Ouvir uma canção, ver um filme ou visitar um museu custam hoje ao contribuinte uma enormidade em impostos. Entretanto, as famigeradas Fundações recebem dinheiro a duplicar para fazerem o mesmo que, em muitos outros países, se consegue com verbas privadas. Descubra as diferenças.
Na generalidade dos países do mundo, uma Fundação é uma organização criada por agentes privados com o objectivo de oferecer à sociedade o seu contributo específico.
Objectivo, diga-se, nobre.
Existem Fundações de mecenato artístico, de apoio aos desportistas, de apoio aos pobres, de pesquisa científica e médica, muitas mais. Invariavelmente, estas Fundações vivem de financiamento privado – e só em casos muito especiais, em que haja óbvia vantagem pública, podem receber financiamento (regulado) do Estado.
Tal não estava a acontecer em Portugal. O censo realizado no universo português das Fundações em 2012 mostrou que muitas delas se encontravam completamente dependentes do Estado. Algumas limitavam-se, com o dinheiro do contribuinte, a pagar ordenados chorudos a dirigentes e empregados.

Nessa altura, existiam no nosso país 713 Fundações, das quais só 190 puderam ser analisadas a fundo (o ‘lobbying’ ainda foi forte). Destas, 55 acabaram por ser sumariamente extintas, enquanto 80 viram drasticamente cortado o financiamento do Estado. Pouparam-se quase mil milhões de euros, só nesta operação.
O que o censo descobriu foi uma estrutura doente, sem credibilidade na sociedade e desesperadamente a necessitar de cortes, até mesmo para devolver a dignidade às instituições deste tipo com enorme valor público, como a Fundação Calouste Gulbenkian em termos culturais ou a Fundação Champalimaud na área da pesquisa médica.
E, no entanto, quando o Governo decidiu racionalizar as despesas com o sector das Fundações, levantou-se um clamor entre os “suspeitos do costume” da esquerda caviar, cuja narrativa catastrofista decretou que qualquer corte na despesa do Estado resulta sempre em apocalipse.
Mas olhemos, por exemplo, para o caso dos Estados Unidos da América, que para a esquerda radical é o paradigma do “capitalismo selvagem”.
Iniciativa social privada
Talvez não haja país com maior número de Fundações do que os EUA –Fundações influentes e poderosas, resultado de dois séculos de uma cultura de filantropia entre aqueles com mais posses.
Foi destas iniciativas privadas que nasceram organizações como a Fundação Bill e Melinda Gates, fundada pelo homem mais rico do mundo e que está a ajudar a curar doenças em todo o planeta, bem como a Fundação Carnegie, que promove o conhecimento, e a Fundação Fullbright, com cujo apoio largos milhares de alunos portugueses (e de outros países) se formaram academicamente nos EUA.
Estes são apenas alguns pequenos exemplos de todo um sector económico que floresce naquele país, e que não consome um único tostão aos contribuintes.
Ao dependerem na sua totalidade do Estado, as nossas Fundações não eram (ou não são, em alguns casos) muito diferentes de uma direcção-geral, ou de uma secretaria de Estado.
Um dos casos mais graves era a Fundação para as Comunicações Móveis, criada pelo habitante da cela 44 da prisão de Évora, que consumiu vastos milhões de euros para distribuir computadores Magalhães. Esta instituição era tão “independente” do poder do Estado que Sócrates apareceu inúmeras vezes a entregar o pequeno computador às crianças, sempre com as câmaras da televisão atrás.

Entretanto, no Reino Unido, uma outra Fundação (esta a sério) criou o mini-computador “Raspberry Pi”, que faz tudo o que o Magalhães faz. E faz ainda mais: ensina as crianças a montar e programar computadores, pois é vendido em peças, para estimular a inteligência juvenil.
Cada computador custa 30 euros e já foram vendidos dois milhões de unidades. Entusiasmada pelo sucesso, a Fundação Raspberry Pi já lançou agora o segundo modelo, também usando tecnologia britânica, dinamizando o sector tecnológico do Reino Unido sem um tostão de investimento estatal.
Monumental pagamento
Quando decidiu tomar a iniciativa de racionalizar as despesas com as Fundações, o próprio Governo português admitiu que muitas delas não tinham sequer razão de existir. O censo tinha por objectivo “a redução do peso do chamado ‘Estado-Paralelo’, consumidor de amplos recursos públicos e relativamente ao qual surge, não raro, associada a ideia de que não existe uma contrapartida de vantagens públicas entregues à sociedade que justifique a sua existência”.
E, no entanto, persistem em Portugal as situações aberrantes, nomeadamente na área cultural. Basta comparar.
Quem visita a cidade de Londres fica por vezes surpreendido ao descobrir que a entrada em vários dos melhores museus da capital da Grã-Bretanha é gratuita. Existe quase sempre uma caixa para doações, é verdade (geralmente cheia, dada a boa-vontade que existe perante estas instituições), mas ninguém é obrigado a gastar um cêntimo (ou um penny, na moeda local) para visitar locais como o enorme Museu Britânico ou o Museu Imperial da Guerra.
A razão? No Reino Unido, as organizações culturais têm de optar por uma de duas situações: ou recebem financiamento público, e por isso não cobram bilhetes de admissão ao contribuinte, ou então são entidades privadas que se auto-financiam.
O famoso museu Madame Tussauds, por exemplo, é uma instituição completamente privada que não recebe nem um tostão do Estado, razão pelo qual cobra bilhetes. Não que precise dos dinheiros públicos: uma excelente campanha de dinamização do turismo e da imagem cultural do Reino Unido, associada a uma gestão apolítica, significa que o museu é muito lucrativo.
Organizações que optem por financiamento público, por outro lado, não podem cobrar pela entrada. A lógica na base desta política é democrática: se o contribuinte já financia a organização uma vez, através de impostos, então o seu bilhete já está pago. O bilhete dos turistas também já está pago através de uma minúscula taxa cobrada às companhias aéreas do Reino Unido.
Outra lógica
Não deixa de ser irónico que o cidadão português possa visitar o património do nosso mais antigo aliado de forma gratuita e, no entanto, tenha de pagar para visitar o património português, mantido e pago pelos nossos impostos. Custa seis euros por pessoa entrar no Museu de Marinha, em Lisboa. O mesmo preçário se aplica ao Museu Nacional dos Coches e ao Museu Nacional de Arte Antiga, para só dar alguns exemplos.

Muitos destes museus e monumentos são dirigidos pela Direcção-Geral do Património Cultural, que, segundo o Orçamento do Estado, recebe 36 milhões de euros, provenientes dos impostos, para financiar as suas operações. A juntar a esta quantia ainda cobram bilhetes nos locais, o que significa que, por exemplo, a Torre de Belém ainda facturou mais de um milhão de euros em admissões no ano de 2012, e o Mosteiro da Batalha rendeu 900 mil euros no mesmo ano.
Os museus da capital do Reino Unido, funcionando numa outra lógica, registaram mais de mil milhões de lucro no ano passado, dinheiro que é sistematicamente investido a garantir o futuro daquele património. O enorme aumento de visitantes deixou as caixas de doações cheias, devido à boa-vontade dos muitos patronos do espaço, enquanto as receitas das lojas dos museus, bem como dos vários cafés e restaurantes associados, dispararam. O Estado, por sua vez, revitalizou o centro da cidade, dinamizou o turismo, e fez uma boa maquia através do IVA local.
Em contrapartida, a autarquia de Lisboa, liderada pelo socialista António Costa, cobra oito euros e meio a um visitante que queira entrar no Castelo de São Jorge. O local histórico rendeu cinco milhões de euros aos cofres da Câmara. Talvez seja por isso que Costa queria fazer o “sacrifício” de ficar com o Museu dos Coches.
Artistas das taxas
Tendo dado o primeiro passo em relação à inversão das injustiças, o Governo liderado por Pedro Passos Coelho borrou a pintura logo a seguir, ao introduzir uma polémica taxa sobre dispositivos electrónicos, conforme previsto na Lei da Cópia Privada, lei introduzida pelo actual secretário de Estado da Cultura, Barreto Xavier.
No caso desta lei, nem podemos falar de uma duplicação das taxas, mas sim de uma triplicação. Para financiar a “arte” e os “artistas”, o cidadão agora começa por pagar os seus impostos, que financiam o orçamento do Estado, paga depois o IVA sobre o aparelho em que vai ouvir/ver uma música ou um filme, e paga por fim impostos sobre essa música e esse filme.

Os proventos da taxa sobre dispositivos electrónicos seguem directamente para a Sociedade Portuguesa de Autores, organismo que demonstra tanta responsabilidade pelo dinheiro esmifrado aos portugueses que em 2008 se descobriu que uma adjunta, Catarina Rebelo, filha do então presidente da instituição, auferia 12 mil euros mensais de ordenado.
Tal como no caso dos museus e monumentos, o Estado financia estas organizações “culturais” com uma quantia muito significativa de dinheiro. No caso do segmento “criação artística”, que diz respeito aos teatros e à criação artística e literária (segundo documentação oficial do Estado), mais de 40% de todo o dinheiro provêm dos cofres do Estado. Dinheiro que é depois aplicado numa imensa lista de grupos de teatro e artes, muitos deles simples cobertura para actividades políticas radicais.
Cultura do Estado
A manutenção da “cultura do Estado” é justificada pelas elites como necessária para garantir o acesso da população a bens culturais de excelência. Mas, pelos vistos, pouco esforço é feito para atrair os cidadãos a este tipo de cultura.
Consultando os números oficiais, verifica-se que diversos segmentos culturais conseguem sobreviver bem quando sustentados pelo mercado. O que é categorizado como “indústrias culturais” e “indústrias criativas”, ou seja, o que é considerado, de forma algo ‘snob’, como a cultura comercial, gera algo como 5 mil milhões de euros por ano, dos quais apenas uma pequena fatia provém do Estado.
Só no ano de 2014 gastaram-se 15 milhões de euros do nosso dinheiro a apoiar grupos e associações da dita “alta cultura”. O peso deste ‘lobby’ é enorme, visto que é apoiado pela dita “minoria barulhenta”. Por exemplo, a actual porta-voz do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, é líder de um destes grupos de teatro financiados pelo Estado, a “Companhia de Teatro de Visões Úteis”. Úteis a quem? Ao povo não é, com certeza.
Enquanto a esquerda continua a veicular o velho ‘slogan’ de que o Estado tem de controlar tudo, o povo continua a pagar. Muitas vezes, a pagar por aquilo que não pode usufruir…