“Para Agostinho da Silva – ainda nas palavras de Adolfo Casais Monteiro –, é a Mensagem a chave de Pessoa inteiro, nela está o sentido da sua obra. Eis o que, melhor do que em qualquer outra passagem, se pode entender através deste fragmento das suas considerações finais, em que diz, depois de se referir à ‘grandeza do Reino de Deus’: ‘É por esse Império, que nem ele nem os seus companheiros têm a coragem ou a força ou a hora de construir (…), que Fernando Pessoa pensa, escreve, concebe gemidos, sofre recolhido e ignorado morre’.”. Mérito tanto maior porquanto, ainda na perspectiva de Adolfo Casais Monteiro, a visão agostiniana da Mensagem excede em muito as mais habituais visões da mesma: “A superioridade do ponto de vista de Agostinho da Silva sobre tantas improcedentes exaltações da Mensagem como poema ‘patriótico’, está em ter sabido situá-lo naquele mesmo plano de visão para além da pátria material e estreitamente concebida (…)”.
Concordemos ou não com esta concepção de “patriótico” de Adolfo Casais Monteiro, a verdade é que, de facto, na visão de Agostinho da Silva, Portugal tanto mais se afirmaria, no futuro, quanto mais se afirmasse na ligação a todos os outros países de língua portuguesa. A visão agostiniana da portugalidade, com efeito, tornou-se crescentemente descentrada de Portugal enquanto Nação. O futuro de Portugal passava, na sua visão, pela crescente ligação a todos os outros países de língua portuguesa, em particular – nesses tempos – ao Brasil. Eis, de resto, a tese já presente na sua Reflexão à Margem da Literatura Portuguesa – daí, a título de exemplo, esta sua exortação: “…que tome o Brasil inteiramente sobre si, como parte de seu destino histórico, a tarefa de, guardando o que Portugal teve de melhor e não pôde plenamente realizar e juntando-lhe todos os outros elementos universais que entraram em sua grande síntese, oferecer ao mundo um modelo de vida em que se entrelaçam numa perfeita harmonia os fundamentais impulsos humanos de produzir beleza, de amar os homens e de louvar a Deus (…)”.
Eis, igualmente, a tese que nos reiterará em outros textos seus, como iremos, de passagem, referir. O primeiro desses textos intitula-se “Considerando o Quinto Império” e foi publicado no periódico Tempo Presente, em 1960. Nele, faz, uma vez mais, Agostinho da Silva, a retrospectiva da história de Portugal, desde logo, dos dois nossos alegados maiores erros históricos: o de termos “abandonado” a Galiza e o de termos querido “conservar” Ceuta, sacrificando, para tal, o Infante D. Fernando. Eis, reitera-nos, o que nos fez desviar dos mares, dos “mares sobre que flutua o Espírito”, paras as terras, do ser para o ter… Neste texto, aparece o Brasil enquanto possibilidade de correcção desse desvio, de “começar de novo, de começar o recomeço: nunca mais abandonando noivas [como a Galiza]; nunca mais querendo terras em lugar de mares, nunca mais excluindo religiões”. O segundo desses textos que aqui brevemente referimos intitula-se “Presença de Portugal” e foi publicado, à parte, enquanto opúsculo, em 1962. ■
Agenda MIL – 23 de Fevereiro, 21h: Lançamento do Livro MIL de Luís Vieira Baptista: “1971 – Crónica da fuga para a Suécia” (para mais informações: www.movimentolusofono.org)