JOÃO VAZ
Num panorama editorial dominado pelo esquerdismo e o politicamente correcto, de vez em quando aparece um ensaio assim. E, por sinal, a Guerra e Paz ainda vai sendo uma das casas que nos surpreende positivamente. Foi assim com John Gray, Paul Johnson, Roger Scruton e agora com Rodney Stark.
“O Triunfo do Ocidente” é um livro que vai contra muito do que se vende agora como verdadeiro e indiscutível. Por isso, não deverá merecer grandes destaques na Imprensa do costume. Vai contra um certo tipo de revisionismo permitido, o revisionismo bom, aquele que ensina que o Ocidente foi uma entidade maligna, exploradora e causadora de boa parte dos males do mundo, talvez de todos. Rodney Stark mostra-nos que não é assim, antes pelo contrário.
É claro que antes dele já houve quem o fizesse, mas nunca é demais recordá-lo, sobretudo quando se trata de um trabalho tão abrangente. Nele, o autor desmonta uma série de mitos que enxameiam hoje os discursos académico, político e afins. Entre outros, mostra-nos que as Cruzadas não são bem aquilo que se diz, mas antes uma resposta de um Ocidente ameaçado na sua fé e existência. Nada que uma pessoa com um mínimo de bom senso não possa constatar: é óbvio que a Reconquista e as Cruzadas são movimentos de resposta a agressões anteriores. Infelizmente, bom senso é coisa que não abunda hoje em muitos meios.
Outra das ilusões aqui recusada é a da Idade Média como época de obscurantismo. Há muito que medievalistas o vêm fazendo, mas o eco das suas investigações é relativamente fraco e um volume como este atinge sempre um público mais vasto. Assim, Rodney Stark demonstra que é na Idade Média que se devem encontrar as raízes de movimentos e evoluções futuras, do Renascimento à Revolução Industrial. Do mesmo modo informa-nos acerca da ligação entre Cristianismo e ciência, derrubando mais um dos enraizados ícones da mitologia iluminista e posterior, a de que a Igreja teria sido (e é) hostil à investigação científica.
Outra das verdades desmontada é a que diz respeito ao “brilhantismo da civilização islâmica”, que não foi assim tão excepcional e deveu, em grande parte, as suas melhores produções a infiéis que viviam sob o seu jugo, nomeadamente cristãos nestorianos e judeus.
Outras certezas absolutas são aqui revogadas, de forma sólida e bem fundamentada. Assim, e pese embora a existência de uma ou outra imprecisão histórica, sobretudo em termos de datas, temos no conjunto uma obra séria e informada que merece leitura atenta, sobretudo para aqueles que não aceitam o retrato do Ocidente que nos é dado, mas sabem que esse é o lugar por excelência da liberdade, da investigação e da grande cultura. Assim, e sem mais. De resto, se assim não fosse e continuasse a ser, os movimentos migratórios mostrá-lo-iam de forma clara. Afinal, não é para o Ocidente que quase todos querem vir e não é a ele que pretendem conquistar?