Bragança e o fantasmático racismo português

Em memória de Nuno Rebocho (1945-2020), ilustre jornalista e cidadão luso-cabo-verdiano, que faleceu com o sonho de instalar uma estátua do Padre António Vieira na Cidade Velha…

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Quando se soube da trágica morte do jovem cabo-verdiano Luís Giovani dos Santos Rodrigues, em Bragança, no último dia do ano de 2019, logo adivinhámos que as mil e uma vozes sempre prontas a acusar Portugal de ser um país especialmente racista iriam usar este caso como uma arma de arremesso em favor da sua causa, conforme de imediato aconteceu. Não era difícil de adivinhar: essas vozes não primam propriamente pela sofisticação – são, ao contrário, na sua tacanhez, demasiado previsíveis.

Pela nossa parte, ficámos calados, à espera de que as autoridades policiais fizessem o seu trabalho. Obviamente, poderia ter sido um caso de “crime de ódio racial”. Mas, mesmo que o tivesse sido, isso não provaria nada quanto a Portugal, ou sequer quanto a Bragança. No seu Instituto Politécnico, segundo dados oficiais, estudam cerca de nove mil alunos – desses nove mil, cerca de um terço são estudantes não portugueses, e desses três mil, mais de metade são estudantes oriundos de países lusófonos.

É preciso ser mesmo muito tacanho para, num universo destes, pôr sequer a hipótese da existência de uma cultura racista em Bragança. Se assim fosse, casos de agressão a estudantes “negros” ocorreriam em todas as semanas, ou mesmo em todos os dias. Escusado será dizer que isso não acontece de todo – como nós próprios já pudemos verificar, em idas regulares ao seu Instituto Politécnico (a última das quais há pouco mais de ano, para um Colóquio sobre Ferreira Deusdado, um ilustre bragantino), os estudantes do Instituto Politécnico de Bragança convivem de modo normal, como acontece em geral no nosso país, independentemente do tom de pele de cada um. 

Na cidade de Bragança também não se sente, de todo, qualquer espécie de preconceito racial. Como seria de esperar, os bragantinos prezam o seu Instituto Politécnico e sabem que essa dimensão internacional – e, em particular, essa dimensão internacional lusófona – é uma grande mais-valia não só para o Instituto Politécnico como para a própria cidade. Provavelmente, existem em Bragança algumas pessoas a pensar o contrário. Mas essas serão apenas excepções que confirmam a regra – como não nos cansamos de reafirmar, Portugal é, de longe, no espaço europeu, o país menos racista.

Dito isto, sabemos que as mil e uma vozes sempre prontas a acusar Portugal de ser um país especialmente racista ficarão à espera do próximo caso. Este, pela voz do próprio Director da Polícia Judiciária, teve apenas motivações “fúteis”, apesar do trágico desfecho. Para indisfarçável desgosto dessas mil e uma vozes, não houve de facto em Bragança um “crime de ódio racial”. Escusam pois de continuar a proclamar Bragança como a nova capital do “racismo português”. Existindo apenas de forma residual – sobretudo, insistimos, se compararmos Portugal com todos os outros países europeus, sem qualquer excepção –, esse alegado “racismo” é substancialmente fantasmático. Serve, tão-só, para alimentar alguns activismos ideologicamente enviesados. ■

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