Que PSD?

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Pouco tempo depois de Rui Rio ter chegado à presidência do PSD, e após ter sido possível verificar o seu estilo pessoal e as suas primeiras ideias políticas, publiquei neste jornal um texto com o título de “O erro de Rui Rio”, onde tentei explicar que se Rui Rio não mudasse de programa e de estilo, acabaria por ser mandado de volta ao Porto. Infelizmente, não me enganei.

O PSD tem agora um novo Presidente, Luís Montenegro, que é muito diferente de Rui Rio, quer no estilo, quer nas ideias políticas, mas também não vejo que esteja a remar na direcção certa e pergunto-me se o problema é meu, do país, ou do PSD. De facto, não sei a resposta, mas nestas coisas da actividade política o melhor seria esperar para ver, todavia esperar não se dá bem com os meus hábitos de alguma impaciência, razão porque prefiro arriscar, não sem que antes tenha ido rever um texto do PSD de Outubro de 2013, aprovado no então Conselho de Ministros, que era uma proposta do Governo de então para “Um Estado Melhor”, que considero ser uma questão central para o futuro do PSD. Ao tempo, considerei que o texto era um bom passo na direcção certa, pelo que aqui reproduzo um parágrafo, cuja leitura aconselho a Luís Montenegro e que diz o seguinte: “é igualmente evidente que, para atingir objectivos plurianuais que têm objectivos de monitorização da União Europeia, Portugal precisa de pensar não apenas no “numerador – o défice – mas também no denominador – o produto. Os programas de ajustamento devem ter adesão aos factos económicos e, por isso, compreender os factos da economia real. Após 10 trimestres em recessão, Portugal poderá estar em vésperas de sair do ciclo recessivo. As previsões de crescimento para 2014 apontam para uma recuperação moderada, melhores indicadores de confiança, estabilização do desemprego e um forte contributo das exportações. O factor crítico continua a ser o investimento, essencial para a criação de emprego. É isso que justifica a opção prioritária para uma reforma do IRC, que o coloque entre os mais competitivos da União Europeia”.

Este parágrafo resultou num acordo com o PS de António José Seguro para a redução dos impostos, o que não teve continuidade e hoje não sabemos qual teria sido o seu resultado. Ao tempo, o texto agradou-me bastante para além da questão dos impostos e hoje vejo nestas poucas linhas um estilo e um pensamento político que está nas antípodas da prática posterior dos governos de António Costa e, pelos menos, longe do estilo de oposição de Luís Montenegro, razão porque o evoco aqui para melhor me explicar.

Do meu ponto de vista, o novo líder do PSD tem feito uma oposição ao PS muito distinta de Rui Rio, mais agressiva e mais presente, mas num estilo excessivo de campanha eleitoral, que se afasta da racionalidade e da necessidade dos portugueses saberem qual o projecto político do PSD. Escolhi este texto com dez anos para mostrar aquilo de que estou a falar e vindo do PSD. De facto, como é dito, a política “deve ter adesão aos factos económicos e, por isso, compreender os factos da economia real”. Sendo que também me agrada a ideia de a política ter a ver com o numerador e o denominador, conforme bem explicado no texto. Ou seja, salvo melhor opinião, ou Luís Montenegro encontra um estilo e alguns objectivos programáticos semelhantes aos deste texto de 2013, de forma a conseguir explicar, com a pedagogia necessária, o conteúdo das suas ideias aos portugueses, ou o seu destino será semelhante ao de Rui Rio. Portugal precisa hoje como de pão para a boca de ter uma estratégia clara com alguns, poucos, objectivos a atingir que compensem o vazio de ideias em que estamos a viver. A simples crítica, ainda que justa, não substitui o pensamento criador. Pela minha parte, escolhi a educação e a industrialização como os dois grandes objectivos nacionais, que tento explicar até à exaustão, mas, infelizmente, ainda não sei quais são as escolhas de Luís Montenegro.

Talvez seja útil voltar ao texto de 2013 para encontrar uma “Estratégia para o Crescimento, Emprego e Fomento Industrial (2013-2020)” e reforçar o que ali se menciona de aumentar o potencial do PIB, as exportações e reforçar o peso da indústria, além de melhorar a posição de Portugal no “ranking” de países da União Europeia amigos do investimento. Para os meus ouvidos estas são palavras justas, de que não ouço falar há bastante tempo.

Também, salvo melhor opinião, não vejo que seja possível vencer a máquina de propaganda do PS e todas as fantasias nela contidas sem um banho de realidade, ou apenas com outras palavras semelhantes habituais no léxico da política partidária portuguesa. Mesmo sabendo que o Partido Socialista muito tem feito nas últimas semanas, para já não falar nos últimos sete anos, para destruir qualquer sintoma de credibilidade da sua governação, é necessário afirmar um projecto político alternativo, apresentado com seriedade, competência e cujas ideias e propostas sejam claras e não se limitem à crítica avulsa. Posso estar enganado, mas muitos portugueses já estão fartos de ataques políticos e de debates inúteis, precisam de novas ideias e de propostas que possam ir para além da conjuntura. O Partido Socialista vive e sobrevive no mundo das palavras e longe da realidade, penso que os portugueses estarão agora prontos para valorizar as alternativas que acrescentem alguma pedagogia, racionalidade e realidade ao discurso político e, sabendo que nunca poderemos estar todos de acordo em tudo, tentemos então construir um acordo baseado no essencial.

O PSD tem essa responsabilidade, porque apesar do panorama partidário português ter mudado muito em pouco tempo, acredito que o partido continua a ter condições de alargar a sua base de apoio através do primado das ideias e menos de palavras com pouco sentido que enchem o nosso espaço público. É neste contexto que temos a obrigação de saber que o Chega, com a sua ausência de coerência e de projecto político favorece o PS, mas também, por isso mesmo, a alternativa só pode ser a apresentação de um outro projecto político claro, coerente e compreensível, alternativo ao vazio de ideias das ideologias que caracterizam actualmente o panorama político nacional. Acresce que O PSD tem ainda um capital humano com grande experiência governativa, que, infelizmente, tem desperdiçado ao longo dos anos, o que porventura se deve a um falso conceito de modernidade, o qual poderá estar na origem de algum do seu esvaziamento político. A juventude e a inovação das ideias são necessárias, úteis e positivas, mas devem possuir também a segurança dada pela experiência que contribua para a confiança dos eleitores.

A política portuguesa vive há demasiado tempo num clima de excesso de ideologia, sendo por isso necessária e urgente uma cura de realidade, que as pessoas compreendam e se disponham a construir.