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É a grande questão política do momento: que política deve a Europa adoptar face aos imigrantes legais e ilegais que continuam a chegar às nossas costas? O debate é intenso e complexo, mesmo que algumas forças políticas o queiram esconder.

Este ano estima-se que vão chegar milhões de imigrantes ilegais à Alemanha, França, e Reino Unido. As vozes contra esta gigantesca vaga de imigração descontrolada ouvem-se em todos os sectores das sociedades europeias. Na Grã-Bretanha já não é só a direita, representada pelos eurocépticos do UKIP e pelos conservadores, a criticar o fenómeno. O jornal de centro-esquerda “The Independent”, por exemplo, criticou abertamente o governo por ter prometido deixar apenas entrar 100 mil pessoas, enquanto os números mostram que 330 mil imigrantes chegaram ao Reino Unido, a maioria em situação ilegal.

Os pontos de vista sobre esta questão encontram-se muito divididos. Os liberais assumem que mais imigração será, a longo prazo, uma fonte de crescimento económico, e que os imigrantes ocupam principalmente postos de trabalho que os povos nativos não desejam. A elevadíssima taxa de desemprego na Europa, combinada com políticas de subsídios de desemprego muito mais restritivas, têm vindo a derrubar esta teoria.

A vontade de debater é forte entre os povos europeus. Ainda não foi encontrada resposta para a pergunta: “como é que receber todos os imigrantes que apareçam não incentiva outros a continuarem a querer vir?”

Várias forças políticas consideram que as actuais medidas permissivas incentivam mais pessoas a arriscar viagens altamente perigosas para uma Europa que não tem condições económicas para as receber. Até mesmo líderes africanos, como o presidente da Conferência Episcopal da República Democrática do Congo, o Bispo Nicola Djomo, já pedem que os seus jovens não se arrisquem a fazer a viagem. “Usai os vossos talentos e outros recursos para renovar e transformar o nosso continente e para a promoção de uma justiça, paz e reconciliação duradouras em África”, pediu o Bispo, que apelou aos jovens para não se deslumbrarem com uma “riqueza fácil” que não existe na Europa.

Mas a “integração sem perguntas” continua a ser a política oficial da maioria dos estados da União Europeia, especialmente a Alemanha. Questionar esta política é proibido em muitos países, sob pena de se ser considerado “xenófobo”, “racista” ou pior. Na semana que passou, o governo alemão proibiu uma manifestação anti-imigração ilegal, ao mesmo tempo que autorizou uma manifestação, intitulada “festa de boas-vindas aos imigrantes”, organizada por grupos anarquistas e de extrema-esquerda, muitos dos quais descendentes dos mesmos grupelhos que aterrorizaram a Alemanha Federal com ataques bombistas nos anos 70 e 80. Sendo a voz de quem discorda silenciada, é natural, pelo menos em democracia, mesmo uma democracia limitada como a portuguesa e a europeia, que os grupos discordantes se organizem politicamente. Esses grupos começam agora a aproximar-se das estruturas de governação.

Poder à vista!

A Frente Nacional tem constantemente “conquistado” o eleitorado do Partido Socialista, assustado com a possibilidade de continuar a perder direitos e postos de trabalho devido à pressão imigratória. O PS pouco ou nada tem feito para apaziguar os medos do seu eleitorado, razão pela qual está a perdê-lo. O eleitorado “clássico” de direita, esse, continua reunido em volta do partido de Sarkozy, que também exige restrições imediatas à imigração, deixando o PS cada vez mais isolado à medida que as eleições de 2017 se aproximam.

Mas até nos países inspiradores das políticas de integração, os países nórdicos, a contestação popular está a subir drasticamente, para surpresa e choque do poder estabelecido. Nas eleições de Setembro de 2014, o Partido dos Democratas Suecos alcançou um histórico terceiro lugar, com 800 mil votos. Considerado um movimento “nacionalista” e “reaccionário” pelo “centrão”, a análise do seu espectro político mostra que se encontra mais próximo do Partido Conservador britânico ou da União por um Movimento Popular de Sarkozy.

Mesmo assim, o poder sueco preferiu fazer um “bloco central” aglomerando partidos de direita e esquerda a ter de convocar eleições em 2015, nas quais se assumia que o povo daria aos Democratas Suecos um mandato ainda maior. A resposta foi “repressão democrática”: os militantes e eleitores deste partido não são convidados para debates, são constantemente insultados pelos Media e achincalhados nas ruas. Isto pelo “crime” de se oporem às políticas de imigração do seu país, um direito supostamente democrático. A repressão, no entanto, não está a funcionar, visto que, segundo uma sondagem realizada já em Agosto, caso as eleições fossem hoje, os Democratas Suecos venceriam com 25% dos votos.

Na Dinamarca, entretanto, o Partido Popular Dinamarquês, conservador, monárquico e anti-imigração, alcançou o segundo lugar nas eleições legislativas com 21% dos votos. O partido ganhou celebridade quando se assumiu como defensor da liberdade de expressão a propósito do escândalo das caricaturas de Maomé. O seu slogan “liberdade de expressão é algo dinamarquês, a censura é que não” tornou-os populares entre o eleitorado, sendo agora um poderoso sustentáculo do actual governo de centro-direita.

Contestação interna

Nem todos os movimentos anti-imigração provêm de forças externas: a contestação interna nos partidos do sistema cresce de dia para dia. Na Alemanha, país que está a sofrer mais intensamente com a vaga de imigração, é maioritariamente dentro da União Democrata Cristã, de Ângela Merkel (sigla em alemão: CDU), que se levantam as vozes mais poderosas contra as políticas de porta aberta da Alemanha. Muitos dos manifestantes que chamaram “traidora” à Chanceler pertencem ao seu partido: não são “neo-nazis”, como muitos foram considerados pela imprensa.

Na verdade, os mais recentes estudos mostram que a maior parte da contestação anti-imigração na Europa provém do eleitorado de centro, especialmente aquele mais dependente do seu salário para viver. Razão pelo qual, dentro de muitos partidos social-democratas, aumenta a pressão para uma resposta humanitária, mas decisiva, contra a vinda dos imigrantes. Alguns políticos até defendem que sejam colocados soldados da UE na costa da Líbia, país actualmente sem lei nem Estado, para evitar a travessia. Outros consideram que a UE deveria fazer mais para apoiar a Turquia e o Líbano de forma a impedir que os imigrantes sintam necessidade de vir para a Europa. Em geral, os europeus desejam que a União enfrente o cerne do problema, em vez de enfrentar apenas as consequências.

Medidas duras

Enquanto não há, para este grave problema, uma resposta eficaz da Europa como um todo, vários países vão reagindo como podem – embora, geralmente, com uma enorme contestação das forças do “politicamente correcto”. A Macedónia enfrentou uma crise migratória como nunca tinha visto quando dezenas de milhar de imigrantes forçaram a fronteira para entrar no país. As forças policiais tentaram reagir, mas a pressão internacional forçou a pequena nação a ceder entrada.

A Hungria, governada por um partido de direita anti-imigração, reforçou a sua vontade de não perder controlo das fronteiras, e o primeiro-ministro anunciou a construção de um muro na fronteira com a Sérvia e o destacamento do exército para as fronteiras, de forma a tentar impedir o fluxo demográfico. Estas barreiras, no entanto, ainda de pouco servem, pois os barcos continuam a chegar. Grande parte da culpa pelos eventos dramáticos dos recentes dias cai sobre a irresponsabilidade do Syriza, que não consegue governar, nem deixa governar, a Grécia.

A Austrália começa a ser vista como um exemplo, citado em jornais como “The Guardian” e o “Financial Times”. Tendo adoptado políticas de imigração duras, mas justas, o governo australiano, quando confrontado com uma crise migratória similar, assumiu imediatamente uma postura firme pela qual nenhum imigrante ilegal poderia ficar na Austrália, sendo os imigrantes conduzidos a centros de detenção em ilhas nas redondezas da Austrália, onde podem ficar até decidirem ir embora. Apenas a imigração legal conta, para o governo australiano. Panfletos, alguns até com ilustrações para serem compreendidos pelos iletrados, foram distribuídos nos países de onde os imigrantes ilegais costumam partir. A mensagem era clara: “A Austrália apenas aceita imigração legal”.

É urgente encontrar uma solução para a imigração, preferencialmente com um debate alargado. Mas muitas forças continuam a assobiar para o lado, a chamar “racistas” às vozes discordantes e a ignorar a vontade popular. Aí está uma das incongruências da democracia: por vezes, os eleitores querem o contrário do que querem os políticos que elegeram…