Os canalhas da terra

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[avatar user=”cunha14″ size=”thumbnail” align=”left” /]A questão da expulsão dos magistrados judiciais portugueses de Timor Leste é uma questão grave, evidentemente, mas também é apenas um sintoma da natureza humana.

Schopenhauer, o pessimista, afirmava que o ser humano é intrinsecamente mau, velhaco, egoísta e que essas características se revelavam, com raríssimas excepções, mais cedo ou mais tarde.

Uma das condições para a revelação destas qualidades é uma situação de perigo ou de grande crise. Homens elevados, homens de grande coragem e de grande fibra moral e ética superam essas crises com elevada dignidade. Por exemplo, Xanana Gusmão, após captura pelos indonésios, renegou a sua causa, traiu os seus companheiros e apareceu publicamente a defender a Indonésia.

Estava preso, sob ameaça, dirão. Sim, é verdade, por isso mesmo as suas acções foram, de certo modo, desculpadas, quase todos fariam assim para salvar o próprio coiro à custa da infâmia e traição e esse factor induz um elemento de piedade que leva à desculpabilização. Xanana foi lavado, a sua imagem foi reciclada e surgiu, posteriormente a um tratamento muito benévolo pelas autoridades indonésias, como o herói muito necessitado para o povo de Timor.

Mas os heróis são humanos e sabe-se, por exemplo, do desregramento com o álcool de Xanana Gusmão, também desculpado pelos anos de privação e sofrimento por que passou. No entanto, já a palhaçada que aconteceu com a entrada da Guiné Equatorial na CPLP, cujo ditador entrou, qual facto consumado, de braço dado com Xanana na sala da cimeira, humilhando aqueles que defendem os direitos humanos e os portugueses, não falo dos políticos, é indesculpável e cheira a corrupção e jogos de poder nos quais Xanana alinhou de bom grado e de alma e coração, se é que os tem.

Que moral e fígados tem este homem para dar o braço a Obiang, um facínora, um ditador nefando que manda assassinar opositores e oprime raivosamente o seu povo? Afinal não foi este Xanana um combatente pela libertação da sua Nação?

Ou é apenas o traidor por dinheiro e poder que serviu os indonésios? Quem trai uma vez trai sempre e se, primeiro, Xanana traiu por ameaças e coacção, agora trai por poder e dinheiro, o passo psicológico é pequeno.

Não espanta nada esta expulsão dos juízes portugueses, afinal o único travão independente contra a corrupção e a subversão do Estado de Direito. É apenas mais um passo de um canalha a caminho do poder pessoal e fortuna, é mais um passo a caminho do domínio do Estado timorense pelas famílias influentes, verdadeiras tribos orientais com apelidos e origens portuguesas, que têm como modelo aquele a quem Xanana deu o braço, e parece ser o seu modelo, Teodoro Obiang.

Resta a ingenuidade e generosidade do povo português, que veio para a rua lutar por Timor. Não as lamentemos; é certo que sem a ameaça das balas que matavam os timorenses, Timor, mesmo sob as garras de um ditador de meia tigela, estará hoje um pouco melhor, pelo menos o país é governado por canalhas da terra.