BE e PCP cedem no Novo Banco

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Eva Cabral

A venda do Novo Banco aos americanos da Lone Star obrigou o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda, embora sempre resmungando, a engolirem um verdadeiro comboio de sapos.

O negócio da venda do Novo Banco está decidido, os apoiantes do Executivo parecem conformados, ainda que não calem as divergências. Na apresentação feita pelo primeiro-ministro – acompanhado por um quase mudo ministro das Finanças – António Costa defendeu a solução e disse que no perímetro da geringonça “todos possuem o conhecimento do negócio e todos irão fazer a sua avaliação política”.

Apesar do aproveitamento político feito por António Costa, que chamou a si a apresentação do negócio, o certo é que em vésperas de eleições autárquicas a extrema-esquerda apareceu como domesticada. Com o tempo se conseguirá perceber quais as verdadeiras contrapartidas que asseguraram o quase silêncio da esquerda que apoia o Executivo da geringonça nesta solução para o Novo Banco.

O primeiro-ministro assegurou que a venda do Novo Banco ao fundo norte-americano Lone Star não irá sobrecarregar o Orçamento nacional nem onerar os contribuintes, constituindo “uma solução equilibrada”. Logo na sua declaração inicial, o primeiro-ministro defendeu que o acordo de venda do Novo Banco cumpre “as três condições colocadas pelo Governo” em Janeiro passado, sendo uma delas que este processo “não terá impacto directo ou indirecto nas contas públicas, nem novos encargos para os contribuintes”.

António Costa admitiu que foi estudada a hipótese de o Novo Banco ser nacionalizado, mas advogou que essa opção, a ser implementada, implicaria encargos para os contribuintes de até 4,7 mil milhões de euros.

“Estudámos bem essa solução”, disse António Costa, questionado sobre uma eventual nacionalização do Novo Banco, cenário que traria um “impacto muito distinto” junto dos contribuintes.

E concretizou: em vez de a Lone Star injectar mil milhões de euros no banco, “o Estado teria de realizar o capital inicial, que seria entre quatro mil e 4,7 mil milhões de euros”, porque as regras comunitárias implicam o reconhecimento imediato de eventuais necessidades futuras.

Fundo é que vende

A venda da instituição financeira será feita através do Fundo de Resolução, o que dispensa o Executivo de concretizar o negócio através de um decreto-lei, alegando “não se tratar especificamente ou tecnicamente de uma decisão do Governo”.

Esta foi a forma encontrada para contornar o descontentamento dos partidos de esquerda, que já vieram admitir que iriam pedir apreciação parlamentar do diploma sobre a venda da instituição, com o PCP e o BE a sinalizarem o seu chumbo no Parlamento, e depois de PSD e CDS terem avisado que não iriam apoiar o governo.

“Trata-se de um contrato em que é interveniente o Fundo de Resolução com o comprador do Novo Banco. Compete ao Governo apenas validar algumas das componentes desse negócio”, garantiu Carlos César.

Catarina pediu números

A coordenadora do BE, Catarina Martins, instou o Governo a apresentar os números do negócio com a Lone Star Funds para a venda do Novo Banco.

“Não acompanhamos o Governo em fazer mais do mesmo, que é obedecer à Comissão Europeia que não quer mudar a estratégia que foi usada até agora. Cabe agora ao Governo apresentar os números do negócio que está a pensar fazer com a Lone Strar. Dos termos que negociou com a União Europeia não cabe ao Bloco falar disso”, disse Catarina Martins.

Catarina Martins reiterou que a posição de princípio do BE é clara quanto à venda, lembrando que os contribuintes “já pagaram demais pelo Novo Banco” e como tal é necessário “uma nova forma de olhar para o sistema financeiro e para as decisões que tomamos sobre a banca”.

A coordenadora reconheceu que “não faz sentido no momento especular o que vai ser o futuro” quando questionada acerca de uma alteração legislativa poder levar a uma apreciação parlamentar do Bloco.

“Há exigências da Comissão Europeia que o Bloco não acompanha. A Comissão tem dado os piores conselhos ao País. Sempre que o País progrediu foi porque teve a coragem de não seguir os conselhos da Comissão, e o Bloco cá está, e já o disse ao Governo, para acompanhar em decisões difíceis que tenham de ser tidas para defender o interesse público contra as imposições de Bruxelas”, sublinhou.

O Bloco de Esquerda é contra a venda do Novo Banco a privados e tem defendido a nacionalização da instituição.

PCP conformado

O PCP foi o partido de esquerda que mais se disponibilizou para engolir vários sapos com este processo. O deputado comunista Miguel Tiago alertou no início da semana que uma eventual “travagem, por si só”, do processo de venda do Novo Banco implicaria a sua liquidação definitiva e ainda mais custos para os portugueses.

“Imaginemos que o decreto-lei era rejeitado. Apenas significaria a liquidação do Novo Banco, com os custos incomportáveis para o Orçamento do Estado, para os empregos das pessoas, o financiamento da economia e a estabilidade do sistema bancário. Continuar esta venda é um desastre para os portugueses, mas bloqueá-la, por si só, é um desastre porventura ainda maior”, afirmou, em declarações aos jornalistas no Parlamento.

Apesar de considerar que o Governo não está “formalmente” obrigado a fazer um decreto-lei sobre a futura privatização, possibilitando assim a sua apreciação parlamentar, Miguel Tiago afirmou que “o PCP não abdicará de nenhum instrumento para a manutenção [do banco] na esfera pública”.

“É importante que seja feita a distinção entre travar a venda, bloquear a solução que está em cima da mesa e aquilo que o PCP defende. Bloquear a venda, por si só, significa liquidar o banco com custos muito mais elevados. Cancelar o negócio como acto isolado implicaria a sua resolução”, sublinhou. “O PCP não subscreve nenhum dos moldes em que possa vir a ser realizada uma venda do Novo Banco. Uma solução que implica a perda total é totalmente inaceitável. Uma vez mais o Estado estava a servir apenas de câmara de limpeza para branqueamento dos crimes de banqueiros”, declarou o parlamentar comunista.

Miguel Tiago reafirmou que, “independentemente de quais sejam o plano do Governo e os planos de recapitalização e de venda”, o importante é “defender os postos de trabalho, os balcões, integrar o Novo Banco na esfera pública e colocá-lo ao serviço do povo e do País, porque é um canal importante de financiamento para Portugal e pode gerar receitas que venham a recompensar as perdas”.