Um outro vulto evocante da tradição joaquimita que podemos – e devemos – aqui referir é, enfim, o de Natália Correia, até pela forma singular como ela actualiza essa tradição, salientado a sua alegada dimensão “feminina” – a seu ver, com efeito “o Espírito Santo, esse sopro que tudo anima, anima os humanos, é feminino, a Ruha em hebreu, a consagração da sacralidade do feminino que a androcracia judaico-cristã escamoteou”.
Na sua visão, efectivamente, seria pela sua dimensão feminina que a Humanidade poderia redimir-se – ainda nas suas palavras: “a mulher deve seguir as suas tendências culturais, que estão intimamente ligadas ao paradigma da Grande Mãe, que é a grande reserva, a eterna reserva da Natureza, precisamente para se impor ao mundo ou pelo menos para os introduzir no ritmo das sociedades como uma saída indispensável para os graves problemas que temos e que foram criados pelas racionalidades masculinas. É no paradigma da Grande Mãe que vejo a fonte cultural da mulher; por isso lhe chamo matrismo e não feminismo”.
E eis aqui uma subtil, uma abissal diferença que leva Natália Correia, apesar de valorizar maximamente a dimensão feminina da Humanidade, do próprio Ser, a não se declarar feminista, pelo menos na acepção mais comum dos tempos de hoje – ainda nas suas palavras: «Eu não sou feminista no sentido clássico de que a mulher é que vale e o homem não, nem pensar! Mas volto-lhe a falar da exaustão do poder. O homem meteu-se num labirinto. Nós descansamos muitos séculos. A mulher tem um viço, tem reservas em si, tem energias armazenadas que o homem foi perdendo”.
De resto, Natália Correia chega mesmo a demarcar-se expressamente desse feminismo mais comum nos tempos de hoje: “o que me aflige nestas feministas é o seu racismo estreito de curto alcance que disputa posições em vez de arrasar as estruturas que impedem a transformação do mundo num lugar habitável por homens e mulheres. Procedem como se quisessem o mundo para elas tal como os homens quiseram o mundo para eles. Imitam o erro no que demonstram a tristíssima falta de imaginação de errar por conta própria”. Ou seja, em suma: para Natália Correia a Idade do Espírito Santo seria a época da plenificação do humano, na sua complementaridade masculina e feminina, na superação da “cisão extrema” relativamente à Natureza e ao próprio Absoluto. ■
Agenda MIL – 15 de Maio, 21h30 (via zoom): 8ª sessão do GT “Lusofonia e Relações Internacionais”: uma conversa em torno de Goa e da Índia; 17 de Maio, 15h30, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto: apresentação do Livro MIL “A Reflexão Ética Luso-Brasileira”, de António Braz Teixeira (para mais informações: www.movimentolusofono.org).