Para já, sabe-se apenas que as autoridades tencionam manter um controlo excepcionalmente apertado sobre as idas dos portugueses à praia, num Verão que os meteorologistas prevêem quente e convidativo. Enquanto não existem regras, há quem fale em reforço de patrulhamento, limitações de horas para permanecer no areal ou dar um mergulho, e dessa forma criar uma espécie de turnos, passando por ‘drones’ ou fiscalização feita a partir de sinais de telemóvel. Ninguém se entende.
Uma coisa é certa: o Executivo já esteve para divulgar as regras para utilização balnear das praias este ano, mas a data tem vindo a resvalar. Para sorte do Governo, Maio arrancou com um clima pouco propício à praia, mas quando o calor chegar a pressão dos cidadãos vai ser muita. Já se nota um extremo cansaço destes meses de restrições, e no Facebook e outras redes sociais já ferve o debate sobre possíveis regras restritivas do acesso às praias, regras em geral muito mal recebidas.
Numa entrevista ao Porto Canal, António Costa confessou que o tema férias, associado ao tema praias, é uma das questões mais difíceis neste momento. O Primeiro-Ministro não desaconselha as praias, mas reconhece que este “é dos temas mais delicados que temos pela frente”. “Ainda não encontrei uma boa fórmula em que eu próprio acredite”, afirmou, a propósito das regras para se poder frequentar as praias neste Verão. O Primeiro-Ministro diz ter esperança de poder gozar férias, mas mostrou-se pessimista com o acesso às praias ao ponto de sugerir que se encontrem alternativas. “Estou a ver se invento outro programa de férias”, afirmou, embora ressalvando que espera “que as praias e as férias possam existir, para permitir reanimar a actividade turística”.
Antes disso, o Primeiro-Ministro disse que a decisão mais difícil que teve de tomar durante esta crise sanitária do novo coronavírus foi a primeira, quando percebeu que “nunca íamos ter informação científica suficientemente sólida para nos amparar nas nossas decisões”. Até agora – acrescentou – “felizmente, não me arrependi de nenhuma, mas sei que tenho sempre o pescoço no cutelo”.
O caso das praias é um tema onde a crescente popularidade de António Costa nos últimos meses pode vir a resvalar significativamente. Vários elementos do Executivo referiram-se já publicamente ao delicado assunto. Tiago Antunes, secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro, admitiu que o Governo está a estudar fechar as praias pequenas este Verão para impedir a aglomeração de pessoas.
“Em princípio, haverá regras distintas para praias pequenas e grandes, porque obviamente é muito diferente uma praia com um longo areal – onde as pessoas se podem espalhar e onde não há aglomerações – de uma praia pequena, onde é muito mais difícil dificultar essa aglomeração. Eventualmente poderá haver algumas praias onde, não sendo possível fazer este controlo, poderá ter de haver algum fecho”, disse em entrevista ao Público e à Renascença.
Para já, sabe-se que, no regresso às praias, terá de haver um limite de pessoas por praia – “lotação máxima” – e será ainda necessário impor distâncias mínimas entre as sombras dos banhistas. Falou-se ainda da possibilidade de “colocação de torniquetes” à entrada para contar o número de pessoas no areal, diz o secretário de Estado Adjunto do PM.
Enquanto o Governo estuda o caso, deixando os portugueses em suspenso em relação às tradicionais férias de Verão, as medidas que aparecem nos Media colidem com a liberdade dos cidadãos e podem levantar uma forte onda de contestação.
Assim, a GNR, a PSP e a Polícia Municipal deverão controlar os acessos dos carros às praias, com o bloqueio de estradas e/ou de estacionamentos, bem como o controlo dos transportes públicos, designadamente comboios e autocarros. O Governo deverá autorizar a Polícia Marítima a reforçar as suas patrulhas com fuzileiros da Marinha para fiscalizar os paredões e os areais. Os fuzileiros já participam no patrulhamento das praias através do projecto Sea Watch.
Mas a capacidade de aceitar medidas tão restritivas por parte dos portugueses tem os seus limites. As regras para as praias podem vir a ser o calcanhar de Aquiles de António Costa.
«DGS prepara regras
Também a Direcção-Geral da Saúde (DGS) garantiu estar a ultimar regras para o turismo em Portugal em altura de pandemia “Há várias coisas que têm de ser consideradas, e uma delas tem a ver com o fluxo de pessoas, que não se esperando que seja muito grande, tem de ser controlado para que se consigam cumprir regras”, declarou a directora-geral, Graça Freitas.
A Comissão Europeia também refere estar a terminar as directrizes para os Estados-membros adoptarem sobre a retoma do sector turístico, e leva Graça Freitas a vincar ser necessário “compatibilizar fluxos de pessoas com regras sanitárias e de segurança”. “E essas regras têm a ver, no que diz respeito ao sector do turismo, com a restauração – e já há uma orientação para isso, sobre como é a lotação, o comportamento e as regras da organização –, depois o sector hoteleiro, em que estamos a trabalhar, e depois uma área muito importante que é a das praias, como é que vão ser utilizadas, quer por turismo interno, quer por turismo externo”, referiu.
Indicando que estas regras estão a ser ultimadas para estarem, desde logo, alinhadas com as directrizes de Bruxelas (que à hora de fecho desta edição ainda não eram conhecidas), Graça Freitas notou que o país vai “tentar recuperar a actividade turística normal”, nomeadamente tendo em vista a próxima temporada de Verão, mas reiterou que esta será sempre uma “normalidade diferente, com regras diferentes”.
“Estamos a trabalhar nesse equilíbrio, em voltar à normalidade possível com o cumprimento de regras em todo o fluxo de pessoas no turismo, seja nacional, seja internacional, e isso está a ser visto com muito cuidado para podermos manter segurança e prevenção de novas infecções”, adiantou Graça Freitas.
Autarcas algarvios protestam
Enquanto muito se fala sem se saber o que efectivamente vai ser feito, as autarquias do Algarve protestam desde já com algumas hipotéticas medidas, deixando os seus avisos.
A semana começou com o presidente da Comunidade Intermunicipal do Algarve (AMAL) a defender que devem ser as autarquias e as capitanias a operacionalizar a vigilância nas praias. “Os autarcas do Algarve, de uma forma generalizada, não vêem com bons olhos formas mais intrusivas de fiscalização, como pulseiras, ‘drones’, torniquetes, porque não cremos que isso seja uma grande solução”, disse à Lusa o presidente da AMAL, António Pina.
O presidente da associação que agrega os 16 municípios do distrito de Faro defendeu que “devem ser as autarquias e as capitanias a operacionalizar e fiscalizar as praias”, depois de o Governo e a DGS definirem as regras gerais, “como o afastamento e o número de pessoas por grupos”. “A AMAL não defende necessariamente vigilância privada, no conceito de vigilância de empresas privadas. Nós defendemos é que as regras emanadas pelo Governo devem ser suficientemente latas, por forma a que os municípios, as capitanias e as entidades do ambiente possam, depois, criar as condições para que as praias sejam utilizadas em segurança e, acima de tudo, que não se encerrem praias”, sustentou.
Segundo António Pina, que é também presidente da Câmara de Olhão, no Algarve existem “realidades muito diferentes”, desde pequenas praias a extensos areais, “que só os municípios conhecem no sentido de poderem adaptar as condições de fiscalização a cada uma delas”.
Pina reconheceu que a vigilância em todas as praias apenas pelas forças policiais “não vai ser uma tarefa fácil”, defendendo a contratação de pessoas para efectuarem acções de sensibilização e organização de grupos nos areais. “Podiam ser contratados mais nadadores-salvadores para fazer essa fiscalização e também pessoas que nesta fase não vão ter emprego na área do turismo, pessoas até com formação no atendimento e que falam algumas línguas”, sublinhou. Segundo o responsável, essas pessoas actua-
riam sempre em articulação com a Polícia Marítima, “porque a autoridade só pode ser exercida pelas forças da autoridade”. ■