Agora que o PS reconquistou o Terreiro do Paço, o Poder Local socialista sabe que tem luz verde para esbanjar em grandes obras. Em Lisboa já se anunciam projectos faraónicos, a maior parte dos quais só vai servir para transformar a vida do cidadão num inferno.
A guerra socialista contra o automobilista, que o lisboeta nunca compreendeu, continua sem tréguas. Desta vez, o objectivo é acabar com mais espaço de via e de estacionamento, de forma a instalar mais árvores e relva. Não seria uma ideia completamente descabida, não fosse pelo facto de ser levada a cabo no centro financeiro de Portugal, onde o automóvel é um bem essencial para transporte rápido. Lisboa, que já é uma das cidades mais congestionadas e com menos lugares de estacionamento da Europa, vai ficar ainda mais caótica.
Na praça do Saldanha e nos arredores, a Câmara Municipal de Lisboa vai acabar com mais de 600 lugares de estacionamento. Aos moradores, que estão furiosamente contra esta proposta mas não têm voz na matéria (rica “democracia”), as alternativas apresentadas são… bicicletas, a nova moda das esquerdas “chiques”. Uma excelente solução para Amesterdão, uma má escolha para uma cidade cujo cognome é “das sete colinas”.
“As pessoas são crucificadas por ter carro” – protestou um morador durante uma agitada reunião com Manuel Salgado, vereador do Urbanismo e primo de Ricardo Salgado, responsável por outro projecto que vai expulsar os bombeiros do seu melhor quartel lisboeta para que um hospital privado seja expandido.
Mas se estas obras arriscam infernizar a vida de muitos alfacinhas, já a segunda proposta irá lançar o caos total. O PS quer instalar árvores numa das vias rápidas com mais movimento da Europa, a Segunda Circular, diminuindo a largura das faixas e a velocidade máxima. Tendo em conta que a mais pequena perturbação na via, como um pequeno trabalho de manutenção, ou até mesmo a chuva, tende a produzir engarrafamentos de horas, uma obra desta natureza poderá parar Lisboa por completo. As reacções não se fizeram esperar: o Automóvel Clube de Portugal ameaça pôr a Câmara em tribunal, numa tentativa (que está a recolher largo apoio da população) de impedir os desígnios socialistas.
O presidente do ACP, Carlos Barbosa, afirmou que “só um louco é que pode fazer uma proposta destas”, que designou como projecto “surrealista” e “faraónico”. “Não podemos permitir que estes dois senhores prejudiquem milhares e milhares de lisboetas”, afirmou Barbosa, referindo-se a Manuel Salgado e a José Sá Fernandes (este último, vereador da Estrutura Verde e Energia, por sinal o mesmo que há tempos deu ordens para se retirarem os símbolos do Império português da praça do Império, ordens que felizmente foram travadas graças aos muitos protestos da população).
Fernando Nunes da Silva, que foi vereador no mandato camarário de António Costa, agora primeiro-ministro, veio a público colocar-se definitivamente contra a ideia. Aquele especialista em Planeamento Urbano criticou o que considera ser “uma operação fundamentalmente cosmética”, e que vai criar “um pandemónio” na cidade, prevendo filas de trânsito de quase seis horas.
Já o projecto de plantar árvores no que é, efectivamente, quase uma auto-estrada, é duramente criticado por Nunes da Silva, que afirma que as árvores vão criar um “efeito de túnel” de gases tóxicos, aumentando ainda mais a poluição na cidade.
Curiosamente, uma obra que não será feita de imediato (mas que iria, essa sim, facilitar imenso a vida aos lisboetas) é a construção de um túnel ligando a Avenida Fontes Pereira de Melo aos túneis do Campo Grande. A ideia teve origem no antigo autarca Pedro Santana Lopes, cujos esforços para melhorar a vida dos alfacinhas através da construção do aclamado túnel do Marquês quase foram destruídos por um ódio vingativo da esquerda. José Sá Fernandes chegou mesmo a interpor uma providência cautelar, o que atrasou inutilmente a construção do túnel.
Enquanto a esquerda mandar na capital, dificilmente serão aprovados projectos que realmente interessam ao lisboeta. Mas o relógio está contra os socialistas: para 2017 estão marcadas eleições autárquicas, e há cada vez mais dúvidas de que a “frente popular” que aguenta o actual Executivo se consiga manter intacta.
Um detalhe pouco conhecido: a expressão “Segunda Circular”, apesar de ser usada frequentemente, até nas placas de trânsito, nunca foi oficializada. A razão perdeu-se do conhecimento geral desde a construção da via, nos anos 50. A maioria das pessoas assume que existe, ou existiu, uma “primeira circular”, mas não faz ideia onde fica.
O nome tem origens populares e nasce do facto de, na gíria, se chamar “circulares” às antigas estradas da circunvalação do século XIX, que rodeavam Lisboa e onde estavam presentes as alfândegas, que cobravam impostos aos produtos que entravam na capital. A última estrada da circunvalação, considerada a “primeira circular”, começava no Largo de Alcântara, passava pela rua D. Carlos Mascarenhas, seguia pela rua Marquês de Fronteira, ia pela Duque d’Ávila, descia à Praça do Chile, atravessava a Morais Soares e terminava na Cruz da Pedra, perto da estação de Santa Apolónia.
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