O Governo de Costa está em funções há menos de um ano e vem acumulando demissões. Curiosamente, todas elas na sequência de casos políticos de assinalável gravidade, a última das quais, a de Pedro Nuno Santos, na sequência do caso TAP/Alexandra Reis. Curiosamente, também, um caso que deveria ter arrastado Fernando Medina, e não arrastou. Veremos se os estilhaços não o comprometerão, de forma irremediável, e ditarão a sua saída pela porta pequena.
A diferença é que, se Pedro Nuno Santos é um político em toda a linha e percebe estar em causa a sua sobrevivência, já Medina é um mero delfim de Costa e que julga ter o futuro assegurado por linhagem sucessória. Assim, Pedro Nuno, na sequência do escândalo Alexandra Reis, viu a oportunidade perfeita para capitalizar uma saída há muito prenunciada e que vivia lutando contra o calendário (e contra o próprio Costa, que cedo percebeu as intenções do ex-ministro).
É que Pedro Nuno, agora solto das amarras ministeriais e muito mais resguardado das broncas e engulhos em que constantemente se mete, encontra um novo campo de batalha, o campo da opinião, com a sobranceria que lhe é (re)conhecida e a aparente legitimidade do sentido de responsabilidade e dignidade do cargo que, voluntariamente, abandonou.
Essa sua pressa e voluntarismo afastam qualquer crítica de esbirro ou ressabiamento que se lhe pretenda colar, quando se atirar aos calcanhares de Costa muito mais ferozmente que Ventura. E convém não esquecer que Pedro Nuno controla grande parte das bases socialistas, sendo um homem do aparelho, capitalizando os socialistas mais descontentes e uma esquerda mais radical, órfã ou farta das derivas bloquistas e do repetido cançonetismo comunista.
Costa, não sendo um novato nestas andanças, já tratou de deixar o recado às tropas que não descarta a hipótese de se recandidatar à liderança partidária, pretendendo, assim, condicionar o espaço do seu ex-ministro; e logo tratou de, para o lugar deste, nomear quem lhe é próximo e com ele divide o eleitorado: o outro jovem turco, João Galamba. Mas já lá vamos…
A oposição, que pouco tem acertado nos ‘timings’ e estratégias, tem-se entretido em digladiar entre si, pretendendo colher os louros da apresentação de moções, sem perceber os sinais que o povo pretende ou a significância política do acto propriamente dito, preferindo discorrer um argumentário queirosiano que todos percebem, mas poucos aceitam.
Exemplo disso é a postura do PSD, enquanto maior partido da oposição, com vocação de Governo e do qual os portugueses estão sedentos de poder encarar como a alternativa séria que tarda. Uma vez mais, Montenegro demonstrou não saber ler ou capitalizar os sinais da sociedade civil, confiando que esta venha a perceber os seus. É o mesmo erro táctico que Rio cometeu, com os resultados que se conhecem…
O discurso do sentido de Estado, da postura digna de partido de oposição, do respeito pelo mandato popular conferido a Costa há menos de um ano, está ao nível do “gosto muito de ti, mas como amigo!”. Ou seja, é diplomático, é politicamente correcto, mas, no fim, ninguém factura! Montenegro, sobretudo por saber que jamais o Governo cairá tendo a maioria parlamentar, poderia e deveria ter optado pelo apoio à moção de censura apresentada pela IL, como um cartão amarelo alaranjado ao Governo, indo ao encontro dos ensejos do (seu) eleitorado.
Já Ventura soube ler a vontade popular e pouco se preocupou com a paternidade ou o resultado da votação parlamentar, enviando um claro sinal ao eleitorado de que podem contar com ele para fazer oposição.
Bloco, PCP, Livre e PAN, iguais a si mesmos, não assumindo qualquer posição que possa prejudicar entendimentos futuros e não percebendo que apenas cimentam a sua irrelevância política que apenas sustenta uns poucos, num sistema tão fechado e autocrático como sempre pretenderam…
E são estes equilíbrios parlamentares (ou, em rigor, a falta deles) que permitem a Costa continuar a governar um partido e não um país. Como referi, a nomeação de Galamba não resulta da sua valia técnica, da sua visão estratégica ou do profundo conhecimento do sector que vai tutelar. Resulta, apenas e tão só, do tacticismo do primeiro-ministro e da redução do espaço de manobra da sua oposição interna.
Ter Galamba perto de si, sucedendo a Pedro Nuno Santos na tutela dos “dossiers” TAP e Ferrovia, é o melhor antídoto à concorrência interna que aquele poderia vir a almejar. Costa não ignora a manifesta falta de competência de Galamba para cuidar de tais matérias e, sobretudo, não ignora, quer o grau de exposição e de escrutínio a que este estará sujeito, quer a sua manifesta ineptidão para lidar, de uma forma correcta, educada, institucional e, sobretudo, digna com as críticas a que estará (permanentemente) sujeito.
Costa sabe que o “cowboy” das redes sociais, será vítima de si mesmo, oferecendo-o, de antemão, ao sacrifício. Mas mais: Costa sabe que Pedro Nuno terá de correr em auxílio de Galamba e que terá de ser sempre a sua primeira linha de defesa, sob pena de preconizar a cisão dos eleitores daquela linha socialista. E é nisso que Costa aposta, que Galamba vá capitalizando votos, apoios e amizades, agora que tem lugares apetecíveis para distribuir, e que Pedro Nuno tenha que dividir com este o mesmo espaço, sem o hostilizar.
Costa tem ainda um trunfo a seu favor, que garante que Galamba será sempre uma solução a prazo: é que é do domínio público que Galamba está a ser investigado pelo Ministério Público pelos negócios do lítio e do hidrogénio, bem como por umas quantas certidões extraídas do processo PT. E, aqui chegados, em função do ‘timing’ em que Galamba venha a ser constituído arguido, do magistério de Marcelo e das tendências das sondagens, será Costa a determinar se demite o ministro ou se se demite, fazendo cair o Governo e concorrendo a (novas) eleições antecipadas, condicionando, uma vez mais, os ‘timings’ políticos quer do seu partido, quer da nação…
Entretanto, foi dando mais um sinal para dentro de portas, com a nomeação de Marina Gonçalves e a criação de um novo Ministério, alterando a orgânica governamental apenas dez meses depois de a ter definido. O sinal é que compensa ser militante socialista e que há prémios pela subserviência política. Marina não conhece qualquer outra experiência profissional que não a carreira política enquanto assessora e chefe de gabinetes, antes de chegar ao topo da governação. É o chamado elevador socialista, que se define na máxima “um líder, um partido, um país”!
O que nos vale é que Marcelo prometeu estar atento… ■