Há 89 anos, Salazar tomava posse, pela primeira, como ministro das Finanças. Mas nessa altura a Ditadura Militar ainda se ressentia da instabilidade própria da juventude do regime. Ao fim de quinze dias, o catedrático voltava a Coimbra. Regressou ao Governo passados dois anos – para erguer um País e deixar uma obra que continua a ser lembrada com admiração, passados quase 45 anos da sua morte.

O mito do “eremita” de S. Bento (a residência oficial para onde foi morar depois do atentado de que foi alvo em 1937) foi criado pelos inimigos políticos de Salazar – tanto os próceres da classe política desacreditada da I República como os revolucionários anarco-sindicalistas e comunistas tentaram por todos os meios desumanizar o estadista que os varreu para o caixote do lixo da História – e, de forma mais ou menos involuntária, pelos seus apoiantes, pensando, com esse distanciamento da vida terra-a-terra, aumentar-lhe o prestígio.

Mas essa visão errónea é desmentida pelo testemunho de um colega catedrático de Direito na Universidade de Coimbra (ver caixa). Luís Cabral de Moncada (1888-1974) conta nas suas ‘Memórias’ uma viagem de comboio a Paris com Salazar e o futuro cardeal patriarca de Lisboa, Manuel Gonçalves Cerejeira, em Agosto de 1927. Já antes, em Novembro de 1924, Salazar viajara de carro por Espanha, visitando Ávila, o Escorial, Madrid (onde “devotou largo tempo” ao Museu do Prado), Toledo e Salamanca.

Outra imagem corrente de Salazar, a do homem despojado de interesses mundanos, é desmentida pelo seu principal biógrafo (e ministro dos Negócios Estrangeiros), Franco Nogueira, que regista os rendimentos do futuro presidente do Conselho além do ordenado de professor universitário: em 1922/23 ganhou cinco mil escudos por um parecer para o Banco de Portugal; em 1924, dois mil por outro para a Moagem e quatro mil escudos ainda por outro para o Crédito Predial — pequenas fortunas para a época, equivalentes aos actuais pareceres dos professores e advogados de maior nomeada. Igualmente lucrativa se revelou a quota que tinha na Coimbra Editora, que vendeu por 7000 escudos, em1924.

Salazar nasceu na aldeia do Vimieiro, perto de Santa Comba Dão. O pai, António de Oliveira, era feitor dos grandes proprietários locais. Filho mais novo e único rapaz (tinha quatro irmãs), António foi estudar para o seminário e chegou a tomar ordens menores. Quando decidiu que não queria ser padre, a mãe incentivou-o a prosseguir os estudos. Doutorou-se em Direito na Universidade de Coimbra (1918) e ganhou prestígio como catedrático de Finanças.

Católico fervoroso, a sua acção política começou por artigos de imprensa em defesa dos direitos da Igreja perseguida pela República, instaurada em 1910. Ainda estudante, Oliveira Salazar foi presidente do Centro Académico da Democracia Cristã. O seu melhor amigo era um padre, aluno da Faculdade de Letras: Manuel Gonçalves Cerejeira.

Em 1919, juntamente com outros três professores da Faculdade de Direito – Fezas Vital, Magalhães Colaço e Carneiro Pacheco – Salazar foi suspenso das funções docentes, acusado pelo governo de conspirar contra o regime republicano. A sua defesa, intitulada “A Minha Resposta”, ficou célebre. Passado um mês, era reintegrado.

Militante do Centro Católico Português, foi eleito deputado em 1921. Assistiu a uma sessão do Parlamento e, desgostado com a “desorientação” que testemunhou, regressou a Coimbra.

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