A grande farsa das sondagens

0
2930

Manuel-Silveira-da-Cunha-avManuel Silveira da Cunha

As sondagens constituem um negócio extraordinário, hoje em dia. Os jornais, televisões e as rádios pagam rios de dinheiro por sondagens que se espera sejam fiáveis e credíveis.

No entanto, o maior negócio são os partidos e se, como agora, em tempo de legislativas é um fartote, imagine-se o bodo aos pobres que não são as autárquicas, em que cada candidato a mandarim local encomenda a sua sondagem no seu concelho, mais de trezentos a multiplicar por diversos partidos, e já ao nível de Freguesias se encomendam sondagens, pelo menos nas grandes cidades.

É evidente que negócio tão apetecível desperte a cobiça de uma série de farsantes, que com os métodos actuais podem criar qualquer resultado que interesse ao cliente, mesmo sem se dizer que estão a manipular os dados.

É na amostragem que se podem criar as maiores e mais fáceis manipulações, isto sem mentir, bastaria omitir. Basta utilizar uma amostra enviesada para criar um resultado apetecível. Um exemplo seria fazer a sondagem no distrito de Setúbal, com indicação provável da distribuição de deputados no respectivo círculo eleitoral. Se o cliente fosse o partido comunista, procuraria encontrar mil pessoas, o que parece ser um número mágico. Começaria por ir para a porta da festa do Avante questionar pessoas de forma a o partido comunista ter logo uma larga margem; depois de ter entrevistado um número como 500 pessoas, faria o resto da amostragem de forma séria.

Evidentemente que, sem manipular muito a sondagem, daria ao PCP mais três ou quatro deputados em Setúbal. Há formas muito mais inteligentes de fazer a coisa. Por exemplo, utilizar uma entrevista telefónica para números fixos, que só pessoas conservadoras utilizam, ou ir a Freguesias que nas últimas eleições mais penderam para os interesses que o cliente pretende, que nem sempre são uma simples vitória, que nisto da manipulação política o que conta é enganar os eleitores, que uma pequena margem de vitória do adversário até pode, em certos casos, ser boa para a mobilização do “nosso” eleitorado.

Vamos começar por esclarecer o significado de uma ficha técnica de uma sondagem, para que o público possa ler uma sondagem com olhos de ver. A dimensão da amostra é o número de pessoas que se contactou. Logo à partida muitos desses “entrevistados” se recusam a responder. Comecemos com mil, se a taxa de respostas é de 70% temos apenas 700 respostas, o que aumenta a margem de erro.

Depois temos os indecisos, que respondem porque estão mesmo indecisos, ou porque não querem dar a entender o sentido do seu voto. Imagine-se que esta taxa é de 32%, e aqui nunca esclarecem se é sobre o total de mil ou sobre os 700 que responderam. Vamos supor que é sobre os 1.000 iniciais: passámos a ter 700-320=380. Ou seja, passámos a ter apenas 380 respostas com sentido estatístico!

Ou seja, a margem de erro já ronda os 5%, o que significa que se a PAF tem 40% (152 respostas) e o PS 35% (133 respostas), quer dizer de facto que o PSD tem entre 35% e 45% e que o PS terá entre 30% e 40%, o que se chama um empate técnico, porque os intervalos se sobrepõem e a diferença de 19 respostas é demasiado pequena para não ser uma mera flutuação estatística.

Pior, se o intervalo de confiança é de 95%, significa que estas margens de erro ocorrem em 95% das sondagens efectuadas, ou seja, em cada 20 sondagens há uma que falha estrondosamente, isto admitindo que uma amostragem foi bem feita, coisa da qual nunca há certezas, e acreditando na honestidade na realização da amostragem. Cerca de 380 respostas válidas não têm grande significado estatístico, sobretudo quando se consideram os pequenos partidos, em que 2 respostas de diferença significam um deputado que pode ou não existir! É ridículo afirmar com base num estudo destes que o partido do Dr. Marinho e Pinto pode ter um deputado ou não, por exemplo, pois afinal, 5 respostas numa sondagem destas indicar dar um deputado! Ridículo, mas os locutores falam dos possíveis resultados sem se rirem, pois a ignorância é insondável…

Por estas razões se percebe como têm falhado este tipo de sondagens. Consideramos que quando a amostra é de 4.000 elementos, e não se usam métodos arcaicos, como o da entrevista por telefone fixo, a sondagem começa a ter um pouco de credibilidade. Mas sondagens com 4.000 elementos em urna, com entrevistas no terreno, cobrindo todo o território nacional de forma aleatória, são demasiado caras para um país empobrecido.

E continuam todos os comentadores a comentar sondagens com pouco mais de 300 respostas reais, o que constitui um absurdo e uma farsa total. A continuar assim, a única sondagem será a das eleições…