Fernão de Magalhães em Brasília

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Quinhentos anos após Fernão de Magalhães ter iniciado a primeira viagem de circum-navegação ao nosso planeta, faz todo o sentido que a cidade de Brasília, através da sua Universidade, se associe às comemorações desta ímpar efeméride. 

Com efeito, através desta sua viagem, Fernão de Magalhães pôs, pela primeira vez, o mundo em diálogo consigo próprio, abrindo definitivamente as portas do nosso futuro comum, da chamada “globalização”.

Ora, se há cidade que, no mundo lusófono, simboliza essa aspiração de futuro, essa cidade é, mais do que qualquer outra, a cidade de Brasília. Criada “a partir do nada”, ela construiu-se para ser a nova Capital desse imenso país-continente chamado Brasil. A sua Universidade representa igualmente, mais do que qualquer outra instituição, essa promessa de diálogo – no caso, de diálogo entre todos os saberes. 

Para tal, alguns portugueses, na esteira de Fernão de Magalhães, deram também o seu contributo. Falamos aqui, em particular, de Agostinho da Silva e de Eudoro de Sousa, dois nomes fundamentais na consolidação da Universidade de Brasília e que jamais deverão ser esquecidos, agora que a UnB comemora os seus sessenta anos de existência.

Para Agostinho da Silva, a Universidade Brasília, a própria cidade de Brasília, deveria ter, de resto, um papel “extra” – não só no plano interno como também a nível internacional, desde logo, no mundo lusófono, ao assumir-se como parte desse “tripé” que expressamente prefigurou, ao falar de uma “comunidade luso-afro-brasileira, com o centro de coordenação em África, de maneira que não fosse uma renovação do imperialismo português, nem um começo do imperialismo brasileiro”. 

“O foco central – como, logo de seguida, acrescentou – poderia ser em Angola, no planalto, deixando Luanda à borda do mar e subir, tal como se fizera no Brasil em que se deixou a terra baixa e se foi estabelecer a nova capital num planalto com mil metros de altitude. Fizessem a mesma coisa em Angola, e essa nova cidade entraria em correspondência com Brasília e com Lisboa para se começar a formar uma comunidade luso-afro-brasileira” (in “Vida Conversável”, Assírio & Alvim, 1994, pp. 156-157).

No ano em que, por feliz coincidência, se reeditou essa obra – uma das mais emblemáticas – de Agostinho da Silva, agora na sua versão completa (Zéfiro, Colecção NOVA ÁGUIA, 2020), exortamos pois os responsáveis pela Universidade de Brasília a associarem-se a estas comemorações, em prol, também aqui na esteira de Agostinho da Silva, de uma outra globalização: mais respeitadora das culturas e línguas locais, mais respeitadora dos direitos sociais e económicos de todas as populações, mais respeitadora da natureza e do meio ambiente. Quinhentos anos após Fernão de Magalhães ter iniciado a sua viagem, essa seria, decerto, a melhor forma de a comemorar. ■

Agenda MIL: Em virtude do combate à propagação do COVID-19, a próxima sessão do Ciclo de “Tertúlias de Cultura Portuguesa”, agendada para dia 28 de Março, foi cancelada. O Ciclo retomar-se-á, assim, a 18 de Abril, no Palacete Viscondes de Balsemão (Porto), com a Apresentação da Revista NOVA ÁGUIA nº 25.