, sendo o seu equivalente europeu mais aproximado, a ditadura proto-comunista bielorrussa, oficialmente uma República quase nos mesmos moldes hereditários da Coreia do Norte.

Mas, no mundo ocidental, o monarca é geralmente uma figura cerimonial, sem poderes significativos. Em Portugal, no entanto, o monarca teve poderes consideráveis até ao fim de acordo com a Carta Constitucional de 1822. O Rei podia nomear governos, até mesmo com a possibilidade de governarem em ditadura, podia dissolver a Câmara dos Deputados a qualquer momento e nomeava sozinho os membros da Câmara dos Pares. Na prática, os políticos eleitos (e ocasionalmente não eleitos) detinham o verdadeiro poder, nomeavam os elementos da Câmara dos Pares (exigindo ao Rei uma “fornada” de pares alinhados com a sua cor política) e não eram raras as ocasiões em que chegavam a usar golpes de Estado para se impor. Entre eles, as revoltas militares do famoso Marechal Saldanha tornaram-se tão comuns que a palavra “Saldanhada” (Ocasionalmente alterada para “Salganhada”) origina deste tempo.

A monarquia continuava sempre e era uma fonte de estabilidade numa época de instabilidade crónica, como aliás se viu durante o período da caótica I República. Naturalmente, há a necessidade de se ressalvar que muitas presidências não são eleitas directamente pela população, como no caso português. Tanto o Presidente dos Estados Unidos da América como o Presidente da Alemanha são eleitos indirectamente por um colégio eleitoral composto por grandes eleitores que, por sua vez, não são obrigados a respeitar a vontade popular. É difícil afastar a ideia de que o processo se assemelha a umas Cortes.

D. Afonso Henriques, primeiro Rei de Portugal
D. Afonso Henriques, primeiro Rei de Portugal

Algo que também é geralmente confundido com a monarquia é a aristocracia, embora tal não seja exigido dentro de um regime monárquico. Inglaterra tem uma aristocracia oficial com representação na Câmara dos Lordes, já o Japão aboliu a sua aristocracia em 1947 e os países nórdicos “privatizaram” a nobiliarquia, dando-lhe reconhecimento, mas isolando o Estado da instituição. Neste aspecto, a República Portuguesa também tem uma nobreza, pois reconhece legalmente os vários títulos e reconheceu D. Duarte como legítimo herdeiro da Casa Real portuguesa em 2006, atribuindo-lhe até poderes diplomáticos.

A existência de ordens honoríficas cria uma espécie de “aristocracia republicana”. A grande desvantagem da monarquia, em termos políticos, é que o desejo de imparcialidade política associado ao facto de o monarca não ter sido eleito elimina a possibilidade do Rei ou da Rainha terem qualquer papel na governação do Estado. Em momentos em que não existe estabilidade governativa, como o actual, não existe uma figura moderadora forte e, no Ocidente, seria quase impossível que os povos aceitassem um monarca com funções executivas.

Modernidade monárquica ou republicana?

Por fim, a questão do desenvolvimento humano. É comum os republicanos afirmarem que as repúblicas são regimes mais “modernos” do que a alternativa monárquica. Olhemos para os números. Segundo o Índice de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas, que mede a esperança média de vida, a literacia, os níveis de educação da população e os padrões e qualidade de vida, entre o ‘top’ 3 dos países mais desenvolvidos, estão duas monarquias, a Noruega e a Austrália. Diga-se, no entanto, que o terceiro país é considerado como um dos exemplos mais perfeitos de uma república: a Suíça. Entre os 20 países mais desenvolvidos do planeta, 12 são monarquias e os outros 8 são repúblicas.

Importa ressalvar que apenas existem 43 monarquias no mundo, logo este número representa quase um quarto de todos os regimes monárquicos, mas também importa notar que quase todos estes países se encontram na Europa, continente por norma mais desenvolvido. É importante registar, contudo, que os 20 países menos desenvolvidos do mundo são repúblicas e estão localizados em África, com excepção do Afeganistão e do Haiti.

Tudo acaba por ser uma questão de escolha, de prestígio e de História Nacional. No entanto, esperamos que, no mínimo, este artigo tenha servido para elucidar melhor o grande público sobre as questões que rodeiam um debate que merece mais destaque num país com uma longa e rica História, como Portugal.