MIGUEL MATTOS CHAVES
Dados os últimos acontecimentos na Europa, não posso deixar de intervir para tentar contribuir para uma melhor informação sobre o que se passa, embora de forma necessariamente breve, a exemplo do que tenho feito nas conferências que tenho proferido.
Em primeiro lugar, uma tentativa que caracterize esta velha/nova ameaça que tem evoluído em origem, métodos e alvos. Não há ainda nenhuma definição unanimemente aceite pela comunidade internacional. O Objectivo Político – aspecto que parece unir vários autores – será infundir o terror e desestruturar a sociedade ocidental. Tudo o mais (quanto aos Alvos, ao Efeito produzido, ao Método utilizado e o Contexto em que verifica) provoca ainda grandes divisões entre os vários autores que analisam este fenómeno.
Algumas tentativas de definição são protagonizadas por individualidades e por entidades oficiais. Vejamos então algumas destas:
Diz Michael Walzer que o terrorismo é a matança deliberada de pessoas inocentes, aleatoriamente, a fim de espalhar o terror entre toda a população e forçar a mão dos seus dirigentes. Por seu lado, Walter Laqueur refere que terrorismo é uso de ameaça ou o uso da violência como um meio de combate, ou uma estratégia para conseguir certos objectivos, que pretende infundir nas vítimas um estado de medo, que é impiedoso e se encontra à margem de toda a regra humanitária, e que a propaganda é um factor essencial da estratégia terrorista. Ainda um outro autor, Boaz Ganor, diz que terrorismo é uma forma de luta violenta na qual a violência é deliberadamente usada contra civis, de modo a atingir objectivos políticos. Por fim, o Departamento de Defesa norte-americano, ao tentar definir esta ameaça, diz que terrorismo é o uso calculado da violência ou da ameaça da violência contra indivíduos ou propriedades, para infundir o medo, com a intenção de intimidar governos ou sociedades e com o fim de perseguir objectivos que geralmente são políticos, religiosos ou ideológicos.
A minha contribuição para a definição deste fenómeno é tentar sistematizar a questão da seguinte forma:
- MEIOS que utiliza: acções armadas.
- OBJECTIVOS que persegue: subverter ou desestabilizar a Ordem Política estabelecida nos Estados e a sua Ordem Jurídico-Institucional.
- ALVOS da sua acção: as populações, ou detentores do Poder.
- FINALIDADES: provocar efeitos nos actores políticos, instituições relevantes, civis ou de segurança e defesa.
- MOTIVAÇÕES: podem ser políticas, religiosas ou civilizacionais.
Muitas vezes o terrorismo é confundido com guerrilha. Vejamos algumas diferenças, para situar melhor o problema:
A Guerrilha tem objectivos político-militares; em termos da territorialidade da sua acção, esta é contida em território definido, com linhas de comando político-militares, geralmente abrigadas em Estados amigos; o seu modo de operação faz-se geralmente através de células ou de grupos armados de dimensão variável, contando normalmente com a cumplicidade de partes de populações dos territórios onde se desenvolve. Goza normalmente de apoios de outros Estados e/ou Organizações Internacionais, tendo como alvo um Estado ou os seus Poderes Políticos.
Já o Terrorismo tem como objectivo a perturbação política e psicológica, em territórios mais indefinidos, com linhas de comando na clandestinidade ou abrigadas em Estados amigos, de forma disfarçada, utilizando como modo de operação células constituídas por não mais que três a quatro unidades. Geralmente contam com apoios e cumplicidade de outras células, e muito raramente de parte das populações. Utilizam como apoios de propaganda (indirectos e muitas vezes inconscientes) os órgãos de Comunicação Social que, ao divulgarem/comentarem excessivamente e intensamente as suas acções estão objectivamente a potenciar os efeitos pretendidos por esses grupos, ao ampliarem o terror e ao estenderem-no a populações não afectadas directamente pelas suas acções armadas. Como diz Trinquier, outro autor, esta “Guerra Psicológica tem assim um impacto desproporcionado”, proporcionado pelo que acima se descreveu.
Os seus alvos são normalmente, e por ordem de prioridade: locais urbanos com população desarmada (exemplos: recentes ataques de Paris, Bruxelas, Londres) ou ataques a Forças de Segurança ou de Defesa (cujo melhor exemplo foram as acções da ETA em Espanha) ou ainda ataques a centros do Poder Político-Económico (cujo melhor exemplo foi o ataque ao World Trade Center de Nova Iorque).
Todo este contexto pôs a descoberto aquilo que foi muito bem retratado por Meron, quando afirmou: “As Democracias têm dificuldades em usar força” e os terroristas sabem-no bem.
Este fenómeno não é novo e já teve vários grupos, mais ou menos potentes, que o protagonizaram. Recordemos apenas alguns dos movimentos terroristas: Bader-Meindforf (RFA); Brigadas Vermelhas (Itália); IRA (Eire); ETA (P. Basco); Hamas (Palestina) – Sunita; Hezbollah (Palestina); OLP (Palestina) nos anos 1970 até finais de Séc. XX e mais recentemente Al-Qaeda (Internacional – EUA); ISIS (Estado-Califado Islâmico); AFPAK – Afeganistão, ramo da Al-Qaeda; AQAP – Iémen; AQUIM – Argélia, Líbia, Mali, Nigéria; JI – Indonésia, para além dos denominados LONE-WOLVES (lobos solitários) que actuam em países ocidentais.
Como se vê, o terrorismo não é novo. Só que tem vindo a aumentar a sua potência e organização.
Como resultados da sua acção, também aqui verificamos que este fenómeno já vem de longe. Vejamos alguns exemplos de acções consideradas nesta temática do terrorismo, descritas na literatura internacional que se debruça sobre este tema: assassínio do Imperador Austro-húngaro Francisco José, em 1914; assassinato de Dag Hammarskold, secretário-geral da ONU, no Congo, em 1961; assalto ao paquete Santa Maria por Henrique Galvão, ainda em 1961; vários desvios de aviões de companhias ocidentais de 1960 a 1970; assassinato da Equipa israelita nos Jogos Olímpicos de Munique de 1972; os já referidos ataques às Twin Towers de Nova Iorque em 2001; o assassinato de Sérgio Vieira de Mello, ao tempo Alto Representante da ONU no Iraque, em 2003, bem como os atentados de Atocha, em Madrid em 2004; Metro de Londres em 2005; Paris e Dinamarca, em 2015; e os agora verificados em Bruxelas, para além de outros em África e na Ásia.
Quanto aos objectivos dos últimos atentados, podem-se identificar como principais: mudar a Ordem Internacional, impor um Governo da SHARIA e conseguir a transformação da Sociedade Muçulmana. Não esquecendo os objectivos considerados intermédios, tais como: expulsar os Ocidentais dos locais sagrados, alargar a luta a Estados da região do Próximo e Médio Oriente, humilhar as potências ocidentais, bem como chegar a Jerusalém e ocupá-la.
Tudo isto tendo como pano de fundo uma doutrina baseada nos seguintes pontos: controlo territorial – batalha universal – ataque ao Ocidente, com acções de provocação em território Inimigo – uma guerra de longa duração, destinada a provocar baixas e infundir o terror.
Tentando extrair algumas conclusões, direi que no quadro internacional actual o terrorismo se encontra em crescendo de força e de âmbito geográfico; constitui-se como uma ameaça global; e serve-se da Comunicação Social como veículo e “cúmplice” passivo da visibilidade das suas acções que possibilitam o seu recrudescimento.
No combate a este estado de coisas, no que aos Estados compete fazer, só os EUA têm sido competentes.
Na verdade, para se combater este fenómeno, os Estados têm que cooperar mais efectivamente; têm que assegurar as suas capacidades de dissuasão e combate, fortalecendo as respectivas Forças Armadas e Forças de Segurança, a sua capacidade de recolha de informações (“Intelligence”), nomeadamente empenhá-las em acções de prevenção. Têm igualmente de estabelecer um efectivo controlo financeiro, controlo marítimo e terrestre de tráfico de armas, narcotráfico, armas químicas e biológicas e construir as mais que necessárias redes de comunicação e intercepção, o que implicará um maior investimento e especialização neste campo.