Estima-se que o valor das reservas corresponda a mais de 43 mil milhões de euros, ao preço actual do crude, o mais baixo desde 2009, que corresponderia a 25 por cento do Produto Interno Bruto português. Mas o Governo duvida e a empresa ligada a um ex-colega de Passos Coelho está envolta em secretismo.
Uma empresa britânica chamada IONIQ Resources garante ter localizado seis jazidas de petróleo em Portugal continental, uma delas ‘off-shore’ (no mar), através de uma tecnologia inovadora para detectar recursos naturais, segundo uma notícia avançada pela revista “Sábado”, que teve acesso a uma carta daquela empresa, com data de 14 de Outubro de 2014, para o ministro do Ambiente e da Energia, Jorge Moreira da Silva, com uma proposta para a identificação e extracção destes recursos.
A tecnologia usada é uma espécie de ressonância electromagnética remota, através de dados recolhidos por satélite.
A companhia calcula que as reservas devem ter uma dimensão equivalente a mil milhões de barris de petróleo, e mais 30 por cento de gás natural. Como O DIABO já tinha noticiado, os britânicos e os seus parceiros portugueses reuniram-se há um ano com Pedro Passos Coelho e com o ministro do Ambiente.
O valor das reservas estimado pela IONIQ equivale a mais de 43 mil milhões de euros, ao preço actual do crude (o mais baixo desde 2009), o que corresponderia a 25 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) português.
O petróleo estaria a uma profundidade que vai dos dois mil aos três mil metros, o que facilitaria a sua exploração.
Segundo o documento a que a “Sábado” teve acesso, “estas estruturas podem ser uma grande fonte de riqueza nacional e podem transformar Portugal de um País importador de energia em exportador”.
Governo confirma
O gabinete do ministro do Ambiente e da Energia já confirmou à publicação a realização das reuniões: “O ministro e o secretário de Estado da Energia limitaram-se a ouvir, em audiência, os argumentos da empresa e a explicar o enquadramento regulatório previsto na legislação nacional.
Compete a esta empresa, como a todas as outras, iniciar, junto da Direcção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), os eventuais procedimentos de licenciamento. Tal não ocorreu até ao momento”. A hesitação das autoridades portuguesas deve-se ao facto de a tecnologia utilizada não ser muito conhecida mas, ainda assim, o ministério não quer descartar as informações recebidas.
Para complicar o cenário, não foi feito um pedido formal para prospecção, o que fez com que o Governo nem tenha chegado a avaliar “a credibilidade dos respectivos estudos” – que, a bem da verdade, ainda não foram apresentados formalmente. O documento apresentado ao Executivo não refere as eventuais localizações das jazidas nem explica como funciona a referida tecnologia inovadora.
A proposta da empresa surgiu depois da reunião com Moreira da Silva, a pedido do próprio ministro, mas não será suficiente para abrir um processo, que tem de dar entrada através da DGEG.
Contactado pela “Sábado”, Damon Walker, o administrador da IONIQ responsável pelos assuntos relativos a Portugal, sublinhou o facto de ter sido o ministro a pedir uma proposta e lamenta não ter recebido sequer uma resposta. “Isto vale biliões e nem tiveram a cortesia de nos responder”.
Ex-colega de Passos é sócio
A IONIQ, com sede fiscal no Chipre, é representada em Portugal pela IONCP. Paulo Caetano, um dos cinco sócios desta empresa, foi colega de Pedro Passos Coelho como administrador da Fomentinvest, um conglomerado de empresas de energia e ambiente onde o primeiro-ministro trabalhou antes de ser líder do PSD.
Ainda com base nas informações publicadas pela “Sábado”, terá sido Paulo Caetano a facilitar o acesso da IONIQ ao chefe do Governo, em Janeiro de 2014, numa reunião em São Bento, onde esteve presente o primeiro-ministro, o seu então chefe de gabinete, Francisco Ribeiro de Menezes, e o assessor económico Rudolfo Rebelo.
O encontro com o ministro do Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, Moreira da Silva, realizou-se um mês depois. O gabinete do primeiro-ministro não quis comentar estas informações.
A IONIQ Resources pertence à IONIQ Capital, uma ‘trader’ no sector das matérias-primas, cujo presidente (‘chairman’) é Charles Masefield, antigo piloto que foi um dos principais responsáveis pelo comércio de armamento no Reino Unido durante os governos de John Major e Tony Blair.
Entre 1994 e 1998, Masefield presidiu à Defense Export Services Organization (DESO), um departamento discreto do governo britânico, com a tarefa de promover as exportações de armamento produzido por empresas do Reino Unido.
Cinco anos depois, e até 2007, tornou-se presidente do gigante tecnológico militar British Aerospace Systems (BAE Systems), uma das maiores empresas mundiais do sector.
Porém, pesquisas na internet não permitem identificar as actividades da IONIQ Resources. A empresa, segundo consta, não faz exploração de petróleo. Aliás, define-se como uma empresa “tecnológica” e classifica a sua tecnologia como “disruptiva” para o sector petrolífero no documento que enviou ao Governo.
Damon Walker não disponibiliza muita informação, invocando a confidencialidade da tecnologia e dos projectos em curso noutros países. Depois de contactado pela revista, o britânico aceitou marcar um encontro num escritório de advogados em Lisboa. Mostrou à “Sábado” vídeos com perfurações de água em desertos e diz que a IONIQ está envolvida “em projectos humanitários em África e no Médio Oriente para a localização de água potável”.
Há dois anos começou a trabalhar na área dos recursos minerais. “Não somos os inventores desta tecnologia, mas temos a licença para o seu uso exclusivo há três anos”, afirma.
A empresa usa dados de satélites comerciais que recolhem frequências emitidas pelos materiais e que depois são decifradas por uma equipa de cientistas. “O que é novo aqui é a interpretação dos dados”, afirma.
Aguardam-se os próximos capítulos.