A ver o mar por Diogo Gil Gagean
Historicamente é um dos nossos maiores motivos de orgulho. A Marinha, instituição na qual foi alicerçada a construção do Império Ultramarino português, foi achincalhada na passada semana com um acto de insubordinação militar, quando 13 marinheiros se recusaram a embarcar no “NRP Mondego”.
Logo houve quem não hesitasse em afirmar que os marinheiros fizeram muito bem, pois não estavam reunidas as condições de segurança necessárias para que os marinheiros executassem as suas funções em segurança. Esta defesa dos marinheiros foi logo conotada com a extrema-esquerda portuguesa por se tratar de um navio russo e, claro, que a defesa destes esteja a ser dirigida por Garcia Pereira não ajuda em nada a descolar esta imagem.
Garcia Pereira ataca mesmo a instituição militar, ao acusá-la de apagar vestígios de prova do barco que fundamentavam a insubordinação dos militares. Não só estes se recusaram a cumprir uma ordem, como ainda atacam a idoneidade da Marinha.
Não estando em causa o brio e o patriotismo dos militares em causa, a realidade é que eles desrespeitaram uma ordem superior para o cumprimento de uma missão de vital importância para a segurança nacional e dos nossos aliados, pois deveriam ter acompanhado um navio russo que passava ao largo de Portugal.
Estamos perante um caso muito sério e grave. Ao colocar em causa um dos fundamentos principais e basilares do funcionamento castrense, a disciplina. Os militares envergonharam a nação e a farda, pois minaram a confiança externa que os nossos aliados depositam em nós para a defesa da Europa.
Imaginemos que os nossos valentes soldados na guerra do Ultramar, ou os soldados ucranianos que agora combatem a invasão russa, organizavam um plenário para decidir se a missão que lhes foi confiada poderia ser exercida sem riscos. Estas preocupações dos militares deveriam ter sido resolvidas em sede própria e não na praça pública.
A vida militar acarreta riscos e o risco de incêndio é, talvez, o mais comum em embarcações, razão pela qual os marinheiros militares ou mercantes têm formação específica nesta matéria.
A insubordinação é uma das violações mais graves da essência militar, pelo que os militares, mesmo com as suas razões, devem ser punidos por se terem recusado a cumprir uma ordem.
Gouveia e Melo esteve bem nas suas declarações. Se deveria ter feito publicamente o “puxar de orelhas” aos envolvidos já é outra história. Não estivesse o Almirante já em pré-campanha presidencial e este “puxão” certamente que teria sido dado no recato da instituição e não para as câmaras das televisões presentes.
A realidade é que este caso demonstra bem o estado a que o Estado chegou. Já não havia respeito pela autoridade civil ou judicial e agora já não há respeito mesmo dentro da instituição que mais necessita dela. O Estado já não exerce a sua autoridade e disciplina, a não ser na área fiscal e no assalto aos contribuintes.
Nas sábias palavras de Ramalho Eanes: “Devo dizer que tudo isto me desgostou profundamente, enquanto militar e enquanto cidadão”.
P.S. – Ainda na área naval, chegou esta semana a Portugal o primeiro navio encomendado pela “Transtejo”, que vinha com bateria. Veio estragado e sem condições de navegar. Se isto não fosse tão trágico diria que era uma anedota.
Com papas e com bolos se enganam os tolos. ■
O estado a que o Estado chegou por José Guilherme Oliveira
As coisas não correm bem e não há dúvidas de que o ar que se respira não é saudável, cheira a mofo.
O Governo desmorona-se; a oposição inexiste; os extremos agitam-se; o Presidente puxa as orelhas ao primeiro-ministro Costa, este repreende o Pedro Nuno Santos; o Medina, esquivo, a ver se se safa; demitem-se meia dúzia de governantes; a TAP; as indemnizações; as nomeações; é o PRR cuja execução é pouco mais do que inócua; é o custo de vida; é a inflação; são os professores e os funcionários judiciais; são as leis “cartaz” do arrendamento (como lhes chama o Presidente da República), enfim! Paira uma sensação a fim de ciclo. Mas não se julgue, antes fosse, que é fim do Governo maioritário do PS a solução, pois o sentimento é de que não existe alternativa credível, o que leva alguns a aspirarem às manhãs de nevoeiro, onde surgirá um qualquer D. Sebastião.
A questão é mais profunda. É a justiça de quem os comuns desconfiam, é a saúde que definha, os serviços que não funcionam, é a função assistencialista que envergonha, enfim, é um Estado que se espalha pelas ruas da amargura em todo o seu esplendor. Além do mais, a terceira República produziu um Estado que não é pessoa de bem, é alguém em que o cidadão não confia, não conta ou de quem tem medo.
Como se isso não bastasse, surge agora a crise nas Forças Armadas. O acto de insubordinação dos 13 marinheiros, que se recusaram a cumprir a missão que lhes foi designada, é mais do que um episódio triste. É impossível que passe incólume uma situação desta natureza.
A desobediência não pode fazer parte do código de valores destas instituições. Imaginemos, a título exemplificativo, que um pelotão de soldados se recusa a ir para a linha da frente combater, porque as nossas “G3” são antigas, ou que o inimigo tem mais munições, ou então sujeitar o cumprimento da missão a escrutínio democrático. Só na guerra do Solnado. É um cenário que não se coloca, mas foi mais ou menos isso que aconteceu.
O Almirante Gouveia e Melo, enérgica e rapidamente, veio publicamente condenar os marinheiros faltosos, o que provocou reacções em catadupa. Não é para mim relevante que tenha retirado algum aproveitamento e tenha feito, de forma oportunista, a primeira acção de pré-campanha para as próximas eleições presidenciais. Correu o risco, mas julgo que a reacção foi a precisa e necessária. Mesmo a crítica de que as “repreensões” deviam ter decorrido no seio da instituição e não na praça pública são frágeis, pois tornou-se pública a desobediência e, a certa altura, quase pareceu provocatória. Não restava alternativa ao Almirante, que fez o que devia ser feito, quer no tempo, quer no conteúdo, quer no tom.
Triste figura é aquela que tem feito o Dr. Garcia Pereira, ufano, que aparece nas televisões, em todas elas, que trata o assunto como se de uma reles querela civil ou criminal estivesse em causa, prestando um mau serviço aos seus clientes e à profissão.
Obrigado Sr. Almirante, por me ter feito acreditar que ainda há uma reserva de gente capaz entre nós.
P.S. – Foi impressionante ver a emoção generalizada que causou a morte do Sr. Rui Nabeiro, o que prova que é possível ser socialista, ser cidadão, solidário e ser pessoa capaz e decente. Os homens de bem são poucos, mas estão em todo o lado.
P.P.S. – E se o Putin fosse detido na próxima ida à África do Sul… ■