Pobre e mal-agradecido

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Pobre e mal-agradecido foi o papel do Governo português ao recusar reduzir em 15% o consumo de gás, de acordo com a proposta da União Europeia, cujo objectivo é a sobrevivência económica da Europa confrontada com a invasão da Ucrânia pela Rússia e pelas imprevisíveis opções de Putin. Porque as razões técnicas apresentadas por Portugal e pela Espanha não alteram o facto de que, desde há muitos anos, a Alemanha e os outros países do Norte da Europa andam a pagar as nossas contas e agora, confrontados por Putin, não têm a solidariedade europeia que Portugal tanto tem reivindicado.

Pobre e mal-agradecido é ainda um primeiro-ministro que fala grosso por ter o gás que Portugal precisa vindo de África, sem evocar o Governo de Cavaco Silva e fazer o agradecimento devido ao ministro Mira Amaral por terem, ao tempo, com enorme capacidade de previsão, garantido dois fornecimentos alternativos, além da construção da rede de distribuição. Dir-se-á que António Costa obteve dessa forma uma redução dos cortes previstos, mas que poderiam ter sido obtidos da mesma forma sem a bravata tosca dos anúncios públicos. Confesso que se fosse alemão ou holandês não o esqueceria, porque a solidariedade europeia quando nasce é para todos.

Infelizmente, a bravata é a forma de António Costa dirigir o PS e o Governo e de ambos desgovernarem o país. Para isso usam todo o tipo de truques, o mais óbvio de todos é não responder às perguntas dos portugueses, sejam jornalistas, empresários ou simples cidadãos. Perante as muitas adversidades que Portugal enfrenta o Governo não quer responder, frequentemente porque não sabe, escolhendo fazer de conta que as perguntas não existem e opta pelo que sabe fazer melhor, propaganda.

Durante o último Debate da Nação o primeiro-ministro não respondeu a nenhuma das 17 perguntas feitas pelas oposições. Mas fez mais promessas e sem comentar as promessas anteriores, além de combater o novo líder parlamentar do PSD e, como habitualmente, evocou Pedro Passos Coelho, mas sem responder a qualquer pergunta que lhe foi feita, o que aliás é habitual. Vejamos alguns exemplos:

1.

O ministro das Infra-estruturas, Pedro Nuno Santos, há anos que se recusa a responder de que forma pensa fazer chegar os comboios de passageiros e de mercadorias à Europa com a bitola ibérica, o que, segundo ele, não representa qualquer problema. As empresas exportadoras, que precisam de planear o seu futuro e que sabem que as condições do transporte por rodovia irão ser cada vez mais difíceis e caras, que se desenrasquem. Desenrascar é a forma de trabalhar do ministro na ferrovia, como, aliás, na TAP.

2.

O Governo e o secretário de Estado João Galamba afirmam com frequência que as energias renováveis são a substituição das centrais a carvão de Sines e do Pego, fechadas pelo Governo. Todavia não explicam a razão porque aumentámos o consumo de gás, agora a preços absurdos, ou porque estamos a importar diariamente de Espanha e de França cerca de 25% do nosso consumo. Para mais, sabendo nós que a Alemanha está a reabrir 27 das suas antigas centrais a carvão e que a Espanha está a fazer o mesmo, incluído a central da EDP em Cádis. Também não explicam o que pensam fazer quando não há vento e é de noite.

3.

Quer o Governo, quer o Presidente da República, recusam-se a informar os portugueses acerca da razão de Portugal ter uma economia em estagnação há mais de vinte anos e da generalidade dos países da nossa dimensão terem economias a crescer muito mais do que a nossa. Ou a razão das famílias portuguesas terem dos mais baixos rendimentos da União Europeia. Ou ainda o que pretendem fazer para alterar esta situação.

4.

Também ninguém no Governo explica porque, proporcionalmente à dimensão populacional, temos tantos ou mais médicos, enfermeiros, professores, juízes e polícias, mas temos piores sistemas de saúde, pior ensino e um nível de segurança em queda, além de uma Justiça que não funciona.

5.

Também ninguém explica a razão porque ouvimos permanentemente a palavra democracia, mas metade dos portugueses desistiram de votar, os jovens queixam-se das dificuldades de participarem politicamente e muitos emigram. Além da razão de ser reconhecido que a qualidade dos deputados na Assembleia da República se tem deteriorado desde o 25 de Abril, que a corrupção aumenta e a obscuridade das decisões dos governos não cessa de crescer.

6.

António Costa e o Governo prometeram solenemente que haveria a maior transparência na atribuição das verbas do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), todavia, perante os primeiros potenciais escândalos publicados nos jornais e logo nas primeiras verbas, o Governo faz de conta que os problemas não existem. Quanto ao Banco de Fomento, suposto ser parte da prometida transparência, a obscuridade é a regra.

7.

No caso das golas antifogo que ardiam, o Governo devolveu o dinheiro à União Europeia, mas não explicou como foi possível que um secretário de Estado tenha estado envolvido num caso de tamanha sujidade e qual a razão do Governo, mais uma vez, não tomar medidas para que as nomeações governamentais sejam um pouco mais escrutinadas.  Neste, como noutros casos, os governos do PS não fazem qualquer esforço de explicar, ou pedir desculpa, pelos sucessivos escândalos em que se vê envolvido. Trata-se de um Governo que nem o seu bom nome defende.

Infelizmente, nestes casos de ausência de explicações do Governo, os meios de comunicação são parte do problema porque saltam de tema para tema, de escândalo para escândalo, o que facilita a ausência de explicações do poder político, porque para muitos o que não aparece nos telejornais não existe. Ou seja, as explicações aos portugueses, seja sobre escândalos, seja sobre decisões com impacto no futuro de todos nós, teria um efeito pedagógico nos comportamentos de toda a sociedade. Ao não o fazer, ao fugir a responder às dúvidas dos portugueses, o Governo do PS passa objectivamente a ser parte dos maus comportamentos existentes na sociedade. ■