Teixeira de Pascoaes foi, de longe, o poeta de eleição de José Marinho – de tal modo que, para além de Leonardo Coimbra, só a Pascoaes chamou Marinho de “Mestre”. Eis, desde logo, o que podemos atestar lendo a sua dissertação de Licenciatura, Ensaio sobre a Obra de Teixeira de Pascoaes, onde escreveu, em jeito de conclusão, que “ele é depois de Camões o maior poeta de Portugal e um dos grandes poetas modernos sendo que, segundo nos parece, realizou com o Regresso [ao Paraíso] a obra mais afirmativa que se fez após o Fausto”.
Eis, ainda, o que podemos atestar lendo o conjunto de textos que redigiu, entre a década de quarenta e os primeiros anos da de cinquenta, para um projectado livro sobre Teixeira de Pascoaes, intitulado Pascoaes e a poesia do etéreo, onde o afirma como “o primeiro poeta português”, como um dos “raros sobreviventes de uma maravilhosa raça de homens ou de semi-deuses”, como um representante da “mais pura sabedoria do ocidente e do oriente”, cuja poesia “se situa no extremo processo agónico do cristianismo e anuncia entre sombras e contrastes a nova idade do ser e da vida sempre adiada, sempre presente”. E, por isso, qualificou-o Marinho, em outros textos seus, como “o mais glorioso e irredutível dos nossos heterodoxos”, como “o novo arauto da velha heresia”, como “o mais genial vidente da nossa poesia, e sem dúvida dos mais geniais videntes que o nosso Ocidente viu”, escrevendo ainda, por ocasião da sua morte, as seguintes palavras: “Poesia prodigiosa e imensa, devemos-lhe uma parte da iniciação no sentido daquela difícil sabedoria de que os poetas visionários e os pensadores afins são, na Europa, os últimos representantes visíveis”.
A morte do autor do Regresso ao Paraíso, ocorrida a 14 de Dezembro de 1952, provocou, aliás, em Marinho, uma comoção similar à provocada pela morte de Leonardo Coimbra, bem expressa nas seguintes passagens: “A morte de Pascoaes não é morte de homem. No entanto, sinto-me perturbado pelo desaparecimento deste ser estranho e singular que em vida tanto me intimidou…”; “Agora que, depois da morte de Leonardo Coimbra, morre também Pascoaes, ninguém resta para falar do que mais importa, ficando em cena apenas os que confundem filosofia com ciência ou cultura, e os que da poesia retêm afinal a expressão humana, angustiada ou desesperada, confiante ou esperançosa, temos nós de fazer das fraquezas força”. Este paralelo é, de resto, tanto mais pertinente, porquanto, como o próprio José Marinho assumiu, foi o autor d’ A Alegria, a Dor e a Graça que o iniciou na obra de Teixeira de Pascoaes – nas suas palavras: “Quando, há já mais de trinta anos, sob o influxo do magistério de Leonardo Coimbra, deixei penetrar a minha alma da música subtil e do sentido remoto da poesia de Teixeira de Pascoaes, começou um deslumbramento que não mais terminou. Mas talvez eu não devesse dizer que ‘deixei penetrar a minha alma’. Não houve aí da minha parte nenhum consentimento. A verdade é que fui arrebatado, violentado, vencido (…). Com isso, começaram para mim (…) dificuldades consideráveis”. ■