A segurança privada em Portugal e o jornalismo com quatro anos de atraso

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JOÃO FILIPE PEREIRA

Falar em causa própria tem sempre um lado negro e perigoso, mas há assuntos que não devem ser escamoteados de tão graves que são. O semanário “Expresso” do passado fim-de-semana anunciou que a “Prosegur denuncia ilegalidades no sector”. O “jornalismo de referência” vem com quatro anos de atraso. Mas vamos por partes.

É atribuída a George Orwell a seguinte frase: “Jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer que se publique. Todo o resto é publicidade”. E parece publicidade o que o “Expresso” andou a fazer sobre o tema. Não obstante de atribuir a notícia a uma empresa líder de mercado com interesse directo na publicação da mesma, o jornal ainda conseguiu ilustrar a matéria com uma bela foto de propaganda há empresa.

Confesso que não tive oportunidade de ler a matéria toda e tenho de resumir o meu conhecimento ao que foi publicado ‘online’. Mas sabendo que o “Expresso” não tende a publicar “expressamente” as chamadas publi-reportagens – ou seja, reportagens publicitárias pagas em formato jornalístico – deduzo que esta entrevista a elementos da empresa de segurança privada tenha sido apresentada como uma bela peça jornalística.

Não o é, certamente.

Há precisamente quatro anos, O DIABO escrevia “Segurança Privada sem regras”, era aquilo a que se chamou “o lado negro da segurança privada no País”. Um artigo assinado por mim – aqui está a causa própria – e que denunciava não só os problemas e irregularidades de pagamentos de que a Prosegur se queixa, mas também muitos outros crimes cometidos sob a falsa capa de segurança privada.

Do tráfico de droga ao tráfico de armas passando pelo “incumprimento no que concerne à carga horária dos formandos, protocolos de formação com entidades não licenciadas, formação a profissionais do sector fora do âmbito da segurança privada e outros grupos extra profissão”. Denunciava ainda este jornal o atraso de mais de um ano na divulgação do Relatório Anual de Segurança Privada 2011. Nenhum “jornal de referência” tocou no assunto. A agência “Lusa” mais tarde escreveu um ‘take’ sobre o relatório em que explanou sobre os detectives privados, deixando de lado o aprofundar sobre a segurança privada propriamente dita.

Pouco foi feito nestes quatro anos. O que foi escrito mantém-se actual.

O que o DIABO denunciou há quatro anos era de uma gravidade extrema, mas passado tanto tempo parece que o jornalismo de “referência” continua a preferir as entrevistas com cheiro a encomenda.

Portugal tem assistido ao desmantelamento de redacções. Aconteceu no “Público”, no “DN”, no “JN” e agora no “i” e no “Sol”. As consequências estão aí para quem as quiser ver.