Pim!

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Pareço uma fatia de queijo espasmodicamente espalmada entre a Melancholia de Dürer e a Náusea de Sartre.

A areia corre, abstraída de tudo, no relógio – fina, compassada, sisificamente – e, apesar de tudo, o quadrado mágico exorta o número excelente, sem que a balança se mova, sem que o sino se comova nem comigo nem com o número, sem que o arco-íris solte duendes, sem que cheguem asas quanto mais voos, neste interregno flácido de agonia.

Daqui à náusea é menos do que um passo. Olho e oiço e vejo e escuto e não entendo a panóplia verborreica e aparatosa que percebo oca, talvez porque, em mim, a confiança se tenha estraçalhado irremediavelmente e já só veja pantominas e ademanes fátuos onde, outrora, julguei ver gente e gesto.

Melencolia_I_(Durero)O ribombar dos atarantamentos assusta-me – talvez por estar convencida que atarantado é o néscio, o tonto e o incompetente e que, ainda à laia de fatia de queijo, são esses os que pretendem gratinar-me.

Dou comigo a refugiar-me por dentro dos meus próprios olhos, que hoje já nem o meu olhar me serve de guarida, que as aguarelas estão por aí espalhadas pelo chão, com os compassos e as bússolas e outras coisas afins. Faz muito frio. Tornam-se muito escuros os dias deste Inverno em que as ruas estão pejadas de rótulos, num desarrazoado de recortes ignorantes do seu todo que se descoalham uns nos outros, empapados que estão das mesmas gomas e viscos.

Não estou no parque. Mesmo que estivesse não tenho lá à mão nenhum castanheiro que me faça discorrer sobre a existência. E como não sou esse outro, isso também não tem qualquer importância.

Hoje estou mais em maré de não discorrer sobre nada. Ou, melhor, sem maré, a ir com a areia e a passar por toda essa inexistência de que todos esses pretensos rótulos me falam, como se fosse eu a ampulheta.

Hoje, só estou mesmo à espera que este mundo se torne “qualquer coisa de asseado”.

Pim!