foto_Brandão FerreiraBRANDÃO FERREIRA

 

Porque fomos a Ceuta? Esta é a pergunta primordial que assalta a todos quando confrontados com o evento. A resposta é simples: fomos a Ceuta porque precisámos! Provar este postulado é o principal objectivo desta arenga.

Comemorar os 600 anos da tomada de Ceuta é um imperativo histórico; um desígnio patriótico, uma afirmação de que existimos e estamos vivos e uma medida de elementar bom senso. Ceuta marca, consensualmente, o início oficial da expansão portuguesa e a saga dos descobrimentos, obedeceu a um desígnio político/estratégico com várias vertentes e um pano de fundo religioso.

Não aconteceu por acaso e a sua génese vem de trás. Vamos começar por aí.

Causas remotas

Portugal, com as suas fronteiras continentais definidas em 1297, através do Tratado de Alcanizes (as mais antigas da Europa), possuía já uma consciência nacional acentuada, a partir do reinado de D. Dinis.

Este rei teve uma acção notável: dotou o país de uma organização político-administrativa estável e lançou as bases para um desenvolvimento económico sólido. O príncipe, que viria a subir ao trono em 1279, com apenas 18 anos, teve uma educação esmerada (foram seus educadores: Emérico d’Ebrad, sacerdote francês, mais tarde bispo de Coimbra; Domingos Jardo, sacerdote português, mais tarde bispo de Évora e Lisboa; e ainda aqueles que lhe serviram de aios, Lourenço Gonçalves Magro e Nuno Martins de Chacuim, que viria a ser seu mordomo-mor). Seu pai, D. Afonso III, teve a rara visão de cedo o iniciar nos negócios da governação e foi o primeiro rei que deu casa ao herdeiro, com renda anual e pessoal para seu serviço. D. Dinis sofreu ainda forte influência de seu avô D. Afonso X, o Sábio, rei de Castela.

Logo no início do reinado, demonstrando especial intuição para os negócios diplomáticos, conseguiu resolver favoravelmente os graves conflitos (o país estava excomungado) que opunham o poder régio aos bispos e à Santa Sé (1289). Poeta e protector das letras, traduziu obras e criou a primeira biblioteca da Corte.

Ao determinar que todos os documentos fossem escritos em língua portuguesa e não em latim, como era tradicional, tomou uma medida de grande e profundo alcance; criou os Estudos Gerais em Lisboa, primeira Universidade do Reino; reforçou a administração e fortaleceu o poder real; reorganizou os Concelhos, dando foral a vilas e cidades; limitou a aquisição de bens de raiz por parte do clero e fez inquirições às propriedades da nobreza; fomentou a justiça, reforçou a defesa do reino, pela melhoria do exército e fortificação de todos os lugares fronteiriços.

“Nacionalizou” as ordens militares com excepção da do Hospital e criou, em 1319, a Ordem de Cristo, que se revelaria de primordial importância na gesta dos Descobrimentos.

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