Depois do desastre dos casos e casinhos dos membros do Governo, autarcas e da miséria moral da hierarquia socialista, visível em todo o país, o Governo encontrou uma oportunidade para desviar as atenções através do palco em construção destinado ao Festival Mundial da Juventude (FMJ), que se prevê tenha a presença do Papa Francisco.
Comecemos por recordar que a iniciativa da aceitação do festival foi portuguesa e que há cerca de três anos, quando Portugal ganhou o privilégio da sua organização, o Presidente da República e o Governo, bem como a hierarquia religiosa, não pouparam na alegria e nos festejos pela vitória. Todos temos assistido nos últimos dias à repetição do momento de histeria presidencial a festejar o acontecimento.
Sendo Portugal o que é e o Governo de António Costa um zero em organização, não surpreende que não tivesse sido aprovado antecipadamente um orçamento com os valores a gastar, ou em fazer um projecto a seguir à decisão. O assunto foi simplesmente esquecido. Também não haveria problema, já havia o consenso da localização do evento ser em Lisboa e o centro em Loures, uma autarquia socialista e outra comunista em tempos de “geringonça”, não se previam problemas com os custos, tudo ficaria em casa. Ao tempo, a grande questão era a enorme oportunidade de ter em Lisboa um milhão de jovens a fazer despesas, a promover o turismo nacional pelas cinco partes do mundo, tudo matéria normal da propaganda de António Costa.
Obviamente ninguém previu que Carlos Moedas ganhasse as eleições para a autarquia de Lisboa e tendo isso acontecido sem nenhum projecto feito, o Governo, com a sua indolência habitual, deixou que fosse Carlos Moedas a tomar conta do assunto e logo se via. Se as obras se atrasassem e isso fosse uma vergonha para o país, tanto melhor, isso só mostrava a falência das duras críticas da oposição ao Governo e a incapacidade da oposição em governar melhor. Não tenho dúvida que se Carlos Moedas tivesse mais experiência em lidar com o PS, com o tempo terá aprendido, teria começado a berrar de imediato sobre quem é que fazia e pagava o quê.
Claro que Carlos Moedas ficou preocupado desde o início e começou cedo a tratar do assunto pelos chamados canais próprios e alguma comunicação social deu nota dessa preocupação e de o Governo andar a arrastar os pés. Como habitualmente, agora com maior razão, daí não vinha mal ao mundo. O mal seria todo para Carlos Moedas, que avançou com o orçamento e o projecto e fixou em cerca de 35 milhões de euros para o que autarquia teria a fazer. Também, como habitualmente, ninguém achou muito ou pouco, o que é surpreendente, porque tinha sido decidido antes de Carlos Moedas chegar à autarquia aproveitar a oportunidade para a requalificação da zona Norte da Expo no concelho de Loures, até aí uma lixeira, o que mereceu então o aplauso geral. Pessoalmente, também fiquei satisfeito de se aproveitar a oportunidade para contruir um passadiço de madeira sobre o rio Trancão, a ligar ao outro passadiço semelhante já existente a Norte que vai até Vila Franca e que já tenho usado para algumas bonitas caminhadas à beira rio.
Satisfação pessoal à parte, o projecto fazia todo o sentido e, salvo quem pagaria o quê, tudo continuou na paz do Senhor, o que se compreende dado o objectivo final de todo o evento. Só agora, quando alguém descobriu que havia um altar, símbolo da religião, a ocupar pelo Papa em Agosto que, imagine-se, custará mais de cinco milhões de euros, a questão, não por acaso, entrou no debate público. De facto, não é um altar, mas a recuperação de todo o espaço a ocupar pelo tal milhão de Jovens, dando-lhe a dignidade necessária como o centro de todo o acontecimento.
Confesso que não sei se o altar fica tecnicamente em Lisboa ou em Loures, o que não terá para o efeito grande importância, mas serve perfeitamente para as oposições da autarquia de Lisboa não pararem mais de reclamar dos custos e de baterem em Carlos Moedas como, imagine-se, um despesista de projectos faraónicos. Nestas questões, essencialmente políticas, a falta de vergonha vem quase sempre ao de cima e não surpreende que o Governo tenha aproveitado o momento para fazer esquecer os casos e casinhos em que anda metido e que dominavam o panorama informativo. Carlos Moedas que se cuide, porque o mais importante ainda está para vir, seja nas importantes, neste caso determinantes, questões de segurança devido ao local, seja nas chegadas e nas partidas no aeroporto de Lisboa, nos transportes públicos, nos hospitais, cujo funcionamento já é duvidoso, seja no movimento nocturno. Oportunidades para bater em Carlos Moedas não vão faltar, é apenas uma questão de imaginação e a máquina socialista não brinca em serviço quando se trata de fazer propaganda.
De facto, a imaginação não tem sido o factor escasso neste domínio e agora a questão é se precisamos de outro altar no parque Eduardo VII e prescindimos da fotografia de Lisboa até ao Tejo com um milhão de pessoas a seus pés. Como o retorno do investimento tem sido desvalorizado, já não sei bem se as Jornadas Mundiais da Juventude são em Lisboa ou em Loures, mas também não vejo aí mal de maior. Carlos Moedas, que já tem feito quase tudo, que resolva, mas sem esquecer que tem à perna o representante escolhido pelo Governo, o conhecido Sá Fernandes, que não lhe tornará a vida nada fácil.
Entretanto, o mais espantoso é que os mesmos que têm deitado para o lixo milhares de milhões de euros no sistema financeiro, na TAP, nos desvarios de Sócrates e na corrupção, fiquem subitamente preocupados com o Festival da Juventude. Como é evidente, a preocupação do Governo é apenas em aproveitar o tema para interromper o longo ciclo de críticas a António Costa, aproveitando para bater em Carlos Moedas, o seu principal concorrente.
Entretanto, há um outro tema que me impressionou bastante mais, o dos carros de combate “Leopardo 2” oferecidos publicamente à Ucrânia. Aparentemente, Portugal comprou e tem em sua posse 37 carros “Leopardo”, ofereceu quatro à Ucrânia, mas apenas dois estão operacionais. O Governo também ofereceu os helicópteros “Kamov”, de origem russa, mas o problema é que esses helicópteros, como escrevi aquando da compra, podem ser considerados como sucata por falta de peças e de manutenção. Dois exemplos de como este Governo estraga tudo em que toca e, infelizmente, o exército não foge à regra. Temos muitos generais prontos para irem às televisões a cada noite, mas um exército disciplinado e competente que mantenha o material em ordem é coisa do passado. O Presidente da República convive com esta vergonha, não comenta e tira fotografias.■