Já lhe chamam a “onda cor-de-rosa”: muitos dos governos da América Latina estão hoje sob o controlo de forças radicais de esquerda que enganam o eleitorado com a promessa populista de auroras douradas. Os custos da loucura extremista serão elevados.
O populismo sempre foi um instrumento político característico dos países da América do Sul – ou da América Latina, se quisermos incluir o caso da ditadura cubana e do conturbado percurso da Nicarágua. O discurso populista pretende exaltar as massas, servindo-se geralmente de um inimigo comum que “deve ser destruído”: como “inimigo do povo” durante a luta pelo poder, como “inimigo do Estado” depois da conquista do poder.
O inimigo, esse, varia conforme as necessidades do populista: podem ser “os burgueses”, podem ser os norte-americanos (os “gringos”), podem ser “os sabotadores”, pode ser qualquer coisa. Não importa que seja verdade ou mentira, o que interessa é que uma maioria de pessoas acredite que é verdade. Sim, uma maioria: porque os direitos democráticos da minoria não são algo que os populistas estejam interessados em proteger.
A partir do final dos anos 90, o populismo foi crescendo na América do Sul. As economias locais, tradicionalmente caóticas, estavam a recuperar devido ao preço elevado das matérias-primas, nomeadamente o petróleo. Este é o sonho do populista de esquerda: a possibilidade de poder usar dinheiro fácil de obter para pagar políticas que compram votos.
Diga-se que tal não é um fenómeno exclusivo da América Latina. Portugal, durante anos, foi governado por Executivos que usaram financiamento europeu e crédito barato para pagar infra-estruturas e políticas que davam votos. Pelo final deste ciclo, o Governo já pagava, com grande fanfarra e cobertura mediática, computadores portáteis aos alunos portugueses, grandes auto-estradas que hoje estão desertas, e ainda queria construir uma linha de TGV de duvidosa necessidade. Nenhuma destas medidas teve qualquer efeito benéfico na economia portuguesa. O populismo acabou por arruinar as contas nacionais.
As causas do desastre português serão as razões do desastre que se aproxima na América Latina?
República “Bolivariana” da Loucura
Ora olhemos então para a Venezuela, governada pelo regime criado por Hugo Chávez, intitulada, muito originalmente diga-se, de “República Bolivariana”. A mudança da designação, de forma a fazer apelo ao nome do famoso líder dos movimentos independentistas latino-americanos, foi um primeiro sinal de alerta: Hugo Chávez via-se como um Simón Bolívar do século XXI.
E esta é a parte menos louca do regime de Chávez, um indivíduo tão “democrático” que começou por tentar alcançar o poder através de um golpe de Estado (falhado) que procurava derrubar um governo legitimamente eleito. Falhada a via golpista, Chávez decidiu candidatar-se a eleições. Para ganhar, usou um discurso altamente agressivo visando virar os cidadãos mais pobres contra a classe média e abastada. Prometeu auroras douradas e ganhou.
O problema de se prometer auroras douradas é que, depois, é preciso cumprir. Mas para um populista isso não é problema: a realidade pode ser vergada à sua vontade. Sempre que algum desastre económico ou social atingiu a Venezuela (e sob o governo brutalmente incompetente de Chávez tal era uma ocorrência regular), a culpa caía sempre sobre algum inimigo fictício da “República Bolivariana”.
O ataque aos “inimigos” alcançou tais níveis de ridículo que Chávez chegou a afirmar que um sismo de grande escala no Haiti fora provocado pelos Estados Unidos, que tinham usado uma “arma de terramotos”. Quando faltava um bem de consumo nas lojas, a culpa era sempre dos “sabotadores burgueses” que impediam que os produtos chegassem ao mercado.
Todas as semanas Chávez passava horas (ocasionalmente mais de seis horas, à maneira de Fidel) nos ecrãs da televisão estatal a arengar sobre os “inimigos” ficcionais.
Tinha uma grande audiência, não pelo conteúdo ideológico das mensagens, mas porque era nestes programas que Chávez costumava anunciar a distribuição de novos subsídios pelos seus apoiantes.
Desaparecido Chávez e desorientada uma parte da máquina repressiva, o povo finalmente revoltou-se contra o regime e decidiu protestar.
Ao sucessor, Nicolas Maduro, nem sequer ocorreu que a política económica do “chavismo” pudesse estar errada. Mas a realidade entreva pelos olhos dentro: a nacionalização de uma grande parte do tecido económico nacional tinha levado a uma enorme fuga de capitais e a falta de muitos bens de consumo devia-se às “experiências” de planeamento central por parte de um governo inoperante e corrupto.
Em vez de reconhecer a evidência, o novo presidente da Venezuela lançou as culpas para cima dos que protestavam nas ruas, logo apelidados de “terroristas”, “fascistas” e “perigosos reaccionários”. Que queriam, afinal, estes “fascistas”? Um país onde se pudesse comprar papel higiénico nas lojas, bem de consumo que parece nunca estar disponível…
A inflação venezuelana chegou neste Verão aos 62%, e continua a aumentar. A moeda teve de ser radicalmente desvalorizada para evitar o colapso total, que já não demora muito a chegar de qualquer forma. Gastando rios de dinheiro em “programas sociais” para subornar os eleitores, o regime “chavista” pouco fez para criar uma economia forte, tendo vivido a ultima década dos rendimentos do petróleo: 93% das exportações do país são baseadas neste recurso.
Mas a queda súbita do preço do barril de petróleo significa que o país está rapidamente a ficar sem dinheiro para continuar a comprar o “amor” da população.
Argentina: penhoras e falência
A Argentina, dominada nos últimos anos pelo casal Kirchner, é outro caso de esquerda populista na América do Sul. Os “inimigos” são os do costume, só muda o nome.
Enquanto a Venezuela culpa os EUA por todas as desgraças que lhe caiam em cima, a Argentina culpa a Grã-Bretanha – e continua a querer recuperar as ilhas Falkland, cuja população já votou inequivocamente (99%) pela permanência no Reino Unido.
A guerra de palavras entre os dois países serve os interesses da presidente Cristina Kirchner, pois distrai a populaça dos verdadeiros problemas argentinos, nomeadamente a inflação descontrolada.
O Reino Unido não lhe liga muito, nomeadamente no que se refere às ambições sobre as Malvinas. A Argentina seria dizimada caso tentasse invadir as ilhas Falkland: os caças “Typhoon” da Royal Air Force ali destacados bastariam para destruir em pouco tempo toda a obsoleta Força Aérea Argentina.
Entretanto, no plano económico, a presidente encontrou uma forma original de evitar que as estatísticas demonstrassem que o regime estava a fazer um péssimo trabalho: pura e simplesmente, aboliu o Instituto Nacional de Estatística. Ao contrário de Portugal, por exemplo, onde o INE é independente, na Argentina todos os indicadores económicos são cozinhados e divulgados pelo governo.
Não admira, então, que os dados oficiais apontem para uma situação absolutamente normal, enquanto milhões de argentinos já usam o dólar norte-americano em vez da moeda local, visto que esta já nada vale devido à inflação.
Tal como Eva Perón falava dos “descamisados” enquanto vivia numa opulência chocante, tal como a ditadura militar invadiu as Falkland para disfarçar o caos que se vivia no país, também a actual presidente tenta disfarçar a sua brutal incompetência com retórica. Ao longo das últimas décadas, os governos populistas acabaram por destruir a Argentina, que nos anos 50 era um dos mais ricos do planeta.
Hoje, a presidente não pode levar o jacto presidencial para fora do país, sob risco de vê-lo penhorado pelos credores estrangeiros, que já tentaram (quase com sucesso) fazer o mesmo com um barco da Marinha Nacional.
República Soviética do Brasil
O Partido dos Trabalhadores (PT) domina a política nacional do Brasil desde a eleição de Lula da Silva. Num golpe de teatro à sul-americana, o antecessor de Lula, Fernando Henrique Cardoso, é diabolizado como um perigoso “neoliberal”, “cão das potências estrangeiras”, enquanto que Lula é santificado como o herói dos pobres e miseráveis.
Como é normal nesta parte do mundo, poucos parecem ligar ao facto de Lula apenas ter conseguido implementar as suas medidas sociais graças às reformas económicas de Henrique Cardoso.
O presidente do Partido Social Democrata do Brasil (PSDB) pôs em prática um conjunto de medidas duras, mas necessárias, de forma a travar a inflação galopante (que chegou a ultrapassar os 100% em diversas ocasiões) e que relançaram a economia do Brasil.
Lula aproveitou o dinheiro extra dos impostos, bem como dos rendimentos do petróleo, para lançar programas sociais extremamente ambiciosos e populares. Infelizmente, a sua utilidade é duvidosa, pois muitos dos pressupostos-base do Estado Social foram ignorados por Lula: as escolas brasileiras continuam a ser de péssima qualidade, os hospitais horríveis, a polícia corrupta, os tribunais inoperantes. A uma certa altura parecia que Lula governava apenas para a favela, desprezando uma classe média em crescimento.
Mas é este o público-alvo do PT, e na eleição presidencial de há uma semana tornou-se óbvia a divisão que dilacera o Brasil: os mais pobres sendo subornados a votar no PT, enquanto que nos Estados onde predomina a classe média se registou uma votação massiva no PSDB.
Paradoxalmente, o desenvolvimento do Brasil poderá acabar por ser o “calcanhar de Aquiles” da presidente Dilma Rousseff (vencedora com apenas mais 3% de votos que o seu opositor, Aécio Neves, numas eleições manchadas por possíveis ocorrências de fraude, que já estão a ser investigadas).
A economia do país começa a enfrentar graves problemas. Tal como na Argentina, na Venezuela e em Portugal, o dinheiro do Estado foi regularmente esbanjado em grandes obras públicas apenas com fins eleitorais. O campeonato mundial de futebol, apesar de ter sido um sucesso em termos de impacto comunicacional, deu azo a fortes protestos de uma classe média saturada das políticas do PT.
Em vez de ouvir as críticas, Dilma prepara-se para seguir a via que a maioria dos ditadores sul-americanos já seguiu: o plebiscito. Já foi anunciado nas últimas semanas que a presidente do Brasil pretende convocar um plebiscito para alterar a Constituição do país.

Por outras palavras, Dilma quer forçar o Congresso, através da ditadura da maioria, a aprovar as leis que ela acha que devem ser aprovadas. Uma das propostas é a proibição dos partidos com menos votos de terem acesso à representação no Congresso, dando ainda mais poder ao Partido dos Trabalhadores.
Já este ano, Dilma tentou colocar líderes de extrema-esquerda do Movimento dos Sem Terra em órgãos de decisão, por força de decreto.
O objectivo confesso é criar um sistema “bolivariano” como o da Venezuela, em que cada medida que os governos locais queiram tomar terá primeiro que ser aprovada por consulta popular, ou seja, pelos novos “sovietes”, denominados “conselhos populares”, que Dilma quer instituir.
Não é, portanto, coincidência que o regime ditatorial de Cuba tenha imediatamente dado os parabéns a Dilma pela sua vitória à tangente: tal como a Venezuela de Maduro, o Brasil está a tornar-se um precioso aliado deste dinossáurio comunista da América Latina.
Aécio Neves já anunciou que concorrerá às próximas eleições presidenciais, em 2018. Será que os “conselhos populares” vão permitir? Ou será que Dilma acabará por cair antes do final do mandato devido aos escândalos de corrupção que varrem o Brasil?
Para já, o PT continua a governar com o dinheiro dos outros…
Os Estados comunistas sempre se serviram do culto da personalidade criado em redor dos seus líderes – e, em alguns casos, tiveram de usar a sua memória para conseguirem sobreviver.
Lenine foi o primeiro a servir, depois de morto, esse culto.
Apesar de o líder soviético ter pedido para ser cremado, Estaline decidiu embalsamá-lo e expô-lo “religiosamente” na Praça Vermelha, no centro de Moscovo. Uma relíquia macabra que ainda hoje pode ser vista.
Sempre na senda soviética, o actual presidente da Venezuela decidiu também mandar embalsamar Hugo Chávez. Nicolas Maduro chegou a planear instalar o mausoléu numa favela, junto do eleitorado do “querido líder”.
O plano não foi avante por falta de condições (e provavelmente dinheiro) para o fazer, mas mesmo assim Chávez foi sepultado perto do edifício de onde tentou lançar um golpe para derrubar a anterior República.
O caso mais paradigmático do culto comunista dos mortos é o da Coreia do Norte. Tanto Kim Il-sung como Kim Jong-Il, avô e pai do actual líder, foram embalsamados e são venerados em cerimónias de Estado. Mais: ambos continuam a “governar” simbolicamente como “eterno presidente” e “eterno secretário-geral”, respectivamente.
Nem a morte os libertou…[/td_text_with_title]