Portugal a caminho de ser dos países mais pobres da Europa

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De tanga? No pântano? Estes ‘chavões’ quase pertencem a tempos de bonança, quando comparados com a triste actualidade. Embora os políticos continuem a brincar com estatísticas há mais de 40 anos, a dura e crua realidade é que, quando se considera o custo de vida e a pesadíssima carga fiscal, os portugueses já vivem essencialmente com o mesmo dinheiro que os cidadãos do antigo bloco de Leste. Em alguns casos até com menos…

Portugal entrou na CEE e, durante algum tempo, brincou aos “países ricos”. Esse tempo acabou com a chegada do século XXI. Dezasseis anos de crise e estagnação significam que, descontada alguma inflação, os portugueses não viram grande melhoria nos seus rendimentos em quase duas décadas perdidas.

Mas enquanto Portugal estava parado e distraído a discutir baixa política e a construir auto-estradas desnecessárias, o resto da Europa continuou em frente.

Basta comparar. Em 1988, a Irlanda era designada como “o pobre dos ricos”. Nessa altura, até Portugal, já a beneficiar de dois anos de subsídios da CEE, superava consideravelmente o pequeno país anglófono. Hoje, os irlandeses são três vezes mais ricos do que os portugueses, e Portugal ostenta o lamentável título de país mais pobre da Europa ocidental. Da fronteira entre a Alemanha e a Polónia para Ocidente não existe nenhum país onde o ordenado, seja qual for a lógica estatística aplicada, esteja abaixo dos 1.500 euros por mês… excepto Portugal, a “aldeia gaulesa” da pobreza.

No entanto, quando se olha para o mapa económico mundial, Portugal não destoaria caso estivesse integrado no Leste europeu. Curiosamente, durante o tempo em andámos a brincar aos países ricos, acumulando de caminho uma brutal dívida, os países do Leste libertaram-se do domínio comunista e tiveram de transformar uma economia socialista planeada numa economia capitalista moderna. Ninguém diria, portanto, que Portugal teve décadas de avanço. Nos últimos anos, a situação ainda piorou mais: graças à bancarrota de 2011, durante o extravagante consulado de José Sócrates, os portugueses apenas viram os ordenados médios aumentar 13 euros entre 2011 e 2015, segundo dados do INE.

Portugaslávia

Em média, cada português aufere oficialmente algo como 1.000 euros mensais, valor que, no entanto, inclui os funcionários públicos, que na sua maioria não podem ser dispensados e têm os seus rendimentos tabelados, e também os trabalhadores independentes, que auferem muitas vezes ordenados mais elevados, embora paguem impostos exorbitantemente altos em compensação.

Os dados em relação aos 3,7 milhões trabalhadores por conta de outrem contam outra história, e em média cada português nesta situação laboral leva para casa 829 euros todos os meses. Mas se o estimado leitor achar que este valor lhe parece um pouco elevado, tendo em conta a realidade que vê todos os dias na sociedade, é que os seus olhos não o enganam.

O ordenado médio em Portugal, número no qual a maioria dos políticos e Governos se refugiam, é um valor enganador, especialmente tendo em conta que Portugal é, segundo um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos, “um dos países com maior assimetria na distribuição dos rendimentos salariais no seio da UE”. O ordenado mediano português, ou seja, o ordenado mais aproximado daquilo que a maioria do povo português leva para casa todos os meses, é aproximadamente 700 euros, segundo números daquela Fundação (relativos a 2009) e do Eurostat (relativos a 2015).

Apenas 5% dos portugueses têm um rendimento acima dos 2.500 euros mensais, e quem aufere mais de 4.600 euros por mês encontra-se numa pequena “elite” (que no resto do mundo ocidental seria considerada classe média) que representa apenas 1% da população trabalhadora. No sentido inverso, um quarto dos trabalhadores portugueses recebe menos de 600 euros.

A situação piora quando se compara os ordenados à luz do poder de compra (ou seja, tendo em conta aquilo que o dinheiro pode comprar). Como já foi abordado nas páginas deste jornal, Portugal não destoa muito dos países ricos num aspecto: os preços dos bens e serviços. Um euro na Polónia não compra o mesmo que um euro em Portugal.

Para Portugal não aparecer mal na fotografia, o País é geralmente comparado com os restantes usando o ordenado médio – indicador que, por exemplo, ainda supera a Polónia em 300 euros, e a República Checa em 200 euros. Contudo, uma análise mais aproximada feita pela OCDE desmonta essa “realidade artificial”: quando adapta os números ao poder de compra, a organização conclui que habitantes do Leste como os checos, os polacos ou os eslovacos levam para casa todos os meses essencialmente o mesmo dinheiro que um português, enquanto outros considerados “mais pobres”, como os húngaros e os estónios, não se encontram muito longe.

Descontados os impostos, os trabalhadores destes povos levam para casa o equivalente a cerca de 700 euros por mês (a Polónia e a República Checa ainda não adoptaram o Euro), o mesmo que um português. Alguns superaram mesmo Portugal. Por exemplo, um esloveno, cidadão de um país que em 1991 ainda se estava a separar da Jugoslávia (quando em Portugal se viviam os loucos anos do betão), pode esperar auferir hoje 1.000 euros mensais, tendo conseguido colocar um pé no “clube dos países ricos”, do qual o velho Portugal cada vez se afasta mais.

Ficar para trás

No ano passado, a economia do nosso País cresceu 1,6 por cento, um valor baixo mas uma franca melhoria em relação aos anos da recessão causada pela bancarrota de 2011. Mesmo a esta velocidade, Portugal crescia mais devagar do que quase todos os países da União Europeia, especialmente os de Leste, cujas previsões apontam para crescimentos acima de 3%. Enquanto que Portugal volta a perder-se na estagnação, enquanto os outros, pobres e ricos, caminham em frente.

A Leste, os ordenados continuam a aumentar velozmente: segundo dados da Bloomberg, os salários aumentaram 5% na Polónia desde o ano passado, 8% na Hungria e na República Checa. Ao mesmo tempo, a inflação nestes países é basicamente nula, o que significa que os ganhos em termos monetários se traduzem verdadeiramente em maior poder de compra. Em termos de rendimento por hora, vários destes países já superaram mesmo Portugal e, à medida que as suas economias e mercados laborais se consolidam, deverão ultrapassar-nos por completo em 2017, quer com paridade de poder de compra, quer sem.

Se esta tendência para a estagnação se mantiver, Portugal deixará muito rapidamente de ser um “pobre entre os ricos” para se tornar, pura e simplesmente, “um pobre”. Um dos mais pobres de toda a Europa.