O Presidente de República pede e aconselha o máximo de estabilidade para a banca nacional. Mas dos bastidores chegam ecos de grande preocupação e já há quem tema a iminência de um programa de resgate dirigido só à banca portuguesa.
Nada que não tenha já acontecido: a optar-se por um programa de resgate exclusivamente destinado à banca, ele seria uma réplica actualizada do que Espanha fez no pico da crise das dívidas soberanas, quando Portugal – então na era Sócrates – pediu um resgate de 78 mil milhões, dos quais cerca de 12 mil milhões eram destinados a uma linha de recapitalização dos bancos.
Uma linha que nem todos utilizaram – com destaque para o BES, que preferiu ir empurrando com a barriga os enormes problemas com que se debatia, em vez de pedir ajuda e ter de aceitar na sua gestão quadros em representação do Estado. Uma atitude que desembocou no drama do Novo Banco e no processo dos chamados lesados do papel comercial, com António Costa a encenar uma proposta de entendimento entre lesados, Banco de Portugal e CMVM, que todos sentem ser apenas uma encenação para um mero efeito mediático.
E enquanto Sérgio Monteiro continua a tentar vender o Novo Banco, sem que haja notícias ou grandes hipóteses de negócio, surge uma generalizada desconfiança sobre a banca portuguesa com declarações cruzadas dos mais diversos protagonistas políticos.
Com o Executivo de António Costa em braço de ferro com o Governador do Banco de Portugal, o Presidente de República tentou baixar o clima de crispação. Marcelo Rebelo de Sousa considerou que “a palavra a dar é de estabilidade financeira”, depois de questionado sobre o facto de o ministro das Finanças atribuir uma “falha grave” ao governador do Banco de Portugal.
“É importante para o País que haja estabilidade política, económica e financeira. Nesse sentido, a palavra a dar é de estabilidade financeira, estabilidade no funcionamento das instituições financeiras”, declarou Marcelo Rebelo de Sousa, em resposta aos jornalistas no final da cerimónia de entrega do Prémio Pessoa, na Culturgest, em Lisboa. O PR voltou a defender que, “neste momento, as instituições estão a funcionar normalmente e, portanto, não vale a pena estar a especular sobre tudo aquilo que não seja o funcionamento normal das instituições, incluindo as financeiras”.
Num negócio como o da banca, em que a confiança é uma necessidade inultrapassável, Marcelo não gostou de ver Mário Centeno, numa entrevista à RTP, em Washington, a dizer que o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, cometeu uma “falha de informação grave” na resolução do Banif ao omitir que tinha pedido ao Banco Central Europeu para limitar o financiamento daquela instituição financeira. “Nesse sentido, é uma falha grave, que nós reputamos de falha grave de transmissão de informação”, acrescentou Mário Centeno.
Ora “falha grave” aparece como uma das poucas razões que justificam um afastamento de um governador do BdeP. A independência do cargo prende-se com a sua total independência do poder político, um facto que o Executivo da “geringonça” parece ignorar, até por ter necessidade de agradar aos seus parceiros, com particular destaque para o BE.
Reforçando a sua característica de independência, o Banco de Portugal, quando confrontado com a polémica em torno do caso Banif, realçou que as regras impedem que os bancos centrais divulguem aos Executivos nacionais as decisões tomadas no Conselho de Governadores do Banco Central Europeu (BCE).
“Os membros do Conselho do BCE não podem, por imposição das normas do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do seu Código de Conduta, divulgar ou discutir previamente com as autoridades nacionais as questões a decidir pelo Conselho, nomeadamente as questões que digam respeito ao exercício do mandato do BCE em matérias de política monetária”, lê-se num comunicado do supervisor bancário português.
Neste braço de ferro, que parece não ceder à mediação do Presidente, hoje mesmo, dia 19, está marcada nova ronda de audições parlamentares a Carlos Costa e Mário Centeno numa comissão de inquérito parlamentar transformada em mera arma de arremesso entre Governo e Oposição.
O PSD reagiu à polémica a seguir à ultima reunião da Comissão Política, com a vice-presidente do PSD, Teresa Morais, a afirmar que o ministro das Finanças vai ter “uma nova oportunidade” para explicar tudo aquilo que entenda “aos deputados sobre a sua primeira declaração” na comissão de inquérito do Banif. Recorde-se que, na quinta-feira, o PSD tinha acusado o ministro das Finanças de prestar “um depoimento falso” na comissão de inquérito do Banif sobre o seu papel na venda ao Santander Totta e que iria requerer o regresso do governante à comissão, estando esta nova audição já marcada para terça-feira.
Do lado do CDS, a preocupação com a banca também se expressa sem rodeios. A presidente do partido, Assunção Cristas, afirmou desejar que a nova administração da Caixa Geral de Depósitos trabalhe “em prol do país” e da economia. E acrescentou: “Eu gostaria de saber exactamente qual é a dimensão da situação e do problema que temos na CGD no que respeita à capitalização”, pois “é importante perceber como é que essa capitalização vai ser feita, como é que as autoridades europeias estão a ver esta questão […]. Sabemos que há dúvidas, que é um tema difícil, mas eu gostaria de ver como é que estamos a progredir nesse dossier, e o CDS certamente continuará a estar atento a esta matéria”, frisou.
Assunção Cristas admitiu ainda que todo o sistema bancário é uma preocupação, e que o banco público não escapa à turbulência. Segundo a líder do CDS, é necessário conhecer, em concreto, a necessidade de capital para a Caixa. “São dois mil milhões de euros, são três mil milhões de euros, é mais do que isso?”.
Recordando que o CDS sempre defendeu uma CGD 100% pública, afirmou: “Se é preciso capitalizar, tem de ser também com recursos exclusivamente públicos […]. Há dúvidas no que respeita ao enquadramento dos auxílios de Estado. Eu penso que o País se deve bater para que possa fazer uma capitalização 100% pública e que não seja beliscada por essas regras dos auxílios do Estado”, concluiu.