Os dados constam do relatório “Risk Maps 2020” da empresa de análise Aon e não deixam margem para dúvidas: devido à pandemia, três em cada cinco países desenvolvidos do Ocidente estão em risco de enfrentar episódios de desordem civil, incluindo ataques terroristas protagonizados por militantes extremistas – tudo espoletado por uma maior exposição a restrições na vida social e económica, a interferência política na esfera privada e a um controlo excepcionalmente elevado da vida financeira dos cidadãos e das empresas.
As medidas extraordinárias de saúde pública e a quebra abrupta do comércio global estão a gerar uma maior pressão nas economias e governos de todo o mundo, ao mesmo tempo que começam a contribuir para uma mudança do panorama geopolítico a longo prazo.
Estas são as principais conclusões do “Risk Maps 2020”, um relatório da Aon que visa identificar e analisar os riscos políticos, de terrorismo e de violência política a nível global, com o intuito de ajudar as empresas a responderem às consequências que estes fenómenos podem ter nos seus negócios.
Descontentamento
Com um especial foco na actual pandemia, o documento pretende ainda determinar a influência que a Covid-19 está a exercer a nível socioeconómico. Exemplo disso são os países que dependem bastante de sectores como o turismo e o retalho (dois dos mais afectados pelas medidas de confinamento), ou que apresentam uma elevada taxa de vítimas mortais para a pandemia, que neste momento incorrem num maior risco de enfrentar protestos ou confrontos civis contra os órgãos governamentais (um risco que já era elevado antes do surgimento do novo coronavírus).
E a onda de reacções está aí: nas últimas semanas, quer na Europa quer no continente americano, manifestações de protesto contra as medidas de distanciamento social, quarentena ou confinamento surgiram um pouco por toda a parte, muitas vezes organizadas por populares através das redes sociais.
Para Carlos Freire, Deputy CEO da Aon Portugal, o cenário de desordem é preocupante: “uma maior ocorrência deste tipo de fenómenos traz não só uma maior instabilidade social e política, como também um impacto negativo na actividade das empresas, reflectido em repetidas interrupções nas cadeias de distribuição, redução da produtividade, destruição e roubos de espaços e recursos, e até perdas nas receitas”. E acrescenta: “a pandemia de Covid-19 veio espoletar um maior descontentamento das pessoas face às medidas de contenção do vírus adoptadas pelos diferentes países”.
‘Drones’
A par dos episódios de desordem social, também o aumento dos ataques terroristas organizados por militantes extremistas, sobretudo em países do Ocidente, deve ser motivo de preocupação das empresas. Segundo o “Risk Maps 2020” da Aon, o número de ataques deste tipo duplicou entre 2016 e 2019, uma tendência que se prevê manter-se em 2020. Destaque, neste âmbito, para os Estados Unidos da América, para a Alemanha e para a França, que foram em 2019 os três países com maior número de ataques sofridos, com 53%, 17% e 8% do total de episódios, respectivamente.
Para além do poder político, refere Carlos Freire, “também as empresas multinacionais, em particular as empresas dos sectores tecnológico, bancário, financeiro e mediático, têm sido alvo de mensagens hostis”. Ainda na lista de riscos de terrorismo apontados pelo documento está a utilização de ‘drones’ para a concretização de ataques. Só em 2019, tal como descreve o relatório, nove dos maiores aeroportos do mundo sofreram incidentes com ‘drones’, tendo como consequência a não realização de voos.
Mitigar riscos
Já ao nível do risco político, o relatório destaca três factores que podem colocar em causa o negócio das empresas: primeiro, o risco de imposição de restrições comerciais entre países, que impedem ou dificultam as transacções globais; em segundo lugar, o risco de interferência política na economia, sobretudo em forma de expropriação, um cenário que afasta possíveis investimentos privados; por fim, o risco de controlo da moeda, dado que a flutuação nos valores monetários leva à imprevisibilidade de receitas e custos e, por sua vez, ao desinvestimento das empresas em determinada economia.
Apesar destes serem mais frequentes em países menos desenvolvidos, destaca Carlos Freire, “a verdade é que a Covid-19 veio reformular algumas normas já estabelecidas em países desenvolvidos, nomeadamente a nível comercial e monetário, o que leva a que exista uma maior exposição das empresas a cenários que podem afectar negativamente a sua actividade”.
Mesmo perante a emergência de diversos riscos, acrescenta, “o grande objectivo da Aon com o ‘Risk Maps 2020’ passa por conseguir ajudar as empresas no seu processo de gestão do risco, quer identificando atempadamente as áreas em que existe uma maior exposição ao risco, quer capacitando cada organização a prevenir e mitigar esses mesmos riscos, e assim atenuar o impacto que esses podem trazer à sua actividade”. ■