O Teorema Zero

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1957

Desengane-se quem for ver «O Teorema Zero» a pensar nalguma sequela, ou actualização, do já mítico “Monty Python, O Sentido da Vida” (1983). É que, se à partida havia uma dupla coincidência entre ambos filmes – os realizadores, Gilliam e Jones, partilham do mesmo nome próprio, e o dito sentido é também agora o centro das atenções neste filme de Terry Gilliam- a verdade é que apenas a coincidência de nomes pode sustentar tal ilusão.

435733-the-zero-theorem-the-zero-theorem-poster-art“O Teorema Zero” é um filme claramente de Gilliam e de mais ninguém. E se o autor daqueles portentosos intercalares, feitos de colagens animadas mais ou menos toscas, que marcaram de forma corrosiva e indelével a saudosa série “Monty Pyhton, Flying Circus”, conta já com 73 anos, ele mantém intacta a sua irreverência, embora, naturalmente, a tendência seja para se plagiar a si próprio, encalhando nalguns dos detalhes que marcaram os seus filmes mais notórios (a careca de Waltz é a de Willis, em “Os 12 Macacos”, a rapariga da ‘pizza’ é a dos telegramas cantados de “Brazil”, os tubos para ‘download’, idem, etc.) – e demos graças por ter enterrado o psicadelismo de “Fear and Loathing in Vegas”.

Ao invés das partes gagas que glosavam, com apurado sentido humor, o tal “sentido da vida” em 1983, a coisa agora é por séria e simbólica, entre sagrado e profano – o protagonista, Qohen Leth, vive numa antiga igreja e dorme nos tubos do órgão, voz de Deus, e na cabeça de Cristo está uma câmara de videovigilância, ligada ao “patrão” de Leth –, esotérica, pessimista: só mergulhando no vórtice negro (o poço, por contraponto à luz) do seu desafio pessoal (revisitação do anjo de “Brazil”?), ele alcançará o sentido da vida, depois de conhecer, enfim, sacrificar, o amor real, proporcionado cibernauticamente, em visão paradisíaca a dois.

Lição para as redes sociais e para o vício do dedilhar frenético das teclas dos nossos dias? Sim. Há poesia no filme? Sim. Todos nós esperamos por um telefonema que nos explique o sentido da vida? Claro. A equação que nos move é resolúvel? Talvez. Acaba mal, pois acaba, é inevitável.

  • Título original: The Zero Theorem
  • Realização: Bahman Ghobadi
  • Com: Christoph Waltz, David Thewlis, Matt Damon, Mélanie Thierry, Tilda Swinton
  • Origem: EUA/ROM/RU, 2013, 107 min.
  • Estreia: 17 de Julho de 2014