Luso-tropicalismo e Lusofonia (II)

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Foi também por isso que algumas posições mais extremadas do PREC (Processo Revolucionário em Curso), no pós 25 de Abril, não tiveram desenvolvimento real entre nós. Apesar de ter havido quem clamasse que “Camões também era colonialista”, não houve de facto (como ainda hoje não há), nenhuma maioria que sancionasse esse rompimento com a nossa história que agora alguns, aproveitando esta aparente oportunidade, pretendem de novo promover. Os portugueses, em geral, não têm nenhum mal-estar com a nossa história. Reconhecem, decerto, que os Descobrimentos tiveram, à luz dos valores de hoje, aspectos censuráveis. Mas não estão dispostos, e bem, a fazer tábua rasa de todo o nosso passado.

Porque, em última instância, é disso mesmo que se trata. E por isso não espanta que, nos Estados Unidos da América, as estátuas de Cristóvão Colombo tenham sido também visadas. A mensagem é óbvia: “Toda a história dos EUA é um erro”. Ainda que seja igualmente uma mensagem inconsequente – pois, como se poderia realmente remendar esse erro? Devolvendo toda a população “branca” à Europa? E toda a população “negra” a África? Obviamente, não é possível esse “recomeço” da história. Não é possível nos EUA nem em nenhum outro país do mundo. Em Portugal, isso significaria o quê? Querer recuar aos tempos prévios à “invasão dos romanos”?!… 

Mas deixemo-nos de perguntas ociosas e regressemos à tese principal de JPZ: a da equivalência conceptual que o autor estabelece entre “luso-tropicalismo” e “lusofonia”. 

A nosso ver, com efeito, há aqui um equívoco de base: é que “luso-tropicalismo” foi afirmado para perpetuar o status quo colonial. Ou seja, corresponde a um paradigma definitivamente ultrapassado pela história (chamemos-lhe aqui o “paradigma do 24 de Abril”). Sobre isso, qualquer discussão é igualmente ociosa: mesmo entre aqueles que consideram que o processo de descolonização foi “exemplar” (leia-se: “exemplarmente mau”), não há ninguém que seriamente acredite que seja possível qualquer espécie de regresso ao passado. Independentemente dos méritos ou deméritos da teoria luso-tropicalista e, sobretudo, da distância que sempre houve entre a teoria e prática – por mais que, apesar de tudo, nunca tenhamos construído um regime como o do “Apartheid” sul-africano –, a descolonização ocorreu e é irreversível.

Tendo sido esse o “paradigma do 24 de Abril” e tendo nós já aqui visto o “paradigma do 25 de Abril” – a concepção exclusivamente europeia de Portugal –, resta então falar sobre o conceito de Lusofonia, que aqui iremos considerar como o “paradigma do 26 de Abril”. ■