Causas do atraso português

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Não sou adivinho, mas não tenho qualquer dúvida que Portugal se continuará a atrasar em quase todos os domínios relativamente aos restantes países da União Europeia e que os portugueses ficarão mais pobres no futuro próximo. Ando a dizê-lo há vinte anos e até agora ainda não me enganei, como não me enganarei em relação ao futuro, apesar de já cá não estar para o ver. Baseio esta convicção na experiência de uma vida longa e na análise do pensamento dos governantes, dos erros que cometeram e dos erros que se preparam para cometer. Vejamos alguns:

1. Democracia –Pouco a pouco, depois do 25 de Abril, foi-nos roubada a democracia então conquistada e, quanto muito, seremos hoje uma democracia eleitoral, ou seja, um sistema político que compreende um processo eleitoral, mas sem que os portugueses possam escolher os seus representantes, que é a raiz de qualquer verdadeira democracia. Como resultado a qualidade dos deputados e dos governantes degradou-se e nenhum país pode progredir com dirigentes obtusos, ignorantes e, ao mesmo tempo, protegidos pelo poder do Estado. É o que afirmo há já muitos anos, mas que agora já consta de um relatório internacional sobre o estado da democracia em 202 países.

2. Educação – As democracias modernas e avançadas têm níveis de educação e de formação dos seus recursos humanos muito superiores a Portugal e estão a avançar neste ponto mais depressa do que nós, com melhores sistemas educativos e maior exigência individual. Entre nós, valoriza-se a facilidade e não se premeia o mérito, o que tem contribuído para uma menor qualidade relativamente a outros países em todos planos da sociedade portuguesa. Ainda que o governo o tente iludir, os nossos níveis educativos medidos internacionalmente regridem há cinco anos consecutivos, o que coincide com a desvalorização dos exames. O resultado é uma administração pública com excesso de pessoas pouco qualificadas, ausência de tecnologia que melhore a produtividade dos mais de 750 mil funcionários, mas também onde as melhores empresas não conseguem encontrar trabalhadores com as qualificações desejadas.

3. Economia – A sucessão dos erros cometidos ao nível da governação prejudica o desenvolvimento de uma economia competitiva e moderna. Recordo a preferência do Estado pelos bens não transacionáveis e pelo mercado interno e a ideologia dos governantes a oscilar entre as nacionalizações e as privatizações ao longo de mais de quarenta anos e sem que ainda se tenha chegado a uma conclusão. Nem só em relação ao aeroporto de Lisboa temos andado indecisos, temos também deixado crescer uma economia composta de muito pequenas empresas, cujo número excessivo em relação às reais necessidades do mercado resulta em baixa produtividade, servindo apenas para controlar parcialmente o drama social em que o país vive. Como se tudo isto não bastasse, a ignorância do Governo acaba de atribuir a fabulosa soma de seis mil milhões de euros ao turismo, que é uma actividade necessária, mas em doses certas, porque reduz a competitividade global da economia e os salários médios.

4. Indústria – Trata-se do parente pobre do Governo, suponho que por ser uma actividade totalmente privada e pouco atraente para os governantes, essencialmente políticos, advogados e funcionários públicos. Além de ser o sector da economia menos dependente do Estado, ter maior número de contactos internacionais e da generalidade dos empresários serem forçados a lidar com a realidade, logo menos atentos às divagações irreais da actividade política. Estou, naturalmente, a referir-me a verdadeiros empresários e não aos exemplares que passam pelas comissões de inquérito da Assembleia da República e que são o resultado da promiscuidade existente entre a política e os negócios. Entretanto, a indústria é o sector da economia que pode empregar trabalhadores menos qualificados, com melhores salários e reduzir a dependência da economia dual.

5. Investimento – O governo tem cortado no investimento, mesmo o previsto no Orçamento do Estado, fazendo-o através das cativações e nem sequer o investimento estrangeiro tem atingido níveis aceitáveis, por ausência de capacidade de atracção feita de forma profissional. Mesmo sabendo-se que foi o investimento estrangeiro que promoveu o crescimento da economia portuguesa nos períodos da EFTA e do Pedip/AutoEuropa, nada é feito com qualidade neste domínio. As vantagens da localização geográfica de Portugal no centro do Ocidente e entre os dois maiores mercados mundiais da América do Norte e da União Europeia, não têm sido aproveitadas e a logística destinada ao mercado europeu foi criminosamente desvalorizada pelo governo do PS. A ferrovia tem sido usada como meio de propaganda e o pouco que foi feito é em bitola ibérica, um atentado à inteligência económica e às exportações nacionais. A razão da bitola ibérica proteger a CP da concorrência internacional é um argumento demencial de aprendizes de feiticeiro que vivem fora do seu tempo. Além de tornarem Portugal dependente do nosso maior concorrente, a Espanha, através da rede ferroviária espanhola de bitola UIC e dos centros logísticos que a Espanha constrói ao longo da fronteira com Portugal. 

6. Energia e Ambiente – Todos sabemos a importância que estas duas questões têm nas sociedades modernas. Todavia, nem todos sabem os erros já cometidos pelos governos portugueses neste domínio, ou os erros que estão na calha para serem cometidos, seja por ignorância seja por fundamentalismo ideológico, mas sem olhar a custos. Apesar de Portugal não ser um poluidor global de algum relevo, os governos do PS não encontraram ainda formas de reduzir o uso das energias fósseis através dos transportes, do isolamento das casas e da economia circular, a qual permite o reaproveitamento dos resíduos. Ao contrário, têm-se limitado a servir os interesses das empresas dos sectores da energia do vento e do sol, através de contractos monopolistas, com prazos excessivos de validade, a preços exorbitantes e à custa das famílias portuguesas e da competitividade das empresas.

7. Corrupção – Sobre este cenário, difícil de desmentir, paira o fenómeno da corrupção protegida pelo poder político que dela retira as vantagens conhecidas. Governantes, autarcas, empresas oportunistas criadas por políticos e os contractos por ajuste directo, deram lugar na Justiça a milhares de acusações, mais raramente a condenações. Trata-se da mesma Justiça que os governos tentam desesperadamente controlar.

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Como tenho escrito, o Plano de Recuperação e de Resiliência do Governo representa a continuação das aberrações aqui descritas. Trata-se de muito dinheiro consumido para a satisfação de alguns, que não do futuro de Portugal e dos portugueses. Contra isso copiei o exemplo de outros países e publiquei uma proposta mais simples e menos palavrosa, mas destinada a revolucionar a educação e a formação dos portugueses, bem como a criar empregos através da industrialização e das exportações, porque é disso que o País precisa. ■