O pacote da ilusão

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Anunciado o já famoso “pacote” do Governo para fazer face à crise e ao fenómeno da inflação, percebeu-se rapidamente que este não passa de um conjunto de truques de ilusionismo, uns mais criativos que outros.

A apresentação solene do pacote não resistiu a um olhar mais atento às propostas e aos seus efeitos e consequências, tornando-se evidente que o trabalho de casa foi mal feito e que houve ali uma clara intenção de iludir as famílias, aquelas que eles dizem estar primeiro.

Destacam-se desde logo dois casos notórios. O primeiro, o dos reformados e pensionistas a quem foi vendida a ideia de um ganho real. Analisadas as medidas, vemos que não só não há ganho nenhum, como até haverá uma perda. O Governo limita-se a antecipar o pagamento de uma parte da pensão em 2022, que deduz posteriormente em 2023, afectando assim a base de cálculo das pensões futuras, prejudicando os aumentos dos beneficiários nos próximos anos. 

Outro sector que foi apanhado na curva pelas medidas anunciadas pelo Governo é o sector do imobiliário onde, uma vez mais, impera a lógica “os senhorios que paguem a crise”. O que o PS propõe neste sector é uma limitação do aumento das rendas que se ficará por um máximo de 2%, inferior ao aumento que deveria ocorrer pelas fórmulas de cálculo habituais. Erradamente e como já vem sendo hábito neste país, temos uma vez mais os senhorios a assegurar e financiar a assistência social que compete ao Estado, já que a sua “compensação” apenas virá, por efeito fiscal, em 2024 aquando do apuramento do IRS referente ao ano de 2023. E mesmo em 2024 ainda terá de se verificar se de facto existirá alguma compensação real ou não, pois as dúvidas sobre a proposta e os seus mecanismos são mais que muitas.

Para o Governo PS, os proprietários que, quase num acto de coragem e aventureirismo, colocam as suas casas no mercado de arrendamento provavelmente não são pessoas e seguramente não estão primeiro. Existiu da parte do executivo uma vontade de anunciar medidas de efeito imediato, que permitissem às pessoas fazerem face às dificuldades que já estão a ter como seja o aumento dos custos da energia, dos preços, das taxas de juro e dos créditos que lhe estão associados, etc. Isto é, o Governo reconhece, e aqui com razão, que os portugueses já estão a sentir na carteira o efeito do fenómeno inflacionista. Mas no caso dos proprietários essa vontade não existe.

Na cartilha ideológica socialista, os proprietários continuam a ser um alvo preferencial, um grupo para o qual o PS olha com desconfiança excepto quando lhe exige que continue a financiar a assistência social que compete ao Estado.

Mas não são só os proprietários que, uma vez mais, ficam a perder. Os eventuais arrendatários também são lesados. Ao implementar medidas destas o Governo aumenta a desconfiança (já grande) naquilo que é o mercado de arrendamento. A consequência evidente será uma menor predisposição dos proprietários para colocarem os seus imóveis para arrendamento e, enquanto não se alterar este tipo de postura, Portugal continuará a ter uma crise de habitação a somar a todas as outras. O Governo precisa de criar um clima de estabilidade e previsibilidade no que ao mercado de arrendamento diz respeito, caso pretenda que todos os actores do sector vão a jogo e contribuam para um esforço colectivo de colocar no mercado milhares de casas actualmente fechadas. Precisamos de um quadro legislativo claro, com incentivos bem definidos, nomeadamente ao nível fiscal, assumindo de uma vez por todas que o arrendamento imobiliário é uma actividade normal e até desejável num país desenvolvido e livre de preconceitos ideológicos esquerdistas e ultrapassados. ■