No país do aguenta tudo

A frase atribuída a Júlio César parece assentar-nos que nem uma luva: “Há, nos confins da Ibéria, um povo que não se governa nem se deixa governar”. No país do aguenta tudo!

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Assistimos impávidos, serenos e sem ambição:

Ao futuro incerto e negro de um país que não fez, nem se vislumbra tencionar fazer, as reformas necessárias à modernização e ao desenvolvimento na educação, na justiça, na sustentabilidade da segurança social, no aprofundamento da nossa democracia ou na alteração do modelo económico capaz de projetar a economia nacional e o bem-estar dos portugueses. Um país que não agrega nem acarinha os seus. Um país que não promove o crescimento demográfico e que se esquece sistematicamente do interior. Um país sem esperança e sem horizontes que castiga, sem remorsos, as gerações vindouras. Um país que não sabe onde quer chegar, que não sabe para onde ir e que vive numa encruzilhada de caminhos errados que se apresentam, uma vez mais e de novo, pantanosos e incertos. É assim!  Estamos, vai para cinco décadas, umas vezes a marcar passo, outras mais, a recuar e cada vez mais próximos da cauda da Europa, a mesma que nos prometeu e deu todas as ferramentas para a convergência. Caso será para dizer: “duas vezes é perdido o que ao ingrato é concedido”.

Assistimos impávidos, serenos e sem ambição:

Aos governos incompetentes e sem rumo, às bancarrotas socialistas, ao pântano de Guterres, ao descalabro e perdição de Sócrates, à invenção de António Costa: a “Geringonça” rosa avermelhada em mancebia com a esquerda ortodoxa e radical. À obsessão pelo controlo da TAP, onde se enterram milhões atrás de milhões num poço sem fundo. À opção socialista pela nacionalização da EFACEC, abandonada pela banca e considerada zona de risco. Aceitamos serenamente a gasolina e o gasóleo mais caro de toda a Europa. Não contestamos que os preços dos combustíveis subam mais de 35 vezes num só ano. Não nos indignamos com os brutais custos da electricidade e da água, nem mesmo com os benefícios fiscais atribuídos à EDP na venda das barragens, aos perdões à banca, à GALP e aos financiamentos por via do Orçamento do Estado às Fundações, Associações e demais entidades de Direito privado.  Assistimos calma e serenamente ao definhar de um país onde mais de 1,6 milhões de portugueses vivem abaixo do limiar da pobreza, onde 9,5% da população empregada é considerada pobre, onde 1,5 milhões de pensionistas da Segurança Social recebem uma pensão de velhice ou invalidez inferior ao salário mínimo nacional, e continuamos a mergulhar a cabeça na areia, qual avestruz, perante o preocupante peso da dívida pública nacional que já atinge 135,2% do PIB. Dito isto, haverá “pior cego do que aquele que não quer ver”?

Assistimos impávidos, serenos e sem ambição:

À falência da Justiça. Depois dos episódios bem gravados na nossa memória do BPN, BES, BANIF, Operação Marquês, Football Leaks, Tancos, Operação Lex ou caso EDP, entre muitos outros, temos agora o jogo do esconde e foge do ex-banqueiro João Rendeiro condenado a 10 anos de prisão por crimes de fraude fiscal qualificada, abuso de confiança, branqueamento de capitais. Deixou um buraco de 700 milhões no BPP e um lastro de dívidas assustadoras. Decidiu Rendeiro auto-absolver-se por não acreditar na justiça, aquela que o deixa fugir, perante a total passividade da juíza do processo e o desconforto da inócua ministra da Justiça, e ir em busca do mundo – dizem para o Belize, mas que o diga a recentemente inaugurada CNN Portugal – com uns quantos milhões no bolso para recriação e bem-estar de si mesmo. Por cá, deixou a mulher e o sustento necessário através dos meios disponibilizados, numa operação de imaginação criativa, de trocas e baldrocas, registos, títulos de dívida, doações, usufrutos, concessões e outras falsificações condizentes com o criador. Ou mesmo, quando três magistrados, alegando protestos vários, recusam julgar um perigoso gang denominado Hells Angels e estes acabam em liberdade por atingirem o limite de tempo previsto à prisão preventiva. Nesta paródia, apraz dizer: “Para o povo é a lei, não para o rei”.

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