Já nem sardinha podemos pescar

O Governo garante que serão pagos subsídios a pescadores e armadores

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Ministério de Assunção Cristas respondeu, em poucas semanas, com apoios aos pescadores mais afectados. Baixo preço do carapau e cavala tira os barcos dos mares portugueses.

Milhares de pessoas estão desesperadas desde que foi suspensa a pesca da sardinha. O Governo garante que serão pagos subsídios a pescadores e armadores. Ainda assim, há quem não tenha esses apoios e dependa do mar.

A inacreditável suspensão da pesca da sardinha, emblema da nossa tradição marítima, acontece porque Portugal voltou a perder a certificação internacional de sustentabilidade concedida pelo Marine Stewardship Council (MSC) devido à quebra de ‘stocks’, explicou a organização sediada em Londres. Ou seja: já atingimos a quota anual máxima.

A certificação de pesca sustentável do MSC é feita a título voluntário pelos operadores e autoridades, que aceitam submeter-se a avaliações de carácter ambiental, efectuadas por auditores independentes, que têm em conta o nível dos ‘stocks’ de peixe, o impacto no ecossistema e a gestão da pescaria.

Segundo aquela organização sem fins lucrativos, esta é a segunda suspensão desde 2010, ano em que iniciou a certificação, devido ao baixo nível das reservas de sardinha ibérica.

De acordo com um comunicado enviado à agência Lusa, a sardinha “não se está a recuperar ao ritmo esperado, apesar do esforço para assegurar uma gestão sustentável do recurso realizado pela pescaria e pelas instituições portuguesas”.

O MSC considera que o plano de gestão acordado no ano passado para tentar recuperar os ‘stocks’ num calendário estipulado não está a ser eficaz, e que os parceiros deverão apresentar até 14 de Novembro um Plano de Acção Correctivo e manter o certificado, ainda que suspenso.

“A pescaria da sardinha é um exemplo de como o programa MSC é um incentivo para que as diferentes partes interessadas, produtores, administração, empresas e cientistas, trabalhem juntamente a favor da sustentabilidade das pescarias. O esforço realizado pela Comissão da Sardinha Portuguesa é um exemplo de como responder a alterações preocupantes no estado de uma unidade populacional pesqueira”, afirmou Laura Rodríguez, responsável do MSC em Portugal e Espanha.

Portugueses aflitos

A Associação Nacional das Organizações de Produtores da Pesca do Cerco (Anopcerco), que representava, em 2010, 128 embarcações responsáveis pela captura de aproximadamente 55 mil toneladas de sardinha, está empenhada em recuperar a certificação, disse o seu presidente, Humberto Jorge, citado no comunicado do MSC.

Mas o cenário embelezado pela entidade internacional contrasta com a realidade vivida pelos pescadores.

A paragem inédita da pesca da sardinha em Portugal “vai ter consequências catastróficas para a comunidade piscatória”, adverte Guilherme Pinto, presidente da Câmara de Matosinhos. O autarca pediu ao Governo uma solução de urgência que evite que a proibição se repita no próximo ano e actue de forma a minimizar os danos das famílias dos pescadores “em situação de desespero social”. O líder independente da autarquia sustentou, em comunicado, que é necessário “que o Governo português actue firmemente junto de Bruxelas para repensar e alterar a quota de captura de sardinha”.

Em Matosinhos, são cerca de 22 as embarcações paradas há várias semanas, desde que a pesca da sardinha foi interditada em Portugal e Espanha, após as frotas dos dois países terem atingido a quota estabelecida pela União Europeia para 2014: 20,52 mil toneladas.

A inesperada proibição, aliada à paragem obrigatória do período de defeso biológico de Fevereiro a Abril, terá ainda pesadas repercussões junto do sector da restauração no concelho, conhecido por “capital da brasa”, “prejudicando perto de 600 restaurantes e os seus seis mil trabalhadores”.

A interdição irá afectar também a indústria conserveira local, dado que a sardinha enlatada representa “95% das exportações”, refere Guilherme Pinto.

No Porto de Pesca de Matosinhos, o que se passa é algo inédito: muitas das 22 traineiras e motoras ali sediadas estão a ser “desarmadas”.

Proibidas de pescar sardinha, e perante os preços baixos do carapau, cavala, tainha e biqueirão, os armadores decidiram não ir mais ao mar até ao fim do ano. “Não dá nem para a despesa, quanto mais para salários. Estamos a retirar todos os apetrechos que possam ficar danificados pela paragem”, explica Francisco Camacinho, que reclama subsídios pela paragem forçada, equivalentes aos da época de defeso (quando os pescadores recebem 600 euros mensais).

Cristas apoia com compensações

As embarcações de pesca de sardinha que estejam paradas durante um mínimo de 30 dias e um máximo de 90 vão receber compensações financeiras correspondentes ao período de imobilização, segundo um diploma publicado no Diário da República.

A escassez de sardinha determinou o encerramento da pescaria criando “constrangimentos à manutenção da actividade da frota do cerco por falta de alternativas”, uma vez que a captura de outras espécies não assegura a viabilidade económica da pesca, adianta a portaria da Secretaria de Estado do Mar.

Para ter acesso ao regime de apoio, a embarcação terá de ser detentora de licença de pesca para artes de cerco, ter operado pelo menos 45 dias em 2014 e apresentar um volume de descargas de sardinha não inferior a 7,5% do pescado descarregado até à data de encerramento da pesca da sardinha.

O período de paragem é contado desde a entrada em vigor da portaria, no início do mês, e inicia-se obrigatoriamente até 15 de Outubro de 2014, inclusive, decorrendo por um período mínimo de 30 dias e máximo de 90 dias seguidos.

Os dias efectivos de paragem serão comprovados por uma declaração da capitania.

Os subsídios, a fundo perdido, serão pagos ao armador da embarcação, sendo-lhe atribuída uma compensação financeira em função da dimensão da embarcação. Para os tripulantes, a compensação salarial tem o valor de 27 euros por dia para os oficiais, 24 euros para mestranças e 20 euros para marinheiros/pescadores.

Se as embarcações voltarem a pescar antes de decorridos 30 dias, terão de devolver a totalidade do dinheiro.