O PSD vai a votos. Uma vez mais e mais uma vez com, pelo menos, dois candidatos. Mas esta não é uma eleição qualquer. É a eleição pós-Rio, pós-Chega, pós-IL e pós maioria absoluta. Na prática, excepção feita à vitória nos Açores e esta muito mais por mérito do José Manuel Bolieiro e das estruturas locais do que do líder, este é o legado de Rio: um partido em frangalhos, incapaz de se afirmar como alternativa ao PS de Costa, dividido internamente, que não soube, sequer, reter o seu eleitorado que hoje se encontra disperso em diversas alternativas à direita. Isto, porque Rio nunca teve, verdadeiramente, um projecto político para o PSD, apenas uma ambição pessoal à custa do partido. Revisitando um artigo que escrevi há mais de dois anos, publicado no ‘Observador’, cito a seguinte passagem:
“Já o PSD é um caso de Dr. House. Os sintomas estão à vista de todos e são confusos. Ninguém sabe do que se trata, mas há a convicção plena que pode ser fatal. E, pior, está vetado às listas de espera do Serviço Nacional de Saúde…
Consta da ficha do paciente:
– Historial clínico: em Janeiro de 2018 superou, à tangente, um problema de liderança.
Assistido diversas vezes nas urgências com queixas de discurso vago e confuso, modorra, falta de ambição, fraca argumentação e pouca tolerância a críticas. Inábil na resolução de problemas internos e/ou externos. Foi medicado, seguido em psicologia, não apresentando melhorias significativas. Submeteu-se a provas de esforço, em Maio de 2019, com resultados catastróficos, acusando acentuada perda de leitores. Mudança do paradigma terapêutico, com reforço muscular, acompanhado de psicotrópicos (leves) para elevar a auto-estima. Nova prova de esforço, em Outubro de 2019, roçando mínimos históricos, apesar de condições exógenas extremamente favoráveis. De então para cá – e apesar disso – apresenta tiques de tiranete, ligeiro autismo, manifesta incapacidade de auto-crítica, avesso ao diálogo e discurso delirante;
– Data do último episódio agudo: a 13 de Janeiro de 2020, com um ‘post’ numa rede social, em pleno exercício público de autoflagelação;
– Observação clínica: o paciente apresenta-se desorientado no tempo e espaço, com um discurso ilógico e por vezes delirante. Imagina inimigos internos.
Reúnem os médicos de urgência, analisam a ficha do paciente, os resultados toxicológicos e imagiológicos. Devoram literatura sobre casos idênticos, sublinhando o de um outro partido, conhecido como o caso do ‘poucochinho’. Discutem internamente a situação, concluindo tratar-se de uma infecção no cérebro que contagia os restantes membros. Aconselha a prudência a intervenção cirúrgica com vista a remover o problema. Não podem dar garantias de sucesso pleno, mas assumem uma elevada probabilidade. O partido duvida, apesar de advertido, que a recusa pode ditar a morte ou deixá-lo em estado vegetativo. O cérebro comanda a maior parte dos membros e tudo faz para manter o ‘status quo’. Esquecendo que teimosia e burrice andam lado a lado e que o perigo surge quando se encontram, desvaloriza os avisos e invectiva: ‘Então não morrem partidos todos os dias?’.
Já ao sair da sala, golpeia o pescoço na direcção dos clínicos e, de sorriso matreiro, dispara:
‘– E não há pessoas muito maiores que os partidos?’.
‘– Haverá, seguramente. Manifestamente não é o caso!’ – respondeu quase em surdina um dos médicos, enquanto começava a assinar a certidão de óbito…”
Às vezes o tempo tende a dar-nos razão! “In casu”, quer quanto aos problemas do partido, quer quanto ao rumo traçado por Rio…
E a questão agudiza-se no tempo, com os gravames citados e os resultados catastróficos das listas de deputados em que, saia quem saia vencedor da contenda interna não terá representação parlamentar directa ou grupo de sua confiança. Pior, é segura a polarização dos deputados entre os dois candidatos, enfraquecendo, assim e ainda mais, a nova liderança. É certo que, se Rio foi o cérebro que gizou este plano, foram as estruturas distritais e concelhias que o permitiram. Há muito que, no PSD, se luta pela sobrevivência (política e económica) de uns poucos. Via de regra, os mais medíocres e com menos escrúpulos. A táctica é sobejamente conhecida: ainda que gregários, dividem-se em apoios de ambos os lados, garantindo, qualquer que seja o resultado, a sobrevivência e perpetuação do grupo e “status quo”. O Porto é, entre todos, o paradigma desta solução. E uma vez mais o será nestas eleições, com os generais (do mesmo exército e conluiados) a posicionarem-se em lados opostos do xadrez.
Seria tempo de reflexão e não tempo de liderança. Na prática, e ressalvadas hecatombes mundiais ou a vontade do próprio Costa, adivinha-se um mandato tranquilo, pelo que a oposição (toda, no seu conjunto) terá um papel iníquo ou próximo disso. São raros os ciclos políticos que permitem a um partido ter tempo de reflectir, de se reposicionar, de se reorientar e de fazer as purgas internas necessárias. Por norma, a vertigem dos acontecimentos não o permite. Hoje, a modorra instalada e a que se avizinha, aconselha e recomenda períodos sabáticos.
Sem tirar o mérito e a legitimidade dos candidatos anunciados e não curando sequer de tomar, nesta sede, posição relativamente a qual o mais indicado para liderar o PSD nos próximos anos, lamenta-se não existir uma solução de consenso encabeçada por um único candidato que permita arrumar, de vez, com estes tiranetes.
É que, ainda que tenha sido Rio a ministrar as exéquias, são eles os verdadeiros coveiros do PSD, escondidos nas longas listas de deputados que o anonimato lhes confere. Montenegro e Moreira da Silva sabem bem quem são, mas, precisando deles como precisam para ganhar as eleições, só irão perpetuar o ciclo…
É pena! ■