Pagamento Especial por Conta: o isco da Autoridade Tributária

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Uma das propostas que o Parlamento fez aprovar em sede de Orçamento Rectificativo com maioria negativa, ou seja, só com os votos contra do Partido Socialista, foi, a pedido das empresas, a devolução do Pagamento Especial Por Conta ainda não utilizado para dedução ao lucro tributável.

Esta medida destina-se à ajuda da fraca tesouraria das pequenas e médias empresas que, com a grave situação que hoje atravessam, é por demais evidente e mais do que necessária. 

Mas de que se trata este Pagamento Especial por Conta?

Das inúmeras e originais formas que o Estado cria para tributar, o Pagamento Especial por Conta nasce em 1998 e é trazido pela mão da então Ministra das Finanças, Manuela Ferreira Leite, considerado na altura um « imposto» extraordinário e complementar ao pagamento de IRC, que serviria como bode expiatório ao combate à evasão fiscal. 

Mas, como já se sabe, tudo o que é criado extraordinariamente em matéria de tributação, neste país, quer sempre dizer que tem carácter permanente ao longo de muitos e largos anos. 

Com a redução deste Pagamento, desde 2017, só com o Orçamento de Estado de 2019 se conseguiu alargar o âmbito da dispensa do Pagamento Especial por Conta, o que na verdade veio beneficiar e aliviar a tesouraria de uma grande parte das empresas. 

Para se beneficiar desse alargamento, bastaria cumprir com os prazos legais na entrega declarativa das obrigações fiscais (Modelo 22 e Informação Empresarial Simplificada) e automaticamente se ficava dispensado do pagamento do Pagamento Especial por Conta.

Este pagamento, pode dizer-se, era nada mais nada menos que um adiantamento de dinheiro ao Estado, mas a custo zero, tal como é o pagamento por conta de IRC, um empréstimo concedido ao Ministério das Finanças pelas empresas que seria mais tarde deduzido ao lucro tributável a existir em um determinado exercício económico. 

Muitas entidades haverá que não conseguiram deduzir ao seu lucro todo o Pagamento Especial por Conta feito, tendo o Estado até hoje esse valor em excesso na sua carteira. 

Porém, a Lei 27-A/2020, de 24 de Julho, que aprovou o Orçamento de Estado Rectificativo para 2020, alterando pela segunda vez a Lei 2/2020, de 31 de Março, e outros diplomas diversos com medidas de apoio às empresas e pessoas no âmbito da pandemia do Covid-19, aprova, com os votos da tal maioria negativa, uma medida de grande importância para a generalidade das empresas. 

As entidades classificadas como cooperativas ou como micro, pequenas e médias empresas, pelos critérios definidos no artigo 2.º do anexo ao Decreto-Lei 372/2007, de 6/11, podem solicitar, até 31 de Janeiro de 2021, o reembolso integral da parte do Pagamento Especial por Conta que não foi deduzida nos períodos de tributação de 2014 a 2019. 

Se até aqui alguma justiça foi feita nesta matéria, agora as entidades que desejem ver nas suas contas bancárias o Pagamento Especial por Conta que está disponível para dedução ao lucro, podem ter o fisco à perna. O aviso por parte do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais foi claro: quem vier a requerer a devolução do Pagamento Especial por Conta pode ser alvo de inspecção tributária. 

Portanto, a Autoridade Tributária utiliza como isco o dinheiro dos contribuintes, avisando desde já sobre a contrapartida que poderá existir para que o Estado devolva o que não lhe pertence.

É utilizar a táctica do medo, lançando mão da inspecção tributária a que se pode estar sujeito. Esta táctica utilizada pelo Executivo para, embora esteja inscrita na Lei a possibilidade de requerer a devolução do Pagamento Especial por Conta, afastar o contribuinte de pedir aquilo o que tem direito, é só mais um dos inúmeros exemplos da forma «simpática e afável» como o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais trata os contribuintes Portugueses.

Institui por despacho, numa altura destas, a cultura do medo, que não é próprio de um Estado de Direito Democrático nem contribui para a acalmia tão necessária das organizações. Isto é dizer que o Estado não confia nas empresas. O equilíbrio da conta corrente da confiança com os contribuintes deve ter um saldo positivo, mas com atitudes como esta nunca se conseguirá atingir os níveis tão necessários de se perceber e entender que afinal o Estado pode ser uma pessoa de bem. Assim fica provado, mais uma vez, que não o é.

Querer fazer com que o contribuinte desista de pedir o que lhe pertence e que agora tanta falta faz, é o resultado de como o Partido Socialista pretende ajudar as micro e pequenas empresas.

Por alguma razão, quando o Parlamento decide aquilo que o PS não quer, surgem as mais escandalosas ameaças. ■