Ainda que, naturalmente, com diversas nuances, este tem-se afirmado progressivamente nas últimas décadas à luz de algumas premissas – no essencial, três: mal ou bem, a descolonização ocorreu e é irreversível; não obstante, os países independentes que partilham esse mesma língua, cultura e história (entretanto agregados na CPLP: Comunidades dos Países de Língua Portuguesa) podem e devem cooperar (muito mais), em benefício próprio; essa cooperação não é exclusivista, ou seja, não se faz necessariamente por exclusão de outras: no caso de Portugal, conforme o já aqui referido, em relação à União Europeia; no caso do Brasil, em relação ao MERCOSUL; no caso de Timor-Leste, em relação à ASEAN; no caso dos PALOP (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa), em relação a outras plataformas regionais.
Dito isto, há uma observação de JPZ que me parece muito certeira e lúcida. Há, de facto, “novas gerações – da Esquerda e da Direita” que não se reconhecem, de todo, neste horizonte. À Esquerda, porque consideram que todo o processo de expansão marítima foi um erro absoluto – pelo que, ainda que não defendam (em público) a destruição do Padrão dos Descobrimentos, renegam e estigmatizam a Lusofonia, vista como o resultado de uma história em que não se reconhecem, como o fruto (ainda que longínquo) de um “pecado original”. À Direita, porque, como muito bem escreve JPZ, «sentem que o imaginário da lusofonia impede Portugal – num contexto de transformação multicultural e multiétnica, tal como noutros países da Europa Ocidental – de defender a sua identidade primária, continental, e europeia». Aqui, realmente, há uma grande coincidência entre os extremos (esquerdo e direito): ainda que por razões muito diversas, ambos se afirmam contra a Lusofonia.
Reconhecendo que esses extremos, tanto à Esquerda como à Direita, estão em progressão, não somos, porém, tão pessimistas quanto JPZ. Desde logo porque se esses extremos estão particularmente em progressão nas novas gerações, estão ainda muito longe de representar, por inteiro, as novas gerações. Há ainda, a nosso ver, mesmo entre as novas gerações, uma maioria substancial para quem a relação mais próxima com as outras “gentes lusófonas” não é traumática ou problemática. Essa maioria substancial continua a preocupar-se genuinamente (e não por uma qualquer consciência de culpa) com as “gentes lusófonas” (apenas um exemplo: quem, no plano internacional, continua a preocupar-se genuinamente com a situação presente na Guiné-Bissau, como, outrora, aconteceu com Timor-Leste?). Mais: essa maioria substancial sabe perfeitamente que a Lusofonia a consolidar-se neste novo século terá múltiplas raízes – decerto, uma raiz também portuguesa, mas a par de outras. Não quer, pois, impor externamente, já fora de prazo, uma qualquer “portugalidade”. Neste novo século, o paradigma só pode ser outro: realmente pós-colonial. ■