Na CML deixou de haver o serviço ao PS e àqueles que o servem

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A nova gestão da autarquia de Lisboa leva poucos meses de vida, mas já deu para ver a enorme diferença na qualidade e na intencionalidade democrática da governação de Lisboa relativamente ao passado. Desde logo, deixou de haver o serviço ao partido e àqueles que o servem, para passar a haver o serviço aos cidadãos. A decisão de eliminar o pagamento dos transportes públicos para os jovens e para os idosos, cumpriu em tempo recorde uma promessa feita nesse sentido.

Porventura com maiores consequências no desenvolvimento do país, pelo que ouvi, haverá em breve alguma forma de transporte escolar, dizem-me que serão os “Amarelinhos”, pequenos autocarros amarelos que passarão a conduzir as crianças de alguns bairros lisboetas para as suas escolas. Trata-se de uma medida inteligente e de grande dimensão governativa, que evitará muitas horas perdidas diariamente no trânsito por milhares de famílias, que poupa energia e o ambiente, o qual tanto parecia preocupar a gestão anterior, mas apenas através de ameaças de fechar ao trânsito partes da cidade, com os naturais custos para os cidadãos.

Mas talvez que a grande mudança resida no novo modelo de gestão participada e a disponibilidade da nova gestão autárquica, nomeadamente do seu Presidente, para o debate democrático, o qual implica interagir com os lisboetas na tomada de decisões. Pelo que sei, a decisão autocrática da anterior gestão do PS na avenida Almirante Reis vai ser alterada em conciliação com os moradores, de duas vias para uma só via para ciclistas e permitir o escoamento do trânsito numa das principais avenidas da cidade. Trata-se da vitória do bom senso e das virtudes da democracia na gestão pública.

Aparentemente, tem sido possível ao novo Presidente Carlos Moedas governar em minoria política e espera-se que isso continue a ser uma realidade, o que é certamente facilitado pelo novo clima de abertura ao debate democrático e pela transparência das decisões da autarquia. Todavia, dito isto, a democracia tem sempre soluções para a hipótese de todas ou algumas das oposições optarem pelo conflito e pela vontade de colocar os interesses partidários acima da resolução dos problemas dos cidadãos.

Pessoalmente, tenho uma grande preocupação com a chamada linha circular do Metro, um erro grave da anterior gestão e do Governo, que a Assembleia da República tentou corrigir, mas sem abertura governativa para o efeito. Além de ter sido uma decisão destinada a favorecer os interesses imobiliários do centro citadino, que contraria uma decisão democrática da Assembleia da República, a nova via irá ter grandes problemas de construção, vai provocar uma concentração excessiva de pessoas no Cais do Sodré, não contribui para retirar os carros da cidade com a poluição correspondente, vai ter custos absurdos impossíveis de rentabilizar e muito superiores aos previstos. Ainda a procissão vai no adro e já se fala em demolir edifícios inteiros, o que desde logo demonstra a pouca competência de quem andou anos a negar as dificuldades da má solução encontrada, contra muitos dos especialistas do sector.

Como parece evidente, a ligação directa a Alcântara, seria muito mais barata porque feita em parte por via aérea, com ligação à linha de Cascais em dois locais em vez de apenas um, para quem se dirige à alta da cidade (Alcântara) e à baixa (Cais do Sodré), com a possibilidade futura de uma ligação a Campo de Ourique e daí para Oeste. Trata-se de uma melhor solução, mais inteligente, menos dispendiosa e, principalmente, com maior utilidade para quem hoje utiliza o automóvel. Não sei qual é presentemente a posição da autarquia, mas sei que o actual governo do PS deve ser responsabilizado pelo resultado final deste erro óbvio, de que vamos ouvir falar mais e pelas más razões.

Em resumo, o meu desejo é que a nova autarquia dirigida por Carlos Moedas possa continuar a mostrar aos portugueses um novo modelo de gestão democrática bem-sucedido, modelo que possa ser extensivo a todo o país no futuro. O continuado empobrecimento dos portugueses relativamente aos outros povos europeus, não é fruto de um qualquer acaso, ou que haja algo de errado no nosso país que não seja a governação não democrática, auto-suficiente e não transparente que temos tido, em que a corrupção tem assumido um papel relevante. A ausência de solução para os nossos problemas não está na democracia, mas na sua ausência, não está no debate aberto das soluções com os portugueses, mas na sua inexistência.

E falando da qualidade da gestão, o Orçamento do Estado agora em discussão na Assembleia da República é um bom exemplo de uma gestão feita sobre o joelho, que não leva em conta as novas condições políticas e económicas existentes na Europa e sem nenhuma capacidade de prever as mudanças em curso, mesmo as mais evidentes. Por exemplo, Fernando Medina resolveu aceitar a versão anterior do Governo de que a inflação é um fenómeno de curto prazo, mas sem deixar de capitalizar no aumento da receita do Estado e sem se preocupar com a queda do poder de compra dos portugueses, nomeadamente dos de mais baixos rendimentos. Por outro lado, o crescimento da economia é deixado à sorte do tempo futuro e sem sequer compreenderem as causas da estagnação da economia portuguesa, que já leva mais de vinte anos. Naquelas cabeças não entra a ideia de que em Portugal existe um anormal excesso de muito pequenas empresas, nomeadamente comerciais, que vivem numa luta constante pela sobrevivência, com baixíssimos níveis de produtividade e de baixos salários, empresas que subsistem pelo efeito combinado de um sistema de educação pouco exigente e desorganizado, além da ausência de investimento, nacional e internacional, na indústria. Sendo que a indústria é o único sector da economia que pode absorver os trabalhadores que resultem do fecho virtuoso de muitas pequenas empresas existentes, muitas das quais só existem ainda devido aos apoios pontuais do governo.

A incapacidade dos governos do PS de preverem o futuro, mesmo o mais próximo, é a sua imagem de marca. Neste Orçamento do Estado Fernando Medina faz disso mesmo a base da aprovação do OE, quando diz que está aberto a ajustar o documento à medida que os acontecimentos mudarem. Medina chama a isso prudência quando de facto é ignorância, pouco conhecimento do que se vai publicando por esse mundo fora e mesmo daquilo que se passa nos outros países. Durante os últimos vinte e cinco anos tenho chamado a atenção para o que se passa na Irlanda, para o que bastaria olhar para o que os irlandeses andam há muitos anos a fazer com vista ao futuro, para terem um possível guião. Pois, apesar da Irlanda estar hoje na linha da frente do progresso europeu, aquelas cabeças do PS continuam a não compreender o que se passa e a insistir nos mesmos erros herdados do passado em vez de liderar o futuro. Esta é razão principal porque os próximos quatro anos serão anos perdidos para Portugal.

Até lá, espero que a boa gestão de Carlos Moedas em Lisboa possa representar um farol que, pouco a pouco, ilumine o caminho em direcção ao futuro de gerações de portugueses. ■