Emigrantes usam cada vez mais a net para acederem a médicos portugueses

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Acesso fácil à internet através de computador ou telemóvel ajuda na hora de contactar um médico, sobretudo quando o problema não é urgente e a barreira linguística é um problema. Empresas que trabalham a área da saúde ‘online’ não param de crescer.

Os dados são de um ‘site’ de marcação de consultas e contacto com médicos. Mais de seis por cento das 116 mil interacções registadas durante o Verão foram provenientes de Angola, Brasil, Reino Unido e Suíça, “áreas caracterizadas por grandes comunidades de emigrantes portugueses”, explica a empresa doctorhome.pt.

A plataforma portuguesa foi lançada em Maio e permite pôr em contacto médicos e pacientes através da internet. O doctorhome.pt permite ainda realizar videochamadas, agendar consultas presenciais e enviar questões aos profissionais de Saúde.

“A plataforma tem previsto, a médio prazo, expandir-se para outros países”, explica Miguel Castro, director de produto do doctorhome. “Queremos que o doctorhome seja uma boa oportunidade para poder partilhar o conhecimento clínico dos médicos portugueses com as pessoas de outros países, sobretudo no Brasil e nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP)”.

Este é um mercado que está em crescimento. Lá por fora, o que se passa é que o acesso á Saúde está dependente de seguros ou é mais limitado do que em Portugal. A este condicionalismo juntam-se os preços: é que, mesmo sendo cara para os portugueses, a Saúde no nosso País é mais acessível aos nossos emigrantes. Para já não falar da boa reputação da Medicina portuguesa e da questão da barreira linguística – os emigrantes portugueses nem sempre dominam o idioma do país onde vivem de forma a conseguir explicar os sintomas a um especialista estrangeiro.

No caso do doctorhome, acedendo à página da internet os portugueses têm acesso a uma extensa lista de médicos – já vai em mais de 500 – que se prontificam a responder a dúvidas ou a agendar consultas. Cada médico estabelece um preço – alguns fazem-no gratuitamente – para cada uma das ferramentas disponíveis: resposta a questões, vídeo-chamada, consulta ou visita domiciliária. Há profissionais de 40 especialidades médicas e estão espalhados por todo o País.

A saúde ‘online’ está a quebrar barreiras e preconceitos. A comunidade médica está a abrir aos poucos as portas ao acompanhamento através da internet, ressalvando sempre que as consultas para diagnóstico têm de ser realizadas presencialmente.

Os ‘sites’ que agora têm surgido possibilitam na sua maioria a interacção entre o utente e o médico, uma opção válida para esclarecimento de dúvidas referentes a sintomas e sinais dos problemas de saúde já avaliados em consulta. São também boas opções para sinalizar um novo problema que exija avaliação.

Em Portugal existe também o consultaclick – um site de marcação de consultas de saúde – ou o mylinkedcare.com, que permite fazer um registo da actividade física, peso e pressão arterial do utilizador.

Saúde até no telemóvel

Com a internet, a Saúde quase que deixa de ter fronteiras. Daí que se entenda o número substancial de emigrantes portugueses que procuram ajuda através de plataformas portuguesas.

E mais fácil se torna o acesso quando há aplicações nos telemóveis que ajudam a manter a prevenção. É o caso do “Enforcing Kids” para crianças com autismo, o “Exsmokers iCoach” para deixar de fumar, “MyHealthPass” para a Saúde em Viagem, “Pregnancy Calculator” para acompanhar a gravidez até ao parto, o “mCarat” para doenças respiratórias, o “DMEasy Track”, o “Glicemia Quicklog.me” e o “GliControl” para a diabetes, etc…

Os exemplos são muitos e em franco crescimento. A estes juntam-se ‘sites’ oficiais como o Portal do Utente, o Portal da Saúde, o Saúde24 ou o Infomed.

Tudo à distância de um clique no computador ou no telemóvel. Ainda assim, os portugueses são dos menos informados no que toca à sua saúde. O primeiro estudo sobre literacia em saúde realizado em Portugal revelou que “a maioria dos portugueses” inquiridos tem um “nível de literacia em saúde problemático ou inadequado”.

Falta de conhecimento preocupa

O estudo, que contou com um inquérito feito a 1.004 pessoas, foi desenvolvido no âmbito do projecto “Saúde que Conta” da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP), com o apoio de um laboratório, e teve como base o Questionário Europeu de Literacia em Saúde.

De acordo com os resultados, e no que respeita à prevenção da doença, cerca de 55% da população inquirida revelou não ter um nível excelente ou sequer suficiente de literacia em saúde.

Em matéria de promoção da saúde, 60,2% dos inquiridos apresenta um nível de literacia problemático ou inadequado, comparativamente com os outros países em análise: Espanha, Irlanda, Holanda, Alemanha, Áustria, Grécia, Polónia e Bulgária.

“A Bulgária apresenta, nesta dimensão, um nível de promoção da saúde problemático ou inadequado de 70,3%, sendo a Irlanda e a Holanda os países com os melhores resultados a este nível, 40,6% e 36,3%, respectivamente”, concluiu o estudo.

A investigação apurou que, em Portugal, “à medida que a idade aumenta, o nível de literacia em saúde diminui”.

“Observa-se tendencialmente o inverso no que diz respeito ao nível de escolaridade: quanto maior o nível de escolaridade, os níveis de literacia em saúde tendem a ser superiores”.

Os resultados do questionário, aplicado em Portugal continental e ilhas, revelam, contudo, que “não são somente os grupos vulneráveis que apresentam níveis inadequados de literacia em saúde, mas também a população em geral”.

Ana Escoval, da ENSP e coordenadora do estudo, considera que os resultados são “uma ferramenta que permite direccionar e alinhar melhor as estratégias e intervenções de literacia em saúde a serem desenvolvidas, não só ao nível nacional, mas também ao nível europeu”.

Nos últimos anos, sublinhou, “são cada vez mais os estudos que revelam que um nível inadequado de literacia em saúde tem implicações significativas nos resultados em saúde, na utilização dos serviços de saúde e, consequentemente, nos gastos em saúde”.

De acordo com a investigação, algumas das consequências dos baixos níveis de literacia em saúde passam por “uma maior taxa de morbilidade em doenças como diabetes, hipertensão, obesidade e infecção por VIH”.

Mulheres interessam-se mais

Por serem mães, donas de casa, cuidadoras, as mulheres são as que mais informação sobre saúde procuram na internet.

Segundo os dados agora revelados pelo doctorhome, as mulheres representam cerca de 60% do total de inscritos no ‘site’. Já as consultas mais pesquisadas pelos internautas entre Maio e Setembro foram as de Medicina Geral e Familiar, seguindo-se as áreas de Ginecologia/Obstetrícia, Urologia, Estomatologia e Medicina Dentária.

A principal fonte de tráfego do site é proveniente dos grandes centros urbanos do país (Lisboa e Porto), mas o doctorhome destaca ainda a procura elevada oriunda de regiões como Setúbal, Santarém, ilha da Madeira e Viana do Castelo.

A procura de ajuda na internet pode estar em muito relacionado com os custos no serviço público e com a dificuldade em obter uma consulta.

Cerca de metade das pessoas que recorrem às urgências hospitalares fazem-no por não conseguir atendimento no centro de saúde ou porque o episódio de doença ocorre fora do horário dos cuidados primários, segundo um inquérito da associação Deco.

Com base em 3.556 respostas a inquéritos lançados em Outubro de 2013, a associação de defesa do consumidor conclui que aumentou o número de doentes que vai ao hospital por não conseguir ser atendido nos centros de saúde.

Do total de inquiridos, há ainda 12% que alegam não ter recorrido aos serviços de urgência por falta de dinheiro para pagar a taxa moderadora.

As conclusões do inquérito, divulgadas na revista Teste Saúde, mostram que há cinco anos, num estudo semelhante, apenas um quarto dos inquiridos apresentou motivos idênticos para recorrer ao hospital.

“Os resultados mostram um claro aumento do recurso às urgências hospitalares por falta de resposta dos cuidados de saúde primários”, refere o artigo.