KO SNS, fala a Marta

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Andava o país entretido com o ritmo de afirmações estrambólicas dos membros do Governo, uma espécie de concurso em que estes tentam vencer o colega do lado pelo grau de estupefacção que uma declaração pode provocar, quando entrou em campo um peso pesado. Depois de António Costa decretar prematuramente a morte e o enterro das contratações do seu ministro das Finanças, dos algoritmos de Patrícia Gaspar sobre incêndios e dos melhoramentos na Serra da Estrela decretados por Mariana Vieira da Silva, veio Marta Temido anunciar que a culpa dos problemas do SNS vem, afinal, dos anos oitenta. 

É todo um novo mundo que se abre na desresponsabilização socialista pelo estado a que chegou o país. 

Quem não conheça a história recente de Portugal até poderá ser levado a pensar que o PS não teve responsabilidades nestes últimos anos, mas não é bem assim. Desde 1995 que o PS governa o país, praticamente de forma contínua, tirando duas pequenas interrupções: entre 2002 e 2005 e depois entre 2011 e 2015. Ou seja, nos últimos 27 anos, 20 foram de governo PS!

Se considerarmos apenas o período mais recente, desde 2015 que Portugal é governado pelos socialistas. Primeiro numa versão mais radical, com PCP e BE a influenciar e deixar passar sucessivos Orçamentos do Estado, e mais recentemente numa versão PS absolutista.

Isto pode explicar o facto de a, agora demissionária, ministra da Saúde ter de recuar aos anos oitenta para arranjar um bode expiatório. Caso contrário corria o risco de atingir o actual chefe de governo, que esteve quase sempre presente nas diversas governações socialistas e, no pequeno período em que não esteve, foi o número dois no partido.

A culpa já foi da crise internacional, da “Troika”, do Passos, e agora é dos anos oitenta. A culpa nunca é do PS, dos seus ministros ou das suas políticas. Isto é extraordinário vindo de um partido que governou durante 20 dos últimos 27 anos. 

Regressando à área da Saúde, parece que, afinal, Marta Temido também terá a sua parte de culpa, pois apresentou (finalmente) a sua demissão a António Costa, que a aceitou, alegando já não ter condições para exercer o cargo.

Ministra desde 2018, a sua gestão fica marcada por um conjunto de polémicas e uma total incapacidade para resolver os graves problemas do SNS. Atacou os privados quando na realidade precisava deles, defendeu a redução de horários e depois telefonou a pedir para cancelarem férias, acabou com PPP’s cuja gestão era motivo de elogios e passou a ter hospitais com o mesmo tipo de problemas que os restantes do SNS, criou guerras com enfermeiros e médicos em vez de promover diálogos e consensos. 

Os serviços de saúde estão a rebentar por todos os lados, com urgências a fechar e médicos a pedir escusas. Milhares de portugueses continuam sem médico de família ou pendurados em intermináveis listas de espera. Mas nada disto é novo ou recente. Em 2019, antes da pandemia, já era este o cenário que se vivia. Basta rever a imprensa da altura e já se falava em caos no SNS, em médicos a pedir escusa, em listas de espera a aumentar, em dívidas dos hospitais a atingir valores recorde, em médicos a denunciar horas extras acima do limite máximo, em falta de profissionais de saúde. São poucas as diferenças para o que vamos ouvindo e vendo nos dias de hoje. Significa isto que Marta Temido não está na origem do problema, apenas foi incapaz de o resolver e nalguns casos até o terá agravado, o que já seria suficiente para justificar a sua demissão.

Mas não nos enganemos: por si só, a saída da actual ministra não resolve nenhum problema de fundo do SNS e, acima de tudo, não desresponsabiliza o PS pelo estado de calamidade a que chegaram os serviços de saúde em Portugal. ■