Em cima do joelho

1
2707

[avatar user=”cunha14″ size=”thumbnail” align=”left” /]Um dos grandes problemas da democracia portuguesa é o amadorismo. Não só não existe qualquer preparação para governar, como não se exige currículo aos governantes de Portugal quando escolhidos, em circuito fechado, pelos partidos.

O povo português não é exigente na altura de votar mas, sobretudo, os dirigentes políticos de topo não só não percebem que não têm a menor capacidade de gestão da coisa pública, como não têm a menor preparação e, pior, acham-se os maiores do mundo, confundindo opiniões infundamentadas com factos científicos.

Isto quando, percebendo que não têm quaisquer possibilidades de entender o fenómeno complexo da governação, que exige conhecimentos de história, diplomacia, economia, gestão, estratégia, e não tendo nem instinto nem coragem, usam apenas marketing político e algum carisma (no caso de Passos Coelho, apenas uma boa voz, teimosia e afirmação convicta das tais opiniões) e se agarram ao poder apenas para satisfazer clientelas ou prosseguir com finalidades puramente ideológicas, neste caso uma espécie de cartilha contra tudo o que é Estado e sector público, que seria, aparentemente, liberal, mas elevando os impostos a níveis que tornam o mesmo Estado um sistema socializante dos rendimentos dos mais fracos, deixando impunes os que mais poderiam contribuir e que vêem as suas fortunas aumentar.

Junte-se a isto o propósito de vender o país, naquilo que alguns crêem ser pura alta traição à Pátria, a interesses estrangeiros. Comparar Passos Coelho a Salazar é um grave erro: Salazar nunca deixou achincalhar a autoridade do Estado, a soberania nacional, e nunca vendeu Portugal a retalho.

Aconteceram cinco factos cruciais que determinam em maior ou menor grau aquilo que afirmamos no primeiro parágrafo. Ineficácia do Ministério das Finanças e do Banco de Portugal, em antever a tragédia do Banco Espírito Santo, nomeadamente com a solução encontrada, que não teria custos para os contribuintes, mas que terá custos elevadíssimos, afinal o “preço de ter um banco público”, como afirma a ministra, a mesma Senhora que geria alegremente os contractos de swap e outras despesas que fizeram da REFER e CP os campeões de dívida, superior, aliás, aos buracos do BES, BPN e BPP juntos.

Ineficácia e inacção no caso da PT: um governo corajoso e que defendesse os interesses nacionais teria nacionalizado imediatamente esta empresa depois da história do desbaratar dos novecentos milhões de euros, afinal o filet mignon da PT, num pretenso investimento em papel comercial da Rio Forte, num conluio escandaloso entre governo da PT e a sua estrutura accionista, neste caso do grupo Espírito Santo.

Juntam-se a estes factos os dois escândalos da destruição da estrutura do Estado e da sua credibilidades, os casos CITIUS e da colocação de professores. No caso do CITIUS, um sistema informático desenvolvido dentro da estrutura do Estado foi alvo daquilo a que se chama “outsourcing”. Era barato e funcionava. Em vez de se reforçarem equipas ou de premiar o diligente pessoal da casa, dotando as mesmas equipas internas com melhores meios técnicos e de pessoal, poupando muitos milhões ao Estado, decidiu-se dar o “negócio” a uma empresa exterior que não só não deu conta do recado como destruiu todo o sistema num descalabro que terá consequência terríveis para o próprio funcionamento do Estado de Direito.

Usando como remédio a solução, em cima do joelho, de alargar os prazos, algo que parece claramente inconstitucional. O caso dos professores é sinistro, pois afecta os mais jovens, as crianças deste país, mais uma vez entregues aos bichos. Tomaram-se decisões em cima do joelho, fez-se má programação, decidiram-se concursos sem prazos para corrigir eventuais erros, avançou-se para a decisão do concurso sem se fazerem testes ou sem se validar os resultados antes de os publicar. A pressa e a incompetência são sempre más conselheiras e o ministro, professor de matemática, teve de dar a cara por erros grosseiros de cálculo elementar. Finalmente sai a nova lista e temos professores colocados simultaneamente em dezenas de escolas, um tendo sido colocado em 75 escolas, pasme-se, afectando só este erro mais de mil e quinhentas crianças.

Fica para o final o caso da reunião de 18 horas do conselho de ministros para acertar orçamento e plano. Não seria expectável que tudo estivesse decidido e planeado com tempo? Será que numa longa, mas muito curta, disputa de galos entre ministérios se pode decidir o futuro de um país? É um exemplo de má planificação, decisão em cima do joelho, uma catástrofe estratégica e uma vergonha, esta negociação de toma lá dá cá, praticamente às escâncaras, de assuntos que deveriam ser pensados e maturados com muito tempo e que deviam estar mais que decididos quando fosse a reunião de aprovação da proposta de Orçamento geral do Estado. Mais uma vez com decisões em cima do joelho, fica apenas a questão: quantos serão os orçamentos rectificativos em 2015?