Ventos de dissolução sopram sobre o Chega!

Depois de nas últimas eleições legislativas o Chega ter conseguido ser o terceiro partido no Parlamento – depois do PS e do PSD – sente-se um permanente vento de dissolução. O mesmo vento que levou a que dos 300 autarcas que o Chega elegeu, cerca de 60 já terem batido com a porta por entre acusações de nepotismo e autoritarismo por parte de André Ventura.

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Face às críticas André Ventura decidiu dar um passo em frente. O Chega vai debater uma moção de confiança à liderança de André Ventura num Conselho Nacional extraordinário no qual todos os militantes poderão intervir, mas apenas os conselheiros poderão votar.

Em comunicado é referido que a direcção nacional do Chega requereu a “convocação de um Conselho Nacional extraordinário com o objectivo de discutir, avaliar e votar a moção de confiança proposta pelo presidente” do partido. A reunião vai decorrer nos dias 17 e 18 de Setembro, na Batalha (distrito de Leiria).

André Ventura parece voltar um a ser “homem só”. Um líder que teve uma estratégia vencedora, mas que agora quer ocupar o palco mediático quase a 100%.

Aberta a todos os militantes

Esta reunião do órgão máximo entre congressos vai ser aberta a “todos os militantes” que queiram participar, mas apenas poderão votar a moção de confiança os dirigentes que já integram o Conselho Nacional, no qual o líder tem larga maioria.

“Entendendo que é fundamental que não subsistam dúvidas internas quanto à legitimidade do presidente e ao estilo de liderança que este tem afirmado, quer em termos partidários, quer parlamentares, a direcção nacional solicitou igualmente à mesa nacional que o XI Conselho Nacional seja aberto à participação de todos os militantes, de todas as regiões do país, para que o debate seja completo, global e o mais abrangente possível”, defende o partido.

Por isso, em simultâneo, vai decorrer a primeira assembleia plenária (figura que não consta dos estatutos), “como forma de participação directa dos militantes no caminho a seguir pelo partido”.

Ventura anunciou a apresentação de uma moção de confiança após as críticas do deputado Gabriel Mithá Ribeiro, que se demitiu de vice-presidente da direcção após ter sido afastado da coordenação do gabinete de estudos do partido (ver peça secundária).

No comunicado, o Chega indica que “todos os militantes em situação regular poderão participar e intervir, nos termos do regulamento interno a aprovar pela mesa”.

Os trabalhos vão arrancar com a apresentação da moção de confiança pelo presidente do partido, que será votada “através de voto secreto em urna fechada” no final do debate.

“Os resultados serão anunciados pela mesa nacional, logo após validada a contagem pela mesa e pelo conselho de jurisdição nacional”, é indicado.

Recorde-se que o líder do Chega, André Ventura, anunciou no domingo uma moção de confiança para que os órgãos competentes do partido se pronunciem sobre a forma como a formação tem sido dirigida.

O líder do Chega considerou ser “evidente que há hoje no partido uma facção”, que ele pensa ser minoritária, que contesta a actual direcção.

“Pretendo apresentar uma moção de confiança ao partido, a marcar de forma urgente, onde todos possam participar e ter a sua posição para definir se este é o caminho que querem, o caminho que nos trouxe até aqui”, disse André Ventura, à margem da sessão de encerramento da Academia de Verão da Juventude do Chega.

Vitória e poder

Mas nas últimas legislativas também a Iniciativa Liberal cresceu tendo ficado com uma bancada parlamentar significativa. António Costa conseguiu manter a maioria absoluta, mas viu a área à sua direita ganhar terreno.

O estilo de André Ventura é muito diferente do utilizado pelo líder da IL, João Cotrim de Figueiredo. E escassos cinco meses após as eleições há notoriamente um crescimento da IL e um definhamento do Chega.

Exemplo disso é o facto mais de 90% dos proprietários de imóveis assumirem não ter confiança no executivo, e quase metade dos respondentes (47,5%) admitiu acreditar “que pode haver a tentação de adopção de medidas populistas este ano” (ver peça da página 4).

De notar que mais de um quarto dos proprietários auscultados (26,4%) consideraram que a Iniciativa Liberal (IL) irá liderar a oposição ao Governo, recolhendo mais respostas que o PSD como principal partido da oposição, embora um terço dos inquiridos (32,4%) tenha considerado que “nenhum partido conseguirá fazer frente à maioria absoluta do PS”.

A “rentrée” do Chega

Tal como os outros “grandes” partidos, o Chega teve este ano a sua “rentrée” política no Algarve e o líder disse que o partido e o grupo parlamentar têm uma “enorme unidade” e vão estar “muito fortes” logo no arranque dos trabalhos na Assembleia da República (AR).

“O que nos importa é que vamos ser muito fortes na inauguração do ano parlamentar”, disse André Ventura à chegada ao Casino de Vilamoura onde se realizou o jantar que marcou a “rentrée” política do partido.

O líder do Chega garantiu que “o grupo parlamentar continua unido”, apesar de alguns deputados não estarem presentes “por qualquer razão”.

“Não queria deixar de notar não só a presença de uma grande parte do grupo parlamentar, muitos deputados” e outras personalidades do partido, “a mostrar que temos esta enorme unidade”, que “por muito que alguns a queiram destruir, não vão conseguir”, repetiu André Ventura.

O terceiro maior partido representado na AR tem vivido alguma turbulência interna, com a liderança de Ventura a ser contestada por algumas figuras conhecidas da formação.

O episódio mais recente foi o pedido de demissão do deputado Gabriel Mithá Ribeiro, vice-presidente do Chega, depois de ter sido afastado do cargo de coordenador do gabinete de estudos.

Novamente assumindo o estatuto de “homem só”, esse cargo foi assumido por André Ventura, que no mesmo dia justificou a decisão com a reorganização interna que vai propor.

Demissões e expulsões

Também esta semana, o antigo vice-presidente do Chega, José Dias, foi suspenso por decisão da comissão de ética do partido, que vai propor também a sua expulsão, devido a uma publicação nas redes sociais na qual critica o líder, André Ventura.

O presidente do Chega não fez referência directa a estes casos, limitando-se a repetir que o partido está “unido” e irá “dar uma luta sem tréguas ao governo socialista”, sublinhando que não receberá “lições” de “ninguém” sobre como o irá fazer.

“Enquanto o país arde, António Costa está de férias e nem sequer teve a preocupação de vir dizer aos portugueses se concordava ou não com as afirmações absurdas que os seus ministros têm feito ao longo destes dias”, disse André Ventura perante cerca de 300 militantes do Chega.

O líder do partido explicou que se referia à ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, que, segundo ele, “afirmou que o incêndio na Serra da Estrela até talvez pudesse vir a ter consequências positivas” e à secretária de Estado da Protecção Civil, Patrícia Gaspar, que teria dito que esse incêndio “nem sequer foi tão mau como se pensava”.

“Pela nossa parte é muito claro, estes dois governantes deviam ir para a rua”, disse André Ventura, que voltou a defender a prisão perpétua para os incendiários que também deviam ser declarados “terroristas”.

O presidente do Chega criticou a tentativa frustrada de contratação de Sérgio Figueiredo por parte do ministro das Finanças, Fernando Medina, defendendo que o episódio pôs a descoberto “uma teia enorme de troca de favores, que vai da Câmara de Lisboa ao Governo”, sendo “os segredos de Medina” também os de Costa, com “um a cobrir os segredos do outro”.

Apelos ao PR

Em seguida, lançou um apelo ao Presidente da República para “não deixar passar a proposta do Governo de retirada do Gabinete Nacional Interpol e da Unidade Nacional Europol da alçada da Polícia Judiciária”.

De acordo com André Ventura, a proposta tem como objectivo “calar” juízes e procuradores, alertando contra os riscos de falta de separação de poderes.

O líder do Chega criticou “as ausências” de Marcelo Rebelo de Sousa numa altura em que o país está a arder e interrogou-se sobre “o que o prende” a António Costa e ao PS, acusando o Presidente da República de “estar sempre a branquear” o executivo.

O Presidente da República recusou-se a comentar as acusações que lhe foram feitas pelo líder do Chega, dizendo que, além de “não poder entrar no terreno da luta político-partidária”, a sua função é “estar acima disso”.

Finalmente, André Ventura quis “deixar claro” que o Chega vai “avançar” com a proposta de resolução de censura ao presidente da Assembleia da República, sublinhando que Augusto Santos Silva se comporta mais como um deputado do PS.

Recorde-se que apesar de ser o terceiro partido na AR, o Chega não conseguiu a eleição de um vice-presidente do Parlamento. ■

Foto por Agencia LUSA – ENTREVISTA: Presidenciais: Ventura concorda que “ser homossexual não desvaloriza ninguém” (0s 0m), CC BY 3.0, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=99269769